Governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC) recebeu mais de R$ 900 mil por uma atuação relâmpago em dois escritórios de advocacia durante a campanha eleitoral e a transição para seu governo, em 2018.
O valor foi usado para justificar uma doação que Witzel fez à própria campanha de R$ 215 mil. Na declaração de bens entregue à Justiça, o governador afastado não havia informado ter dinheiro em conta bancária antes do início da disputa eleitoral.
Neste sábado (30), após a operação que o afastou do cargo, Witzel ofereceu uma terceira versão para os repasses. Afirmou que tudo foi pago somente após a campanha vitoriosa de 2018.
Na semana passada, Witzel foi afastado do cargo por 180 dias sob suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro por decisão do ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A medida monocrática de Gonçaves será julgada na quarta-feira (2) no plenário da corte, em Brasília.
De acordo com a Procuradoria-Geral da República, o governador afastado recebeu no ano eleitoral R$ 412.308,37 do escritório do ex-secretário Lucas Tristão, preso na Operação Tris In Idem da última sexta-feira (28). Durante a campanha, Witzel declarou que havia se tornado sócio do ex-braço-direito, mas a parceria nunca foi formalizada na OAB.
Em sua decisão, Gonçalves (STJ) destacou o fato de o escritório de Tristão ter recebido, entre julho e outubro daquele ano, R$ 225 mil da empresa Atrio Rio Service, ligada ao empresário Mário Peixoto, preso sob acusação de pagar propina a Witzel já no Governo do Rio.
O vínculo entre Tristão e Mário Peixoto foi revelado pela Folha durante a campanha. Na ocasião, Witzel afirmou que auxiliou o ex-secretário na análise do caso da Atrio Rio num processo contra o estado.
Além da empresa ligada a Mário Peixoto, o governador afastado e o ex-secretário atuaram juntos em ao menos mais um processo, em favor de uma firma contra a Prefeitura de Resende (RJ).
Witzel havia declarado à Receita Federal ter recebido R$ 284,4 mil do escritório de Tristão. Ele, contudo, retificou as informações de seu Imposto de Renda em fevereiro para informar que o valor era maior, de R$ 412,3 mil -quantia informada pelo escritório ao fisco.
Outros R$ 500 mil foram recebidos como participação nos lucros do escritório do advogado Fábio Medina Osório, ex-promotor que ocupou por quatro meses a chefia da Advocacia-Geral da União no governo federal na gestão de Michel Temer (MDB).
Ele permaneceu associado à firma apenas entre setembro e dezembro de 2018, período que compreendeu a reta final da campanha e a transição do governo. De acordo com o escritório, o pagamento ocorreu pouco antes da posse em razão de rescisão contratual.
"De fato, o período mencionado é extremamente extenuante para qualquer candidato, principalmente numa campanha para governador de estado, sendo pouco provável que Wilson Witzel tenha, de fato, desempenhado qualquer atividade laboral relacionada ao escritório", escreveu a PGR sobre o repasse do escritório de Medina Osório no pedido de afastamento do governador.
"Somando-se às outras provas coligidas na investigação, os pagamentos se mostram como mais um indicativo de lavagem de ativos", completou a PGR.
A entrada de Witzel no Medina Osório Advogados foi revelada pela Folha durante o segundo turno da campanha.
Na ocasião, o sócio principal do escritório afirmou que a entrada de Witzel na firma começou a ser discutida em abril de 2018.
O pedido de registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) foi feito em julho, mas homologado apenas no dia 5 de setembro. No dia seguinte, o governador afastado fez a primeira transferência para a conta de sua campanha: R$ 51 mil.
Os repasses feitos pelos dois escritórios foram usados para Witzel justificar, durante a campanha, a doação de R$ 215 mil que fez à própria campanha.
O governador afastado havia declarado à Justiça Eleitoral ser proprietário apenas de uma casa no Grajaú, que não foi vendida. Para explicar como encontrou dinheiro não declarado ao TRE-RJ para repassar a sua campanha, ele afirmou ter recebido os valores dos escritórios dos quais havia se tornado sócio.
Em maio, após a Operação Placebo, em que houve busca no Palácio Laranjeiras, Witzel afirmou que nunca havia sido sócio de Tristão, mas apenas prestado serviços para o seu escritório. Declaração que contradiz entrevista do próprio governador afastado à Folha durante a campanha.
Neste sábado, para explicar as razões dos repasses e eventual vínculo com a campanha, Witzel disse que recebeu os valores apenas após o segundo turno das eleições. Com a nova versão, ele não explicou como conseguiu os R$ 215 mil se, em julho de 2018, havia declarado não ter dinheiro em conta bancária ou em espécie guardado.
Witzel também recebeu no ano eleitoral R$ 180,9 mil do PSC, partido em que formalmente atuava como advogado. O valor, contudo, não é suficiente para justificar o repasse feito a sua campanha.
Nesta terceira versão, ele tambem volta a se referir a Tristão como ex-sócio.
O governador afastado disse, em nota, "que prestou consultoria em causas tributárias e criminais pelos escritórios dos quais era sócio em razão da quarentena após ter deixado a magistratura, ele não poderia peticionar nos juízos federais".
"Ele recebeu os honorários relativos às causas após o segundo turno das eleições, realizado em outubro de 2018", diz a nota do governador.
O escritório Medina Osório Advogados afirmou, em nota, que o pagamento foi feito "em decorrência de rescisão contratual e que foi pouco antes de sua posse".
"O escritório informa ainda que não houve nenhum recurso oriundo desses honorários injetado na campanha de Witzel. Informa, ainda, que o escritório ou seus sócios não são alvos do processo ou da investigação", diz a nota.
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