Capixaba é o gentílico usado para denominar quem nasce no Espírito Santo, correto? Sim, está certo. Mas esse também é o nome de uma pequena cidade, localizada a mais de 4 mil quilômetros de Vitória, no interior do Acre, já na fronteira do Brasil com a Bolívia.
O município acreano Capixaba é bem novo: em 2022, completará ainda o 30º aniversário. Atualmente, população da pequena cidade é estimada em pouco mais de 12 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ou seja, um lugar tranquilo, onde quem nasce é chamado de... capixabense. No mapa do Brasil, a cidade do Acre fica praticamente no lado oposto ao da capital do Espírito Santo. Veja abaixo:
Diante desse fato curioso, a reportagem de A Gazeta foi atrás da origem e da história da cidade acreana e descobriu que o nome — como é de se imaginar — tem ligação, sim, com o Espírito Santo. Mais especificamente com uma família que saiu do Sul do Estado e migrou para o outro lado do país.
Para entender como tudo aconteceu, é preciso voltar à década 1970. Naquela época, o capixaba Hélio Tessinari já havia deixado o Estado de nascimento para trás e morava no Mato Grosso. Em 1972, ele chegou a um cantinho do Acre, ainda sem nome, em busca de uma melhor qualidade de vida.
Nascido em Castelo, o senhor Hélio — como é respeitosamente chamado atualmente pelos moradores de Capixaba — conheceu a esposa Maria Lubiana durante a colheita de café na região. Juntos, eles deixaram o Sul do Espírito Santo há quase seis décadas e tiveram 14 filhos, entre eles, Ronaldo Tessinari.
Coordenador de um centro cultural de Capixaba, ele conta que o desenvolvimento do município esteve estritamente ligado ao pai, que acabou atraindo outros parentes e chegou a doar vários terrenos para os seringueiros, dando origem a uma vila com quase 30 famílias.
O recém-povoado ficava em uma área conhecida como "Seringal Gavião", na altura do km 74 da BR 317, no trecho entre a capital Rio Branco (AC) e a cidade de Xapuri. Com uma serra manual, Hélio Tessinari implementou a primeira indústria madeireira da região, com a abertura da "Serraria Pica-Pau".
No mesmo período, o governo do Acre estava incentivando a migração para implantação de fazendas para a criação de gado. Para quem chegava na região, o estabelecimento da família acabava servindo como ponto de referência. "O povo começou a chamar a gente de capixaba", lembra Ronaldo.
Com o passar dos anos, o povoado foi crescendo e se desenvolvendo, até esbarrar em um dilema: qual o nome de onde essas pessoas moravam? Alguns chamavam o local de Vila Santo Antônio, devido à figura sacra que até hoje é padroeiro da cidade. Já outros, deram o nome de Vila Capixaba.
Na década de 1980, decidiram resolver o impasse com uma votação cujas cédulas podem ser consideradas, no mínimo, curiosas. Quem preferisse Vila Santo Antônio depositava um grão de milho na urna, e quem quisesse Vila Capixaba inseria um de feijão. O resultado nós já sabemos.
A escolha perdurou até a emancipação da vila, no dia 28 de abril de 1992. Instituído oficialmente, o município passou a chamar apenas "Capixaba" e se desvinculou de Rio Branco e Xapuri. Em outubro daquele ano, aconteceu a primeira eleição municipal – que poderia ter dividido a família Tessinari.
Se a vila tinha se tornado uma cidade, era preciso haver um prefeito. Em outubro de 1992, aconteceu a primeira eleição em Capixaba. De um lado, Liberato Ribeiro da Silva (que já havia sido subprefeito), tendo como vice o Hélio Tessinari. Do outro, o Ronaldo Tessinari. Ou seja, uma disputa entre pai e filho.
"Isso foi uma coisa muito chata na minha vida, porque a gente sempre se deu muito bem, mas pediram para eu ser candidato e ele mesmo insistiu. Foi uma eleição perturbada, eu estava na frente, mas uma das urnas sumiu e eu perdi. Foi bom porque não fiquei com culpa", brinca Ronaldo.
Entre os nove vereadores eleitos para a Câmara Municipal, dois também faziam parte da família: Amarildo Tessinari e Edimar Gava Tessinari, respectivamente irmão e primo de Ronaldo. Ambos eram do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que também ganhou o Executivo.
Segundo o livro "Capixaba", quase 2 mil eleitores participaram da primeira eleição do município. A publicação foi escrita por José Serrão de Castro, historiador local e ex-secretário municipal de educação, com o intuito de registrar e divulgar a história da cidade para fins didáticos.
Nos textos expostos no Centro Cultural Severino Jorge Matos, o capixaba Hélio Tessinari é retratado como alguém muito querido. Entre os atos destacados está a doação de terrenos para diversos órgãos públicos, como delegacia, posto de saúde, escola e companhias de eletricidade e de saneamento.
"Ele sempre dizia estar investindo no futuro, porque a cidade iria se desenvolver. Com isso, ele foi tendo credibilidade junto à população, devido à visão política que ele tinha. Esse foi o grande legado do senhor Hélio", comenta Geran Clay, chefe de gabinete da Prefeitura de Capixaba.
Atualmente casado com uma neta de Hélio Tessinari, o servidor lembra de duas contribuições mais curiosas, como o costume de plantar árvores. "Ele saía com um carrinho de mão e ia plantando. Depois, passava aguando. Hoje, Capixaba é uma das cidades mais arborizadas do Acre", ressalta.
Já a outra está ligada à religião. "Ele era um religioso. Antigamente, o padre passava por aqui uma vez a cada um ou três meses. Entre essas visitas, era o senhor Hélio que celebrava as missas e fazia as homilias. Era uma espécie de dirigente, comandava tudo. Era um segundo padre", conta Geran.
Ainda de acordo com Geran Clay, o capixaba Hélio Tessinari era apaixonado por esportes e foi responsável por disseminar, na região, a bocha — ou boccia, como o esporte também é chamado — graças a uma pista construída em frente à própria casa, que ficava na avenida principal. Hoje, o único ginásio da cidade leva o nome dele, como homenagem.
Nas paredes do centro cultural, está registrado alguns dizeres dele, entre eles um que diz que faria tudo de novo "tanto pelas pessoas, quanto pelo município". Falecido em 2005, o município garante que Hélio partiu "deixando a marca de um planeta mais verde" e um "rico legado de amor e dedicação à humanidade".
"Acredito que se não fosse o meu pai, esse município ainda não existiria. Foi a partir da vila que ele ajudou que tudo surgiu. Até hoje, somos uma família muito grande, querida, respeitada e com muitas amizades por aqui", comemora Ronaldo Tessinari, dizendo que Capixaba é uma das melhores cidades.
"Eu acho o Espírito Santo maravilhoso. Estive já umas três vezes depois de adulto, na casa de um tio em Vila Velha. Vamos sempre na Praia da Costa, na de Camburi... É um ponto de referência até hoje, mas aqui tem pouca violência e um custo de vida bom. É um lugar maravilhoso para se viver", garante.
Capixapédia é uma seção do portal A Gazeta que tem como objetivo divulgar curiosidades, fatos históricos, desvendar enigmas e tratar de assuntos diretamente relacionados ao Espírito Santo. Tem alguma curiosidade? Conhece algo incomum sobre o Estado e quer compartilhar com a gente? Mande um e-mail para [email protected]
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta