Quando os passageiros que estavam no ponto final do Ibes, em Vila Velha, entraram no ônibus 290, na manhã do dia 8 de junho de 1973, eles presenciaram uma cena inédita: uma mulher estava no volante.
Era o primeiro dia de trabalho de Talita Moretti, a primeira mulher motorista de ônibus do Espírito Santo. A cena foi registrada pelos jornais capixabas, o que incomodava Talita. "Não gosto de ser entrevistada. Como eu, tem outras motoristas em todo o Brasil", disse ao jornal A Gazeta em entrevista na época.
Esta é uma das matérias da série que conta as histórias das mulheres que foram pioneiras no ES em diversas áreas e faz parte das publicações da semana em que se celebra o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, próximo domingo.
Apesar da resistência, Talita sabia que aquela não era uma cena comum. As mulheres da época ainda enfrentavam o preconceito da sociedade para exercer atividades fora de casa. E quando ousavam se aventurar em profissões consideradas "masculinas", eram mais cobradas do que os homens.
Talita nasceu na Bahia, em 1939, mas viveu a maior parte da sua vida no Espírito Santo. Com um espírito muito independente, não gostava de serviços domésticos, queria mesmo era trabalhar fora.
Aos 20 anos, descobriu a paixão por dirigir veículos pesados e não parou mais. "Ela começou a dirigir ônibus e carreta por todo Brasil. E dirigia bem, viu?", ressaltou Litarlene.
A Loura, como era conhecida, chegou a ter uma autoescola em Linhares. Em 1969, se mudou para Ilhéus, onde começou a trabalhar como motorista de ônibus pela Viação Souza Santos. Anos depois veio para o Espírito Santo, mas teve dificuldade para conseguir emprego como motorista.
A oportunidade veio na Viação Alvorada. Depois de muito insistir, Talita conseguiu autorização para fazer um teste e passou. Mas confessou que lhe deram um carro velho para provar suas habilidades.
O início da carreira de Talita como motorista no Estado foi difícil. "Falavam que o lugar dela era no fogão, não no volante", comentou Litarlene. Com o tempo, a competência e dedicação de Loura fez com que ela se destacasse no ambiente de trabalho.
"Começaram a ver que ela era muito boa e passaram a convidá-la para fazer excursões. Uma vez foi para São Paulo com vários colegas buscar uma frota de ônibus. Ela provou que dava conta do recado e que o lugar dela era no voltante, fazendo o que ela mais amava fazer", afirmou.
Talita se aposentou após 30 anos de trabalho, devido a um acidente doméstico que a impediu de voltar a dirigir. "Aquilo foi um sacrifício para ela porque dirigir era o que ela mais gostava de fazer", lembra Litalerne. Em 2014, Talita teve uma parada cardíaca e morreu, em Linhares.
O pioneirismo de Loura permitiu que outras mulheres também pudessem exercer a profissão. Hoje, 86 mulheres ocupam o cargo de motoristas de ônibus Transcol na Grande Vitória. Um número ainda pequeno, mas reflexo da história de mulheres que lutaram por espaços de trabalho.
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