Tenho comigo um álbum que foi lançado em 2018, "Canta Inezita Ao vivo" As Galvão, Maria Alcina, Consuelo de Paula, Claudio Lacerda (Kuarup). Trabalho que recebi na época do lançamento, previsto para 8 de março, data em que o falecimento de Inezita Barroso completaria quatro anos. Sinceramente, não sei o que justifica tamanha demora até que eu resolvesse ouvi-lo com os ouvidos em modo comentarista.
Bem verdade que eu sempre ouvia o CD. Ouvia-o inteiro ou me restringia a atentar às músicas gravadas por cada um dos quatro convidados pelo produtor Thiago Marques Luiz para o louvor à cantora, atriz, apresentadora, professora e folclorista Inezita Barroso.
Músicas marcantes de um período em que vivia minha pré-adolescência em Niterói. Cada uma delas me remetia a um tempo que eu não conseguia identificar os fatos, apenas sentia um aperto que me doía o peito setentão.
Perdoem-me as reminiscências, mas é que cada uma das quinze canções do CD me vinha à cabeça como um recado. Mensagem convidando-me a voltar a tempos passados. Bilhetes amarelados de um tempo triste, mas pleno de cuidados amorosos. Todos vindos a mim em forma de saudade músicas/fotografias de um momento imensurável.
Não raro me emocionei ouvindo a voz delicada e profunda de Consuelo de Paula cantando Viola Quebrada (Mário de Andrade) quanto firmeza eu sentia ali, os sentidos em alerta máximo. Nem tampouco resistia à emoção quando Claudio Lacerda recriava, com o ímpeto de um violeiro apaixonado, a linda moda Cuitelinho (Antonio Xandó e Paulo Vanzolini).
O que dizer da estroinice da gigante Maria Alcina? Meu Deus! Aquela voz derramando verdades me atingia em cheio. E eu ria ou chorava? Os dois? Quase sempre! Prenda Minha (tradicional), em contraste com Marvada Pinga (Ochelcis Laureano), me tirava o coração da embalagem.
E vêm As Galvão, sinônimo do tempo em que elas, junto com Inezita e outros bons, pairavam sobre o sertão caipira. Vozes unidas por um ideal de pertencimento à terra, vozes tradutoras de um momento único na música brasileira. Lindas. E cantada por elas, Beijinho Doce deixava-se relembrar com galhardia.
Os arranjos do violonista e diretor musical Paulo Serau, à frente de um bom sexteto instrumental (senti falta de seus nomes no encarte), acolhiam os intérpretes que a eles se entregavam.
Aos poucos entendi o que sentia. Foi quando algo pintou como se pedindo para eu entrar em modo comentário... e aqui estou eu, reverenciando uma das nossas cantoras mais importantes. Seu sentido de brasilidade salta aos olhos. O seu povo lhe oferece respeito e confiança, merecimentos que só se conquista pela verdade de seus princípios e de sua música.
A voz de Inezita Barroso imprime um quê de amargura, um quê de angústia, em suas tão belas músicas. Uma dor profunda que acompanha a vida de nossas gentes pretos, pobres, povos indígenas e das periferias , que hoje estão sendo empurradas para o abismo por um genocida.
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