Nesses tempos de “fake” e “fastnews” normalmente acontece assim. A gente recebe uma manchete exagerada ou um tuíte de fonte duvidosa com alguma ideia ou notícia peculiar, a qual exige desconfiança. É necessário ir além, buscar depois os detalhes, preferencialmente de uma fonte confiável, ir à origem dos fatos, para tentar entender o que aconteceu e – preferencialmente – só depois desse longo processo formar uma opinião.
É assim que busco fazer, especialmente diante de fatos e notícias sobre temas jurídicos, os quais não raro exigem acesso aos documentos originais, de processos, fóruns ou tribunais, para que possa entender exatamente o que está acontecendo.
Foi com todo esse ceticismo que busquei entender o que aconteceu no recente caso “Claudia Leitte”. A notícia que li é no sentido de que o Ministério Público da Bahia teria instaurado inquérito civil, e realizado audiência pública, com a finalidade de apurar danos morais coletivos “causados à honra e dignidade das religiões de matriz africana” pelo simples fato de a cantora ter optado por mudar a letra de uma música.
A canção popular chamada “Caranguejo” antes falava “Saudando a rainha Iemanjá”, e a cantora, diante de suas opções religiosas, preferiu alterar o texto da letra da música, agora cantando “Eu canto meu rei Yeshua”, Jesus em hebraico.
Precisei verificar se isso seria mesmo verdade. Se os agentes do Estado teriam abandonado sua importante missão republicana para interferir nas escolhas pessoais de um artista, dispendendo recursos públicos para tanto e ameaçando uma cidadã ao pagamento de milhões de reais.
Ora, a Bahia é um dos Estados mais violentos do país, e onde milhares de crimes não são apurados e milhares de criminosos não são colocados na cadeia, por diferentes motivos, em muitos casos por limitações pessoais próprios órgãos de persecução penal.
Seria então possível pensar que órgão tão relevante para a sociedade, que conta com uma das maiores remunerações por hora de nossa república, ao invés de gastar os seus recursos em prol dos interesses dos cidadãos, estaria perseguindo artistas e cantores que trocaram nome de deuses em canções?

Eu realmente desconfiei de “fake news”. Talvez uma desconfiança fruto de meu otimismo com o país e suas instituições. Frustrei-me!
Não poderia acreditar que isso estaria acontecendo no Brasil do ano de 2025, onde a Constituição madura de 1988 já havia estabelecido a liberdade de pensamento e liberdade de religião.
Não poderia acreditar que eu ou você, muito menos um artista, não teria liberdade para cantar uma música do jeito que quisesse. E que mudar a expressão Iemanjá ou qualquer outra seria motivo para ser ameaçada a pagar milhões de reais.
Fui lá, então, e chequei. Era tudo verdade.
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