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Testemunhas de crimes são protegidas no ES de facções e polícias

O programa de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas  se adaptou para enfrentar as novas configurações criminosas e sua forma de atuação

Vitória
Publicado em 08/07/2024 às 03h30
Provita
Crédito: Sabrina Cardoso com Microsoft Designer

De um lado estão as pessoas que denunciaram as ações de facções criminosas. Do outro as que presenciaram ou foram vítimas de crimes praticados por quem deveria defendê-los, os agentes de segurança do Estado, alguns deles envolvidos em milícias. Os dois grupos compõem o novo perfil de quem depende do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunha Ameaçadas no Espírito Santo (Provita-ES) para se manter vivo.

No próximo dia 13, a Lei 9.807/99 que criou o projeto completa 25 anos no Brasil. Mas em solo capixaba  os trabalhos começaram  dois anos antes, e desde então precisou aprimorar suas práticas protetivas para enfrentar as novas configurações criminosas e sua  forma de atuação. “Hoje, metade das pessoas que buscam apoio fogem do tráfico e a outra metade das polícias e milícias”, relata a coordenadora do Provita-ES, Verônica Bezerra.

No período foram protegidas 711 pessoas, uma média de quase 30 casos por ano. Atualmente encontram-se sob proteção 42 pessoas. A maioria são homens, pretos e pardos, de meia idade, com renda de até um salário mínimo.  Verônica destaca que a grande conquista do Provita-ES foi nunca ter perdido uma vida. “Em todos esses anos, nunca ninguém foi localizado ou morto”, assinala.

O projeto surgiu no Estado com o elevado número de execuções de testemunhas em processos criminais, principalmente vinculados ao crime organizado e grupos de extermínio, nas chamadas “queimas de arquivo” no final dos anos de 1990. As pessoas eram ameaçadas pelo fato de testemunharem crimes graves.

“Já são 25 anos contribuindo para a redução da impunidade, proteção de vidas com qualidade e garantia de acesso aos bens e serviços inerentes aos direitos fundamentais, com um processo protetivo embasado na Pedagogia da Proteção e com realização dos Direitos Humanos", explica Verônica.

Em média, o acolhido permanece em torno de 1 ano e 5 meses sendo protegido. Mas já houve casos em que as pessoas permaneceram por mais de 10 anos, devido a quantidade de processos em que participavam como testemunha e o alto risco que estaria exposto fora do esquema de proteção, além da morosidade processual.

A pessoa ameaçada, junto com a família, é retirada do local de risco e levada para outro território. É acompanhada por equipes especializadas, recebe apoio jurídico, psicossocial e há um trabalho de reinserção social. Quando necessário, é oferecido uma ajuda de custo para manutenção de despesas mensais. Também são acolhidas pessoas de outros estados, assim como capixabas, em algumas situações, são enviados para outras localidades.

Após a finalização do processo judicial, as pessoas saem do programa e seguem com suas vidas, sendo orientadas a não retornar para o local da ameaça. Há situações em que voltam para o programa, caso sejam novamente ameaçadas ou fatos novos aconteçam. Segundo a coordenadora do programa, em geral os acolhidos conseguem sair  com mais qualidade de vida.

Os envolvidos em realizar a proteção não dão detalhes de como os cuidados são desenvolvidos, mas sabe-se que nos últimos anos, com a expansão das facções criminosas e sua capilaridade em várias regiões, o programa precisou aprimorar suas práticas protetivas.

“Temos um comprometimento com o direito à vida e com o enfrentamento à impunidade. Quando a pessoa ingressa no programa, precisa romper com sua história e estar disposto a iniciar uma nova caminhada. Para nós é muito satisfatório ajudar esta pessoa a sair de uma situação de violação de direitos e dar a ela uma vida com qualidade”, pondera Verônica.

Desafios

No princípio, o Provita enfrentou escassez de recursos financeiros para sua implementação. Realidade que mudou a partir de 2011, quando os programas de proteção passaram a ser incluídos no orçamento do Estado. Só no Provita-ES o investimento, no período de 36 meses, é de R$10.646.826,16, dos quais 80% vem de recursos do Estado.

A secretária de Estado de Direitos Humanos, Nara Borgo, destaca que no Espírito Santo esta é uma política pública de alta complexidade e de extrema importância. “Por meio dos programas de proteção muitas vidas são salvas, e a vida é o direito fundamental mais importante”, enfatizou.

Observa ainda que a segurança oferecida pelo programa tem colaborado com a Justiça. “Quando a testemunha ou vítima se sente protegida, consegue fazer uma denúncia ou relatar um fato ao juiz. O que ajuda no desenvolvimento dos processos, na punição de criminosos”.

No Espírito Santo, desde que foi criado, a execução do Provita-ES está sob a gestão do Centro de Apoio aos Direitos Humanos Valdicio Barbosa dos Santos (CADH), que possui uma longa história de atuação no enfrentamento à impunidade e à criminalidade.

“É filiado ao Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) e com status consultivo na Organização das Nações Unidas (ONU). Possui uma rede de proteção robusta e comprometida, um conselho deliberativo atuante e representativo e uma equipe técnica altamente qualificada”, relata Verônica.

Além do Provita, o Estado conta ainda com o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) e se prepara para retomar o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH).

Nesta terça-feira (9), haverá uma sessão no Senado Federal em alusão aos 25 anos da lei de proteção, e contará com a participação do ministro dos Direitos Humanos Sílvio Almeida.

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