Estúdio Gazeta
Fundação Renova
Reparar os danos ambientais, econômicos e sociais causados pelo rompimento da barragem de Fundão ocorrida em novembro de 2015, no município de Mariana, em Minas Gerais, exige uma atuação integrada, que envolve cuidar da saúde dos cursos hídricos e das áreas de preservação permanente, ações de infraestrutura e o estímulo à atividade econômica e ao desenvolvimento das comunidades, entre outros. E a qualidade da água da bacia do rio Doce pode ser considerada um elemento transversal a todas essas frentes de ação.
Em Periquito, a 250 km de Mariana (MG), o produtor rural Antonio Carlos Bletes avança no trabalho de recuperação das duas nascentes existentes em sua propriedade de 25 hectares, onde mora há nove anos com a mulher e os dois filhos. O trabalho de cercamento destes cursos d’água, executado em parceria com a Fundação Renova, bloqueou a passagem da sua criação de gado leiteiro até o local, o que era uma das suas prioridades desde que se mudou para lá.
“As nascentes quase secaram, pois as vacas, com sede, destroem tudo pelo caminho. Hoje elas estão com um volume muito bom. Precisa ver a água que vem delas hoje”, destaca.
O programa de proteção de nascentes é uma das principais ações compensatórias realizadas pela Fundação. Cerca de 1.000 nascentes estão em processo de recuperação, contribuindo para a melhoria da qualidade e quantidade de água de mananciais alternativos na região. A nascente preserva a água que mantém a vida nos ecossistemas. O processo começa com a proteção do local onde a água brota. Esse olho d'água é cercado e o entorno é recomposto com espécies nativas, que ajudam a preservar a nascente e favorecem a infiltração da água no solo. Em suma, as nascentes são a base para o surgimento e conservação de rios, lagos e córregos. É a etapa mais importante no ciclo hidrológico, pois é o elo entre o subterrâneo e a superfície.
Também no Espírito Santo, a preservação de nascentes é prioridade. Antonio Carlos Schneider produz café, hortaliças, banana e mandioca, comercializadas em uma feira em Colatina. Como a água é importante também para sua produção, ele se dedica a recuperar os cursos d’água da sua propriedade, que fica a cerca de 6 km da cidade e a 11 km da calha do rio Doce.
“Eu trabalho há quatro anos em conjunto com a Fundação Renova. As pessoas acham que recuperar uma nascente é da noite para o dia, mas quem está aqui sabe o trabalho que dá. Eu faço a minha parte e estou colhendo os frutos”, diz ele.
O monitoramento hídrico, realizado ao longo de 690 km em rios e lagoas nos dois estados, indica que as condições da bacia são hoje semelhantes às de antes do rompimento, e a água do rio pode ser consumida após tratamento convencional.
Desde 2017, a bacia do rio Doce tem 82 pontos de monitoramento e estações automáticas que permitem acompanhar, ao longo do tempo, sua recuperação e gerar subsídios para as ações de reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão.
As amostras de água e de sedimentos são recolhidas em diferentes pontos, gerando informações sobre a recuperação ambiental da bacia. Os dados são compartilhados em tempo real com órgãos reguladores, como Agência Nacional de Águas (ANA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Mineira de Gestão das Águas (Igam), Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh) e usados no planejamento dos sistemas de abastecimento das cidades.
Atualmente, o rio Doce é enquadrado como classe 2 pelo Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), a mesma classificação de antes do rompimento da barragem. Isso significa que sua água pode ser utilizada para consumo animal, irrigação, recreação e, após tratamento, para consumo humano.
A Fundação Renova está destinando mais de R$ 600 milhões para projetos e obras de saneamento, que contemplam coleta e tratamento de esgoto e destinação de resíduos sólidos urbanos em 39 municípios da bacia do rio Doce. A previsão é de que cerca de 1,5 milhão de pessoas sejam beneficiadas. Além da disponibilização dos recursos, a Fundação Renova fornece capacitação e apoio técnico aos servidores desses municípios. A elaboração dos projetos é de responsabilidade das prefeituras.
Considerando que, segundo informações do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce), 80% de todo o esgoto gerado pelos municípios atingidos é despejado diretamente no rio, é importante frisar que as obras de saneamento são fundamentais para a revitalização do rio e melhoria das condições de saúde dos moradores locais. Além disso, todo o trabalho integrado da Fundação Renova em prol da reparação não traria resultados efetivos se não incluísse ações de saneamento básico em Minas Gerais e no Espírito Santo.
A ação também contribuirá para que os municípios alcancem as metas estabelecidas no Novo Marco Legal do Saneamento Básico.
No primeiro trimestre de 2021 foi concluída a reparação de cerca de 550 hectares de florestas e Áreas de Preservação Permanente (APPs) localizadas em Mariana, Barra Longa, Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e Ponte Nova. O trabalho foi realizado em mais de 200 propriedades rurais afetadas diretamente pelos rejeitos da barragem de Fundão, nas quais foram plantadas 300 mil mudas de 96 espécies nativas. As áreas foram protegidas por cercamento ou pela própria vegetação nativa.
Após o cultivo de espécies nativas resistentes a solo com rejeito, viveiristas de Mariana forneceram uma safra de 20 mil mudas para o reflorestamento do Alto Rio Doce. As atividades de restauração florestal alcançaram, até o momento, cerca de 1.150 hectares de APPs e áreas de recarga hídrica que estão em processo de restauração em Minas Gerais e no Espírito Santo.
Pesquisas de campo realizadas no primeiro semestre de 2020, pelo projeto Caminhos da Semente, revelaram que 26 espécies de árvores nativas da Mata Atlântica, plantadas na bacia do rio Doce, estão se desenvolvendo com pleno vigor. O monitoramento do plantio com sementes demonstrou que a média de germinação foi de cerca de 9 mil plantas por hectare, sendo que, em plantios tradicionais (com mudas), utiliza-se uma média de 1.670 plantas por hectare.
Reparar os danos ambientais, econômicos e sociais causados pelo rompimento da barragem de Fundão exige uma atuação integrada com frentes complementares de ação. Na restauração florestal também ocorre assim, aliando ações de plantio com tecnologias de pesquisa e impulsionando economia local.
Criada pela Fundação Renova em 2019, a Rede de Sementes de Mudas da Bacia do Rio Doce mobiliza e remunera pessoas e organizações sociais nas atividades de coleta de sementes e produção de mudas, que são compradas para as demandas de restauração florestal. Em seu primeiro ano, a rede forneceu mais de 5.600 quilos de sementes para projetos e programas da reparação da bacia do rio Doce.
Até setembro de 2021, foram repassados cerca de R$ 322 mil para a coleta de 91 espécies. A meta é que a rede consiga fornecer 100% da demanda total por sementes da Fundação Renova, mas que também possa ofertar insumos para compradores de outros estados do Brasil contribuindo para a recuperação do bioma Mata Atlântica.
“Participar da Rede de Sementes e Mudas mudou a minha forma de olhar a natureza. Hoje, além de saber identificar as árvores e suas sementes, sei da importância que cada uma tem para abrigo e alimentação dos animais e o equilíbrio do ecossistema”, destaca Danila Moraes Soares, indígena da etnia Tupiniquim, moradora da aldeia Córrego do Ouro, em Aracruz (ES).
Danila participa do projeto desde 2019. “Aprendi o que é restauração de fato e sei que é um processo demorado, que exige técnica e dedicação. Por isso, valorizo ainda mais e me sinto feliz em fazer parte, em ajudar nessa reconstrução”, afirma.
A tecnologia que ajuda na recuperação ambiental também incorpora soluções para o tratamento do rejeito. Os Planos de Manejo de Rejeitos, criados por mais de 80 especialistas, definiram ações executadas, até o momento, no trecho que vai de Mariana até a divisa de Barra Longa. São várias as técnicas empregadas, como a revegetação, a reconformação das margens e a recomposição da mata ciliar.
O rejeito não é tóxico, contendo elementos que ocorrem naturalmente no solo (rico em ferro, manganês e alumínio), areia (sílica) e água. O sedimento foi caracterizado como não perigoso em todas as amostras, segundo critérios da Norma Brasileira de Classificação de Resíduos Sólidos. Pesquisas que monitoram o solo diretamente atingido pelo rejeito desde 2015 mostraram que não há limitações ou riscos para o plantio em propriedades atingidas pelo rejeito da barragem de Fundão e que receberam ações de reparação.
Os estudos realizados em parceria com a Fundação Renova e liderados pelo professor doutor da Universidade Federal de Viçosa (UFV) Carlos Schaefer, especialista em solos, analisaram a qualidade produtiva do solo com rejeito, que, nas ações de recuperação, recebeu fertilizante, calcário e adubo orgânico. Segundo o professor Schaefer, não há impedimento para que os animais se alimentem do capim que nasce na região ou para que seja feito plantio para consumo humano.
Reparar os danos à bacia do rio Doce é um trabalho de grandes proporções que abrange dois estados (Minas Gerais e Espírito Santo) e 39 municípios, onde vivem aproximadamente 4 milhões de pessoas. Muitas soluções foram desenvolvidas do zero e graças à mobilização de milhares de pessoas, instituições, ONGs, universidades e pesquisadores do mundo todo. Foram desembolsados R$ 15,57 bilhões nas ações da reparação até aqui. A Fundação Renova tem compromisso com a transparência das informações sobre o processo de reparação. Acompanhe em fundacaorenova.org/dadosdareparacao.
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