Estúdio Gazeta
Igreja Cristã Maranata
Acessibilidade, acolhimento e capacitação por meio da fé e da ciência. Esses são os elementos essenciais para que o Evangelho chegue a todos e que também definiram o Seminário de Acessibilidade, realizado pela Igreja Cristã Maranata (ICM).
No evento, mais de 3.000 membros se reuniram no Maanaim de Domingos Martins, Região Serrana do Estado, nos 5 e 6 de abril, para uma série de palestras e exposições sobre a inclusão de pessoas com deficiência e transtornos, como o do espectro autista e de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), no convívio da igreja e sociedade.
De acordo com o pastor Gedelti Gueiros, presidente da ICM, o trabalho de inclusão, feito por meio adaptação do Evangelho para cada necessidade, é essencial para que os mandamentos de Jesus sejam cumpridos e que a Palavra alcance a todos.
“O ensino bíblico é fácil de ser explicado. A Bíblia foi inspirada pelo Espírito Santo, e faz parte do desejo dEle que as pessoas entendam a Palavra. Nós temos interesse de que todas as pessoas entendam essa necessidade, e o que temos hoje no nosso meio é um grupo que vem trabalhando há muito tempo, em um trabalho pioneiro e ao mesmo tempo muito social, ligado a um projeto também do Evangelho”, afirma.
O pastor Luiz Eugênio Santos, secretário-geral da ICM, complementa que esse trabalho evangelizador é fruto direto do amor de Cristo, que não faz acepção de pessoas.
“O amor do Senhor é por todos. O objetivo de nosso trabalho é que as pessoas tenham acesso à palavra de Deus e lembrem que o Evangelho foi feito para todos, não só para alguns”, ressalta.
Um dos princípios bíblicos fundamentais difundidos por Jesus é justamente o amor que não vê diferenças e superioridade. Esse é também o norteador do trabalho realizado pela Maranata. Para o Pastor Lucimar Bízio, professor doutor no Instituto Federal de São Paulo e que participa da coordenação da Acessibilidade da ICM, o Seminário é a oportunidade de todos terem acesso a esse amor, difundido por meio da Palavra.
“Começamos os projetos oficiais de acessibilidade em 2004, com a sistematização do ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Nós fizemos muitos seminários sobre o tema, voltados para os surdos, mas, como começou a crescer a questão do autismo, do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e de outras deficiências, estendemos o acolhimento também a esse público”, declara o pastor.
Bízio ressalta que, para que todos sejam contemplados, o evento foi montado tendo como base uma equipe diversificada, integrando tanto a visão médica quanto pedagógica. “Os vários tipos de conhecimento se somam para que seja oferecido o melhor para cada pessoa. Não há uma concorrência da clínica com a igreja, pois esse trabalho sai dos nossos muros e permite que a pessoa se beneficie onde quer que ela esteja, já que o conhecimento ultrapassa qualquer barreira”, destaca.
Para que esse propósito de espalhar a Palavra seja verdadeiramente alcançado, a Maranata conta com a ajuda de membros com formações profissionais especializadas. Neurologia, psiquiatria e educação especial, que adaptam as mensagens religiosas às necessidades de cada pessoa, são apenas algumas delas.
“Temos professoras da nossa Escola Bíblica Dominical (EBD) que preparam as aulas semanais para as crianças com deficiência em cinco níveis de complexidade linguística, pensando sempre na compreensão de linguagem de cada criança. Os níveis vão desde o um, em que a adaptação é bem pequena em relação ao estudo, até o nível cinco, com um linguajar extremamente direto, para aqueles que têm um tempo de atenção curto”, explica a neurologista infantil Maria Amin, que atua na profissão há mais de 40 anos e usa dos conhecimentos para servir na igreja desde o início das atividades de inclusão.
Na ICM, o trabalho citado por Maria estende-se para além das crianças e contempla todas as faixas etárias, como a de bebês, adolescentes, jovens, adultos e, inclusive, dos idosos.
O pastor Aaron Froede, médico oncologista e responsável pelo grupo de idosos do trabalho de acessibilidade da igreja, diz que, muitas vezes, a pessoa idosa precisa de uma ajuda para interpor algumas barreiras e chegar à compreensão do Evangelho. Ou seja, a adaptação também é necessária para este público.
“O que nós observamos é que o envelhecimento é um fenômeno mundial, e o Brasil está incluído nisso. Nesse processo biológico, o indivíduo pode ficar privado de algumas funcionalidades. Temos idosos, por exemplo, que por questões de saúde não conseguem estar presencialmente aos cultos por mobilidade, e precisam de alguém que os leve ao templo. Eles se sentem muito felizes quando isso acontece e veem uma igreja lembrando deles, pois se sentem incluídos de fato no corpo de Cristo”, comenta.
Já em relação ao trabalho realizado com as crianças, a inclusão está mais direcionada ao entendimento das mensagens bíblicas. Por isso, ferramentas para além da adaptação de linguagem também são essenciais para o aprendizado, como os pictogramas e materiais táteis usados de acordo com a necessidade de cada criança.
“Os pictogramas são uma forma de comunicação alternativa e aumentativa, que ajudam a criança a entender conceitos mais abstratos. Por exemplo: ao contar a história dos pastores que guardavam as vigílias da noite, colocamos imagens que respondam “o que é vigiar? O que é dormir? Vigiar o quê?”. Assim, trazemos exemplos práticos, que podem ser feitos também com materiais que nós chamamos de sensoriais e táteis, que são concretos”, relata a professora Juliana Bezerra, que já atua neste trabalho da igreja há 20 anos.
Outro ponto de atenção essencial para o sucesso do trabalho é a participação ativa das famílias no processo. A professora e musicoterapeuta Janaína Zumach explica que o olhar para a família e o acolhimento dos membros também é essencial para a criança se sentir à vontade e construir laços de confiança com a equipe de apoio.
“É a família que vai nos passar pontos importantes sobre a criança. Se ela possui necessidade de usar abafador por uma sensibilidade auditiva ou se possui aversão ao som de algum instrumento, por exemplo. Com essas informações, adequamos os cultos e as atividades”, completa.
Com um trabalho de inclusão que contempla variados tipos de deficiências e transtornos, estudos e capacitações sobre a característica de cada um deles também fizeram parte do seminário.
A secretária-geral do trabalho de acessibilidade na ICM, Leonice Rocha, reforça que pessoas com o mesmo transtorno podem apresentar níveis diferentes de suporte, como no caso do autismo.
“Cada ser é um ser. O autista, por exemplo, traz consigo necessidades individuais, então, o que eu trato com um, não é a mesma coisa que vou tratar com outro. Quando o pastor está falando, precisamos trabalhar para que a criança entenda a Palavra e, futuramente, possa usar desse conhecimento para participar do trabalho da igreja”, afirma Leonice, que também é doutora em Ciência da Educação e pós-graduada em Autismo.
Além do autismo, a ICM também está comprometida em fornecer alternativas para o aprendizado de pessoas portadoras de outros transtornos. A psiquiatra e bióloga Ana Peixoto, que veio de São Paulo para falar sobre o tema no evento, conta que, na maior parte dos casos, o trabalho de acessibilidade também está intimamente ligado à saúde mental.
“Autismo e TDAH são transtornos, assim como depressão e ansiedade. Temos que lidar com essas pessoas as acolhendo junto às diferenças, sem olhar só para o próprio transtorno, mas para a pessoa como um todo, com características individuais. Quando pregamos a Palavra, nós estamos mostrando que existe um caminho que não é de dor, mas sim de paz e aceitação”, reforça.
Quem convive com essa realidade nas salas de aula da igreja, como as professoras Miriam Rezuski e Juliana Muniz, relata que a paciência e compreensão são elementos fundamentais para o sucesso da obra.
“Diversos fatores estão envolvidos nessas questões comportamentais, e o segredo total é a paciência. Com ela, conseguimos controlar a impulsividade e construir uma relação de confiança com a criança, por meio da aproximação e tranquilização, o que gera um equilíbrio”, observa Miriam.
Outro trabalho que a ICM realiza é com pessoas com deficiência visual. Por meio de iniciativas voltadas à acessibilidade, a igreja oferece suporte espiritual acessível a cegos e pessoas com baixa visão, com a disponibilização de conteúdos bíblicos em braile, recursos em áudio e transmissões com linguagem adaptada. O trabalho, que abrange cultos e atividades doutrinárias, visa garantir que todos os fiéis tenham pleno acesso às mensagens de fé, reforçando o princípio da igualdade no exercício da espiritualidade.
"Temos apoio nos cultos para que seja feita a audiodescrição. Na hora da mensagem, a equipe que faz esse trabalho pontua o que é mais essencial para a compreensão da Palavra, para que a pessoa com deficiência visual não se perca. Cada interpretação da audiodescrição também é feita de acordo com o nível de suporte que a pessoa precisa, assim como de acordo com a função que ela está exercendo na igreja", conta a neurologista Maria Amin.
O que não faltam são testemunhos do sucesso do trabalho da ICM com seus membros, como o do pastor Rubem Pereira, que veio do Rio de Janeiro, para falar sobre sua experiência. Em 1999, Rubem sofreu um acidente que resultou em traumatismo craniano e, posteriormente, em um glaucoma. Traumas que fizeram com que sua visão fosse se debilitando até o 2020, quando foi confirmada a perda total.
“Depois que perdi a visão, cheguei a pensar que não seguiria mais no ministério, mas, pelo contrário, recebi da igreja acesso para que eu pudesse continuar exercendo a atividade. Eu vejo isso como uma benção muito grande, e fico muito feliz pela igreja dar toda essa assistência àqueles que necessitam de cuidados especiais”, celebra o pastor.
O marceneiro Gabriel Nascimento também traz consigo uma história de superação alcançada por intermédio da ICM. Surdocego, Gabriel não possuía qualquer linguagem até os 20 anos, quando se tornou membro da Maranata e aprendeu a se comunicar por meio da Libras tátil, uma forma de comunicação, por meio do tato, que usa a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Hoje, aos 30 anos, ele já fez um curso de marcenaria no Senac de São Paulo, Estado em que mora, e fala em se casar, estudar mais e constituir uma família.
“Antes de conhecer a igreja, eu era triste, sozinho, angustiado. Quando eu conheci a Igreja Maranata, fui evoluindo e conhecendo vários lugares do país, vários irmãos e várias cidades. Fui para Minas Gerais, Manaus, Maceió, Rio de Janeiro, Paraíba… Hoje, eu me sinto uma pessoa diferente. Eu já fui batizado com o Espírito Santo, exerço a função de obreiro na igreja e já até conduzi louvor”, contou Gabriel por meio da tradução de Solange Martin, sua intérprete há 10 anos.
Outros dois exemplos transformadores são o dos estudantes Thiago Costa Filho, de 15 anos, e Estevão Maia, de 18 anos. Thiago, que é uma pessoa com autismo e altas habilidades, viu na igreja uma forma de ser incluído e praticar seus interesses.
“A escola identificou que o Thiago tinha necessidades especiais e logo fomos atrás do diagnóstico, para traçar estratégias de forma correta. Observamos diariamente o trabalho da igreja em trazer uma linguagem para que meu filho possa participar e se sentir verdadeiramente incluído”, relata Sara Costa, mãe do adolescente.
Já Estevão, que veio de Baixo Guandu, nasceu com hidrocefalia e foi diagnosticado com deficiência intelectual e tem na mãe e na igreja dois grandes pilares para manter uma vida de qualidade. “Meu filho é bem aceito e bem amado, posso ver que a igreja ama muito ele, ora muito por ele. Vim para o seminário pois sou professora e especialista em educação especial, e quero levar um conhecimento melhor para a minha comunidade, que tem outras crianças com deficiências e transtornos”, conta Lucimar Storch, mãe do estudante.
E também tem quem veio de muito longe para também adquirir conhecimentos no evento e transformar a realidade de sua igreja, como no caso do pastor Antunes Torres Júnior, que é de Alagoas e coordena o trabalho de acessibilidade na região Nordeste.
“Esse trabalho de qualificação é muito importante. Isso porque, ele faz com que os irmãos que têm o desejo de realizar a obra do Senhor na área possam estar inseridos nesse trabalho. Além de adquirir conhecimento nos seminários e oficinas que permitem crescer tanto na parte intelectual quanto na prática da acessibilidade e do acolhimento dentro da igreja”, finaliza.
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