O Senado concluiu na tarde desta quarta-feira (2) o primeiro turno da votação da reforma da Previdência. O plenário rejeitou na sessão três destaques (sugestões de mudança) previstos. Outros quatro já haviam sido analisados na terça-feira (1º), quando o texto-base foi aprovado, e um deles foi acatado. Isso reduziu em R$ 76 bilhões a economia em dez anos com a reforma.
Por se tratar de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o texto ainda precisa passar por mais uma votação em plenário, em segundo turno. Especialistas ouvidos pela reportagem afirmam que o texto atual, apesar de ter sido desidratado, mantém a essência. Eles afirmam que o próximo desafio é incluir na mudança os Estados e municípios e uniformizar regime de policiais militares e bombeiros. Veja abaixo o que eles dizem sobre alguns pontos polêmicos e mudanças ocorridas durante a tramitação.
A expectativa inicial do governo era de uma economia de R$ 1,2 trilhão em dez anos. Após passar pela Câmara e pelo Senado (em primeiro turno), a previsão caiu para R$ 800 bilhões de economia aos cofres da União.
Rafael Vasconcelos, advogado do Instituto Nacional de Proteção aos Aposentados e Consumidores: As perdas da previsão do montante de economia esperado acabam sendo ajustes de concessão política. Já se imaginava que algumas coisas seriam cortadas. Na minha visão, alterações feitas até agora foram poucas em relação a expectativa de especialistas.
Geraldo Benício, advogado previdenciarista: O texto já havia sido desidratado na Câmara, na verdade, e foi ainda mais no Senado. Mas eu acho que os senadores estão, de certa forma, acompanhando o que a Câmara decidiu.
No primeiro turno do Senado, foi aprovada uma alteração sobre abono salarial que reduziu em R$ 76,4 bilhões a previsão de economia. Hoje, o abono é pago anualmente para quem recebe até dois salários mínimos (R$ 1.996,00). O texto aprovado pela Câmara previa que o pagamento ficaria restrito aos trabalhadores de baixa renda, que ganham até R$ 1.364,43, porém essa limitação foi derrubada com o destaque.
Rafael Vasconcelos: O impacto da alteração sobre o abono salarial não influencia tanto como a questão da pensão por morte ou regra de cálculo da idade mínima. Talvez houve uma concessão para que outros parlamentares aceitassem a aprovação do restante do texto.
Geraldo Benício: Esse esse é um ponto negativo que o governo não esperava. Poderia ter sido feita uma articulação melhor. O governo deu uma cochilada e tiraram esse montante da economia prevista com a reforma.
Por se tratar de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), o texto ainda precisa passar por mais uma votação em plenário, o segundo turno. Para a reforma ser aprovada, deve contar com a aprovação de pelo menos 49 dos 81 senadores.
Rafael Vasconcelos: Não acredito que vá haver uma grande modificação no segundo turno. Principalmente porque já houve articulação muito forte por parte do governo.
Geraldo Benício: Acredito que não deve haver mais mudanças no texto principal. A perda que o governo teve no primeiro turno (abono), ele vai atuar para que não se repita.
A proposta de emenda à Constituição 133/2019, conhecida como PEC paralela da Previdência, traz pontos que ficaram de fora da proposta principal. Parlamentares querem incluir Estados e municípios nas novas regras do sistema por meio do projeto.
Rafael Vasconcelos: É preciso que Estados e municípios estejam nessa PEC paralela por conta daqueles que estão passando por grande déficit fiscal e já estão, inclusive, atrasando o pagamento dos servidores. Essa inclusão dará garantias para os servidores da ativa de que não haverá colapso no futuro. Se não sair PEC Paralela, Estados serão forçados a fazer a mudança nas suas legislações próprias. Mas a ideia é que haja uma uniformização entre todos.
Geraldo Benício: A PEC paralela é de extrema importância para o sistema previdenciário. Se for deixada de lado, a reforma fica capenga porque os entes terão dificuldade em pagar e baterão à porta da União para conseguir arcar com as dívidas na Previdência. É de suma importância essa inclusão agora que a reforma passa a ser mais igualitária. Com Estados e municípios contemplados, todos vão obedecer às mesmas regras e isso deve trazer economia em torno de R$ 300 bilhões a eles.
O governo decidiu incluir policiais militares e bombeiros na proposta de reforma da Previdência dos integrantes das Forças Armadas, um projeto separado do principal. Segundo a proposta, PMs e bombeiros terão que cumprir as mesmas contrapartidas dos militares das Forças Armadas: pagamento de contribuição previdenciária pelos pensionistas e aumento do tempo de contribuição de 30 para 35 anos. Também está previsto aumento progressivo na alíquota de contribuição previdenciária para 10,5% em 2022 (atualmente a alíquota é de 7,5%). Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que a inclusão de PMs e bombeiros deve gerar economia de R$ 29 bilhões em 10 anos,
Rafael Vasconcelos: A minha visão é de no mínimo tentar uma uniformização, mesmo que com regra mais branda. É preciso uma uniformização na forma de concessão de benefício para que não haja discrepância muito grande entre as categorias. A expectativa dos brasileiros e que tenham todos direitos iguais.
Geraldo Benício: Acho que é positivo porque no início havia discussão porque as Forças Armadas não entraram, que não era uma reforma para todos. O governo vinha dizendo que as Forças Armadas eram um outro sistema. Entrando os bombeiros e PMs na regra gera mais economia para o sistema previdenciário e traz de fato a ideia de igualdade.
Rafael Vasconcelos: Mudaria a regra de cálculo do benefício que, com a reforma, passa a ser com base em todos os salários do trabalhador desde que o plano real foi implementado. Na regra atual, 20% dos salários menores são desconsiderados e o cálculo é feito com base nos 80% maiores. Seria mais justo para a população do regime geral que mantivesse a regra dos 80%. Na minha visão, é um ponto que as pessoas que se planejavam para ter um salário maior ao final da carreira, por exemplo, vão perder.
Geraldo Benício: Mudaria algumas regras que foram votadas em relação às aposentadorias especiais, que ficaram muito injustas. Na regra atual os trabalhadores que ficam expostos a agentes químicos e biológicos têm redução do tempo de trabalho para aposentar com 15, 20 e 25 anos, independente de idade. Porém, com a mudança, a pessoa vai precisar provar ter 60 anos de idade e vai começar recebendo 60% do benefício. Não é justo exigir esse tempo para pessoas expostas a agentes agressivos à saúde, como os que trabalham em minas, ou expostas à radiação. A pessoa pode não chegar nessa idade.
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