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Barroso defende que FGTS tenha pelo menos a remuneração da poupança

Barroso defende que FGTS tenha pelo menos a remuneração da poupança

Ministro relator do caso é a favor da revisão para aumentar a correção do dinheiro do trabalhador; julgamento no STF será retomado no dia 27

Publicado em 20 de abril de 2023 às 20:07

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CRISTIANE GERCINA E FERNANDO NARAZAKI

SÃO PAULO - O ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação que discute a revisão do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) no STF (Supremo Tribunal Federal), defendeu que o dinheiro dos trabalhadores deve ter pelo menos a remuneração da poupança.

"A remuneração do FGTS não pode ser inferior à caderneta", disse, em seu voto favorável à correção durante julgamento nesta quinta-feira (20), em que se decidia se o índice de correção atual do FGTS é constitucional.

FGTS - aplicativo, saque, dinheiro
Ação no FGTS pede revisão na taxa de correção do FGTS. (Carlos Alberto Silva)

Para Barroso, não há direito constitucional à correção monetária para repor a inflação, mas o modelo atual de remuneração do FGTS "não é razoável". Hoje, o dinheiro do FGTS tem juros de 3% ao ano mais correção pela TR, que rende próxima de zero.

O ministro limitou, entretanto, os efeitos da decisão. Para ele, a nova forma de atualização do fundo não deve ser retroativa e passaria a ser válida a partir da publicação da ata de julgamento. O voto é por "estabelecer os efeitos dessa decisão a partir da publicação da ata de julgamento", disse.

O julgamento foi suspenso pela ministra Rosa Weber após a apresentação dos votos de Barroso e do ministro André Mendonça e poderá ser retomado na quinta (27).

Na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), os ministros discutem a possibilidade de substituir a TR por um índice inflação, que pode ser o IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor - Especial) ou o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), para repor as perdas dos trabalhadores.

Em seu voto, o ministro relator entendeu que o FGTS é "uma poupança do trabalhador com a promessa constitucional implícita" de que o profissional acumula o valor e, por fim, na demissão ou aposentadoria, poderá "desfrutar de alguma tranquilidade" ao resgatar o dinheiro.

Ele negou os pedidos da AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o governo, para extinção da ação. Barroso reconheceu que o mérito social da lei que determina o uso dos recursos do fundo em habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana, mas acredita que o trabalhador não pode ser prejudicado por isso.

"Impossível não concordar com essas finalidades sociais desse investimento", disse.

O ministro André Mendonça disse que reforçaria a tese de Barroso na revisão do FGTS e acrescentou, em seu voto, que a TR é inconstitucional. Mendonça apresentou cálculos que exemplificam as perdas dos trabalhadores ao comparar a TR, o IPCA-E e INPC.

O julgamento da revisão começou com 30 minutos de atraso. Estavam presentes na sede do Supremo a ministra Rosa Weber, presidente da corte, e os ministros Barroso e Alexandre de Moraes. Acompanharam a sessão de forma remota Luiz Fux, Edson Fachin, Kássio Nunes Marques, André Mendonça e Dias Toffoli.

No início, houve momento de descontração, quando Fachin teve sua conexão interrompida e, ao retomá-la, não conseguia ligar seu microfone. "Peça a ajuda de um neto", brincou Barroso.

Em seguida, Barroso apresentou seu relatório, apontando os argumentos dos trabalhadores pela inconstitucionalidade da TR, e, depois, os do governo, contra a mudança na correção. Barroso lembrou ainda que, em 2018, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) negou a alteração, sob o argumento de que não cabe ao Judiciário essa decisão.

Depois, foram apresentadas as sustentações orais dos advogados a favor e contra a tese, incluindo os representantes de órgãos que puderam atuar como amicus curiae (amigos da corte).

Os advogados Alysson Sousa Mourão e Saul Tourinho Leal, que representaram o partido Solidariedade, autor da ação, reforçaram a tese de que a correção é inconstitucional por não repor o poder de compra do trabalhador.

Na ADI, que chegou ao Supremo em 2014 após estudo encomendado pelo partido e pela Força Sindical, aponta-se prejuízo de 88,3% sobre o saldo depositado no FGTS de 1999, quando a TR foi modificada, até 2013, data do estudo.

Jorge Rodrigo Araújo Messias, advogado geral da União, apontou o fato de que o Fundo de Garantia tem lei própria, com dois princípios básicos: proteger o trabalhador e fomentar políticas de moradia e saneamento básico, ou seja, não é apenas uma proteção ao trabalhador, mas também é um fundo social, tese defendida em 2018 no STJ.

Houve também o argumento de que, com a divisão de lucros do FGTS, a partir de mudança em 2017, a remuneração devida ao trabalhador tem sido maior, com perdas menores.

O advogado Erasto Villa Verde de Carvalho Filho, do Banco Central, defendeu a TR e explicou parte do cálculo da taxa que, em suas palavras, "não é uma conta simples". "Ela contém uma fórmula da maior complexidade", disse.

Segundo ele, em 2018, a taxa foi modificada justamente para que não houvesse perdas extras aos trabalhadores, já que a fórmula de cálculo definida em 1999 estava ultrapassada, com regras que a derrubariam ainda mais.

"A TR é calculada com base na taxa básica financeira. Até 2018, levava em consideração RDB e CDB. Essa era a base de cálculo da TBF que, por sua vez, segue para a base de cálculo da TR. O volume de CDBs e RDBs diminuiu muito e deixou de ser significativo", explicou.

Para que a taxa "não caísse de forma vertiginosa", o BC mudou a base de cálculo da TBF para mantê-la nos mesmos níveis praticados para assegurar a remuneração dos trabalhadores, segundo ele.

Além disso, o advogado afirmou que o Fundo de Garantia não foi criado pela Constituição de 1988, mas sim por lei da década de 1960 e, futuramente, foi "constitucionalizado". Para ele, não caberia discussão sobre a constitucionalidade ou não da TR.

Se for aprovada, a revisão do FGTS deve beneficiar 117 milhões de contas do Fundo de Garantia de 70 milhões de trabalhadores. Além disso, cerca de 200 mil ações que estão na Justiça devem voltar a andar. Segundo cálculos da AGU, o prejuízo com a correção ultrapassa R$ 661 bilhões.

O que é a revisão do FGTS?

É uma ação judicial na qual se questiona a constitucionalidade da correção do dinheiro depositado no Fundo de Garantia. Hoje, o retorno do FGTS é de 3% ao ano mais a TR, que rende próxima de zero. Com isso, a atualização do dinheiro fica abaixo da inflação, deixando de repor as perdas do trabalhador.

Desde 1999, quando houve modificação no cálculo da TR, os trabalhadores acumulam perdas.

Por que se questiona a correção?

A TR, usada para corrigir o dinheiro do fundo, tem rendimento muito baixo, próximo de zero, fazendo com que os trabalhadores não consigam repor seu poder de compra com o saldo do dinheiro do FGTS. Diversos cálculos apontam perdas que vão de 24% nos últimos dez anos a até 194% para quem tem valores no fundo desde 1999.

Em 2014, data do início da ação, estudo da Força Sindical mostrou que um trabalhador que tinha R$ 1.000 no ano de 1999 no Fundo de Garantia tinha, em 2013, R$ 1.340,47. Se fosse considerada a inflação medida pelo INPC, usado na correção de salários, o valor deveria ser de R$ 2.586,44, uma diferença de R$ 1.245,97.

Na defesa da correção maior, especialistas alegam que o dinheiro do FGTS é renda proveniente do salário e não pode trazer perdas, pois não se trata de um investimento.

Quais os próximos passos

Agora, os trabalhadores devem esperar novos votos de ministro e o final do julgamento, o que ainda não tem data para acontecer. Além disso, após a decisão, se a revisão for realmente aprovada, poderá haver embargos de declaração, que é um pedido para esclarecer algum ponto da decisão, e ainda, a chamada modulação dos efeitos, para que o Supremo determine quem poderá receber os valores atrasados. Se apenas quem entrou na Justiça ou todos que tiveram perdas.

Quem tem direito à revisão?

Todos os trabalhadores com dinheiro no fundo a partir de 1999 podem ter direito à correção. Segundo a Caixa, há 117 milhões de contas do Fundo de Garantia entre ativas e inativas.

Especialistas calculam que ao menos 70 milhões de trabalhadores podem ser beneficiados. É possível que um trabalhador tenha mais de uma conta, aberta a cada novo emprego com carteira assinada.

A expectativa é que todos tenham novos depósitos corrigidos pela nova regra a partir de então. Para definir questões como o pagamento de valores de anos anteriores, por exemplo, o STF terá de modular o tema.

Na modulação, pode-se decidir que a Caixa deve pagar apenas a quem entrou com ação até 2014 ou até a data em que foi marcado o julgamento ou ainda apenas para os que fazem parte de ações coletivas. É preciso, no entanto, esperar o que Supremo irá decidir e como irá modular a questão.

Como funciona o FGTS?

O FGTS funciona como uma poupança para o trabalhador. O fundo foi criado em 1966, com o fim da estabilidade no emprego, e passou a valer a partir de 1967. Todo mês o empregador deposita 8% sobre o salário do funcionário em uma conta aberta para aquele emprego.

Há ainda a multa de 40% sobre o FGTS caso o trabalhador seja demitido sem justa causa. Desde a reforma trabalhista de 2017, há também a possibilidade de sacar 20% da multa após acordo com o empregador na demissão.

Quem tem direito ao FGTS

Todo trabalhador com carteira assinada deve ter o FGTS depositado, o que inclui, atualmente, as empregadas domésticas. Até 2015, não havia direito ao FGTS por parte das domésticas. A PEC das Domésticas, porém, trouxe essa possibilidade em 2013, mas a lei que regulamentou a medida e possibilitou os depósitos dos valores por parte dos empregadores passou a valer apenas dois anos depois.

Como saber meu saldo?

O valor pode ser consultado no aplicativo FGTS, por meio do extrato do fundo. É possível, ainda, conseguir uma cópia do extrato nas agências da Caixa. Para cada empresa em que o trabalhador foi contratado, há uma conta vinculada aberta. É preciso observar o valor em cada conta e somar o quanto tem, ao todo.

Como sacar meu FGTS?

O FGTS só pode ser sacado em situações específicas, conforme a lei, como aposentadoria, compra da casa própria, demissão sem justa causa ou doença grave. Em 2019, foi acrescentada mais uma situação, que é o saque-aniversário. No entanto, quem opta por essa modalidade não pode fazer o saque-rescisão ao sair do emprego. Vejas 16 situações:

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