SÃO PAULO - A Bolsa brasileira encerrou esta quinta-feira (23) no menor patamar desde julho de 2022, com o mercado revisando suas projeções para os juros após o Banco Central (BC) não abrir caminho para um corte da taxa, como se esperava. Apesar de ter começado o dia em alta, a tendência se inverteu e clima piorou com as críticas feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à autoridade monetária.
Na quarta (22), o Copom (Comitê de Política Monetária) divulgou a manutenção da Selic em 13,75% ao ano. A decisão já era esperada pelo mercado, mas a postura dura do comunicado, ressaltando inclusive a possibilidade de voltar a subir os juros, caso as condições econômicas se deteriorem, surpreendeu analistas.
A atuação do BC vem sendo alvo de ataques do governo Lula, que pressiona por uma redução da Selic. Após a decisão desta quarta (22), o presidente voltou à carga e disse nesta quinta-feira (23) que a "história julgará" as decisões da autoridade monetária.
"Como presidente da República não posso ficar criticando cada relatório do Copom. Eles que paguem o preço do que estão fazendo. A história julgará cada um de nós", disse Lula.
O presidente defendeu ainda que o Senado adote medidas para que o presidente do BC, Roberto Campos Neto — a quem Lula já chamou de "esse cidadão" —, se preocupe com o emprego e a renda no país.
"Quem tem que cuidar do Campos Neto é o Senado que o indicou. Ele não foi eleito pelo povo, nem pelo presidente. Ele foi indicado pelo Senado. Se esse cidadão quiser, ele não precisa nem conversar comigo. Ele só tem que cumprir a lei que estabeleceu a autonomia do Banco Central. Ele precisa cuidar da política monetária, mas também do emprego, inflação e da renda do povo."
Questionado se Campos Neto estava cumprindo esse papel, Lula respondeu: "Não está fazendo. Todo mundo sabe que ele não está fazendo. Se estivesse fazendo, não estava reclamando. Eu sou bobo de reclamar?"
Na véspera, logo após a divulgação do comunicado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), também havia criticado a decisão do Copom, considerada por ele "muito preocupante".
Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Rena, afirma que as críticas ao BC contribuem para o comportamento dos investidores nesta quinta (23). "Acabam gerando um mal-estar no mercado".
O Ibovespa fechou em baixa de 2,28%, a 97.926 pontos, pior marca desde 18 de julho do ano passado. Na mínima do dia, o índice chegou a bater em 96.996 pontos. O dólar comercial à vista encerrou o dia com alta de 0,996%, a R$ 5,288.
No mercado de juros, as taxas fecharam em alta. No vencimento para janeiro de 2024, a taxa avançou de 13,02% no fechamento desta quarta-feira (22) para 13,20%. Para janeiro de 2025, a taxa subiu de 12,05% para 12,12%. No vencimento em janeiro de 2027, os juros passaram de 12,31% para 12,36%.
"Na minha visão, o BC foi na contramão das expectativas de agentes de mercado mais otimistas, que esperavam um tom mais leve e até mesmo uma eventual antecipação de corte de juros para o curto prazo", afirma Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos.
Para Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, o BC sinaliza que manterá a sua política enquanto a inflação estiver em patamares acima da meta.
"Por ora, mantemos nossa projeção de estabilidade da Selic em 13,75% até o final do ano. Reconhecemos, entretanto, a possibilidade de cortes mais cedo, a depender da evolução dos choques financeiros e da evolução da economia brasileira", afirma a economista da Rico.
Raone Costa, economista-chefe da Alphatree, afirma que os modelos do BC mostram que a inflação deve se manter acima da meta até o terceiro trimestre de 2024.
"A única chance de corte de juros seria uma deterioração da economia global, por conta da crise do sistema financeiro. No momento, não é o cenário mais provável. O comunicado do BC aumenta inclusive a chance de novas altas nos juros", diz Costa.
Para a equipe de análise da Levante Investimentos, a falta de uma perspectiva clara para a inflação é um ponto de atenção para o BC.
"Ao tratar das projeções do mercado para os preços, o BC trocou 'se distanciando da meta' por 'desancoradas em relação às metas'. Ou seja, o BC admitiu que o mercado perdeu clareza na formação futura de preços. Isso torna mais difícil fazer com que a inflação convirja em direção à meta", diz a Levante.
Nicola Tingas, economista chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituições de Crédito Financiamento e Investimento) tem uma visão diferente sobre o futuro da trajetória da Selic.
"Meu cenário básico é de queda dos juros na reunião de maio ou na de junho. O BC admite que pode revisar e fazer ajustes na política monetária se houver mudanças no ambiente. Estamos vendo uma inadimplência crescente no crédito, e as empresas não conseguem ter acesso ao mercado de capitais. O BC deve estar atento a isso", diz Tingas.
Em Nova York, os índices de ações oscilaram bastante, ainda pelas preocupações com o sistema financeiro americano. Mas com uma recuperação na parte final do pregão, os mercados fecharam em alta, com destaque para as empresas de tecnologia.
O índice Dow Jones fechou em alta de 0,23%. O S&P 500 subiu 0,30%, e o Nasdaq fechou o dia com avanço de 1,01%.
Entre as ações listadas no Ibovespa, poucas fecharam em alta. A maior queda ficou com o papel ordinário do Magazine Luiza, com recuo superior a 13%.
"Enquanto os juros permanecerem altos, teremos performances ruins dentro do setor de varejo. Principalmente para as empresas mais endividadas, que assumem um custo de dívida extremamente alto", afirma Lucas Caumont, estrategista de investimentos da Matriz Capital.
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