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Bolsa oscila com crises sanitária e política em um ano de pandemia

Bolsa oscila com crises sanitária e política em um ano de pandemia

2020 foi um ano de emoções no mercado de capitais. Quem viveu o mercado financeiro na quarta-feira de Cinzas do ano passado, não esquece o sufoco

Publicado em 27 de fevereiro de 2021 às 10:28- Atualizado há 4 anos

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Epidemia do coronavírus está afetando a Bolsa de Valores de todo o mundo
Pandemia do novo coronavírus fez as Bolsas de Valores em todo o mundo mergulhar. (Adobe Stock)

SÃO PAULO - Há um ano, a chegada oficial do coronovírus ao Brasil fez a Bolsa brasileira mergulhar. Era o pregão da quarta-feira de Cinzas, 26 de fevereiro, a volta do Carnaval, e o Ibovespa despencou 7%. Foi o primeiro sinal sobre o tamanho do impacto econômico que estava por vir.

Já em abril, porém, a B3, acompanhando os pregões do mundo, iniciou uma recuperação surpreendente. O mercado acionário fechou o ano recuperando perdas e dando até lucros. Ocorre que. por uma dessas curiosas coincidências, esta sexta-feira (26) encerra uma semana com turbulências e incertezas.

No Brasil, o baque agora vem da política, especificamente das intervenções do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em estatais listadas na Bolsa, como Petrobras e Banco do Brasil, e da piora do cenário fiscal. Lá fora, cresce a incerteza sobre os efeitos dos pacotes de socorro sobre as economias desenvolvidas, especialmente sobre a inflação e suas consequências.

Em retrospecto, foi um ano de emoções. Quem viveu o mercado financeiro na quarta-feira de Cinzas de 2020, não esquece o sufoco.

"Naquela quarta, o nível de incerteza era muito maior que hoje. Não se conhecia muito a doença, não havia protocolo médico e nem perspectiva de vacina no curto prazo. A única solução era fechar tudo, o que gerou o maior choque econômico dos últimos 100 anos", afirma Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP.

Naquele pregão, o dólar subiu para R$ 4,45, um recorde nominal (sem considerar a inflação) à época. Desde então, a moeda chegou a R$ 5,9040 em maio, atual recorde nominal.

A desvalorização do real e das ações brasileiras em fevereiro de 2020 foi um reflexo do que já estava acontecendo nos mercados de ações internacionais durante o feriado de Carnaval, em que as negociações no Brasil ficaram paralisadas. Investidores se desfaziam rapidamente de ativos de risco com o aumento de casos do coronavírus fora da China, especialmente na Itália.

Em março, o cenário piorou e a B3 teve seis circuit breakers —interrupção das negociações de ativos, derivativos e títulos de renda fixa privada na Bolsa quando a queda do Ibovespa supera 10%. A marca é semelhante à de 2008, ano da crise financeira.

Desde então, diversas vacinas se provaram eficazes contra a Covid-19 e bancos centrais e governos saíram em socorro ao mercado e às economias. Na esteira da ajuda financeira dos Estados e dos rápidos avanços da ciência, as principais Bolsas de Valores globais foram se recuperando.

"Havia muita incerteza do tamanho do colapso. Sem a ajuda dos governos e injeção de estímulo, a crise seria mais severa", diz Marcelo Sá, Estrategista do Itaú BBA.

Segundo estudo da McKinsey, as respostas de governo à crise de 2020 foram muito superiores à de 2008. A injeção de capital somou algo como US$ 10 trilhões em estímulos econômicos apenas nos dois primeiros meses de impacto do coronavírus, o triplo do que governos gastaram durante toda a crise financeira passada, de acordo com a consultoria.

O estímulo do Estados Unidos até o fim de maio do ano passado foi equivalente a 12,2% do PIB (Produto Interno Bruto) e, na crise de 2008, foi 4,9%. No Brasil, no mesmo período, ele foi de 5,5% do PIB em 2020 e 0,6% em 2008.

Segundo a XP, ano passado foram cerca de US$ 20 trilhões injetados por governos na economia, aproximadamente 23% do PIB global. Este valor, segundo Ferreira é mais do que recuou o PIB global no período, cerca de 4%.

Com o fluxo de recursos e juros baixos no mundo todo, o Ibovespa recuperou o nível anterior à crise em dezembro de 2020 e em janeiro deste ano, bateu novos recordes, chegando à máxima de 125 mil pontos, impulsionado pela eleição do democrata Joe Biden nos Estados Unidos.

No momento, o governo Biden trabalha para liberar um pacote de mais US$ 1,9 trilhão para auxílio aos americanos, exames de Covid-19 e distribuição de vacinas.

O cenário atual, porém, é de aversão a risco por questões internas e externas, que envolvem previsão de juros mais altos no Brasil e nos EUA e a alta nos novos casos de Covid-19.

INTERVENÇÕES DE BOLSONARO

Esta semana foi marcada por forte deterioração dos principais indicadores financeiros do Brasil. A turbulência começou na sexta-feira (19), quando Jair Bolsonaro (sem partido) interferiu no comando da Petrobras e sinalizar outras intervenções em estatais e nos mercados de combustíveis e energia elétrica.

Para investidores, as mudanças sinalizam um recuo em relação à agenda liberal defendida na companha eleitoral e no início do governo.

Nesta sexta-feira (26), a instabilidade chegou às ações do Banco do Brasil. O presidente da instituição, André Brandão, disse ao governo que não pretende seguir no cargo, mais um sinal negativo aos investidores, favoráveis à permanência do executivo.

O desgaste de Brandão teve início em janeiro, com o plano de enxugamento das estruturas do banco estatal, que o presidente da República crIticou, ameaçando demiti-lo.

Bolsonaro manifestou interesse em trocá-lo do cargo, mas não pretendia fazê-lo agora, sobretudo para não gerar mais desgaste após a intervenção na Petrobras.

"O mercado de capitais brasileiro deu uma esquentada com a eleição de Bolsonaro e a expectativa de reformas, mas os acontecimentos recentes colocam em dúvida a agenda do governo", diz Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV.

As ações do Banco do Brasil fecharam em queda de 4,91%, a R$ 28,05 cada no pregão desta sexta.

As ações da Petrobras também tiveram forte queda. As preferenciais (mais negociadas) cederam 4,09%, a R$ 22,24 cada e as ordinárias (com direito a voto) recuaram 3,10%, a R$ 22,15.

O Ibovespa recuou 1,98%, a 110.035,17 pontos, menor patamar desde 30 de novembro. Na semana, recuou 7%, a pior desde outubro. Em fevereiro, acumulou queda de 4,47%, o pior desde setembro.

No ano, o índice recua 7,4%, desempenho pior do que pares estrangeiros. Em Wall Street, por exemplo, os principais índices têm alta de 1% a 2%, aproximadamente.

"Diante de novos rumores [com relação à saída de Brandão] e o caso Petrobras, o mercado já coloca na conta mais uma intervenção estatal e penaliza o índice, assim como inclina ainda mais a curva de juros", afirma Rafael Ribeiro, analista da Clear Corretora.

Juros futuros são taxas de juros esperadas pelo mercado nos próximos meses e anos. São a principal referência para o custo de empréstimos que são liberados atualmente, mas cuja quitação ocorrerá no futuro.

Em um sinal de aversão a risco do mercado e de alta da Selic no curto prazo, os juros futuros ficaram mais altos nesta semana.

O juro para janeiro de 2025 foi de 6,72% na sexta passada (19) para 7,23% nesta sexta, perto do fechamento do pregão. A taxa para janeiro de 2018 foi de 7,60% para 8,02%.

Segundo analistas, a intervenção de Bolsonaro fortalece a perspectiva de alta da Selic em março —atualmente a taxa está na mínima recorde de 2%.

De acordo com a pesquisa Focus divulgada pelo Banco Central na segunda, a expectativa para a taxa básica de juros subiu para 4% ao final de 2021, de 3,75% na semana anterior.

Os economistas do Itaú já preveem a Selic a 5% ao ano no final deste 2021. Antes, esperavam tal mudança para o final de 2022.

A inflação, o aumento de preços de commodities, o aumento de despesas além do teto de gastos com a provável aprovação do novo auxílio emergencial, e risco de antecipação do aperto monetário nos Estados Unidos são citados pelo banco como justificativa para a mudança no cenário.

Diante das incertezas, o risco-país medido pelo CDS de cinco anos acumula alta de 17,8% apenas nesta semana, indo a 191,7 pontos, maior patamar desde novembro. No mês sobe 10,4% e no ano, 33%.

O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias dos países, especialmente emergentes. Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país, se ele cai, o recado é o inverso: sinaliza aumento da confiança em relação à capacidade de o país saldar suas dívidas.

Somando o preção de sexta (18), quando o mercado começou a reagir às falas intervencionistas de Bolsonaro, e de segunda (22), investidores estrangeiros retiraram R$ 6,8 bilhões da Bolsa brasileira.

Em 2020, a saída foi de R$ 31,8 bilhões sem contar ofertas de ações. Em 2019, a sangria foi de R$ 44,5 bilhões.

O movimento pode ser visto na alta do dólar ante o real, que é a terceira moeda global que mais se desvaloriza em 2021, atrás apenas do peso cubano e dinar líbio.

Nesta sexta, ele fechou em alta de 1,65%, a R$ 5,6020. Para conter a alta do dólar, que foi a R$ 5,6090 na máxima do pregão, o Banco Central vendeu US$ 1,545 bilhão no mercado à vista.

Na semana, a moeda americana acumulou ganho de 4,05%, a maior valorização desde a primeira semana de janeiro. No ano, ela se valoriza 7,95% ante o real.

O dólar turismo está a R$ 5,753.

Em Nova York, o índice S&P 500 cedeu 0,47% na sessão. Dow Jones caiu 1,5% e Nasdaq subiu 0,56%.

No Ibovespa, a BRF teve a maior queda desta sexta, com recuo de 7,16%, mesmo após a empresa reportar lucro de R$ 902 milhões no quarto trimestre, acima do esperado no mercado. Em teleconferência com analistas, executivos citaram expectativa de pressão de custos de grãos no primeiro semestre, que deve levar a mudanças nos preços de produtos da companhia.

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A Via Varejo recuou 6% e CSN, 5,16%. A Minerva teve a maior alta do índice, com valorização de 3,3%. A empresa propôs pagamento complementar de dividendos aos acionistas, embora o lucro líquido no quarto trimestre tenha recuado 53,2% no comparativo anual.

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