Um parecer da Câmara concluiu que a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos, que beneficia 17 setores da economia, não seria inconstitucional, contrariando a tese do governo.
O time do ministro Paulo Guedes (Economia) tem afirmado que, desde a reforma da Previdência, ficou vedado adotar medidas que possam reduzir a arrecadação de recursos do fundo que banca a aposentadoria dos trabalhadores do setor privado.
A conclusão da Mesa Diretora da Câmara é que estender o benefício estaria de acordo com Constituição, pois o incentivo fiscal já é dado a empresas de setores com alto grau de mão de obra.
Procurado, o Ministério da Economia e a Secretaria Geral da Presidência não quiseram se manifestar.
Nesta semana, técnicos do governo afirmaram que derrubar o veto e ampliar - em um ano - o prazo da desoneração da folha, medida que reduz encargos pagos pelos patrões, seria inconstitucional.
No entanto, esse argumento não foi citado para sustentar o veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à decisão do Congresso.
Mesmo fora do embasamento jurídico do veto, a Câmara analisou a tese do Ministério da Economia. Técnicos afirmaram que, por a desoneração da folha já existir, a medida poderia ser prorrogada, pois a reforma da Previdência impediria apenas a criação de novos benefícios.
O parecer lembra que a emenda constitucional que mudou as regras da previdência veda substituição da base de cálculo das contribuições feitas pelas empresas. No entanto, exclui dessa vedação as substituições já estabelecidas - como era o caso da desoneração aos 17 setores.
No documento, os técnicos argumentam que a prorrogação não caracterizaria a criação de uma nova substituição da contribuição patronal. "Corrobora esse entendimento o fato de não serem alterados alíquotas, beneficiários ou quaisquer outros elementos que configuram a substituição", indica o parecer.
O texto diz inclusive que o Congresso poderia tornar permanentes as substituições instituídas antes da emenda da Previdência.
A desoneração da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre o faturamento bruto, em vez de 20% sobre a remuneração dos funcionários para a Previdência Social (contribuição patronal).
Com a troca, setores com elevado grau de mão de obra pagam menos aos cofres públicos. O inventivo foi criado para estimular a contratação de funcionários.
Atualmente, a medida beneficia companhias de call center, o ramo da informática, com desenvolvimento de sistemas, processamento de dados e criação de jogos eletrônicos, além de empresas de comunicação, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiros e empresas de construção civil e de obras de infraestrutura.
A medida se encerraria em dezembro. Em junho, o Congresso aprovou a extensão do incentivo tributário por mais um ano, o que foi vetado por Bolsonaro. Por ano, o Ministério da Economia estima que deixaria de arrecadar R$ 10,2 bilhões.
Empresários desses 17 setores, que reúnem cerca de 6 milhões empregos diretos, dizem que não suportariam esse aumento de custo e que 1 milhão de pessoas poderiam perder os empregos caso o veto seja mantido.
A avaliação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), está em linha com o parecer técnico da Casa. Para ele, o governo tem condição de manter a desoneração por mais um ano, como aprovado pelo Congresso.
"Nós precisamos manter os empregos. Sabemos que a desoneração por mais de um ano [até o fim de 2022] seria um período muito longo, um custo grande, mas a prorrogação por um ano acho que é perfeitamente possível que o governo tenha condições de colocar no orçamento", disse na terça-feira (14).
Maia defende a derrubada do veto pelo Congresso e que os parlamentares encontrem uma forma de compensar, no Orçamento, a manutenção da desoneração até o fim de 2021.
No veto, o governo alegou que alongar o prazo de desoneração fere a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020 e a Lei de Responsabilidade Fiscal - sem mencionar a tese envolvendo a reforma da Previdência.
Além disso, citou um artigo da Constituição que pede estimativa de impacto orçamentário, o que geralmente não é feito em caso de modificações de um projeto ao longo da tramitação. Disse ainda que a prorrogação da desoneração não estava na versão original do texto - embora o próprio governo já tenha recorrido à estratégia de incluir medidas por emenda parlamentar em diversas propostas legislativas.
O clima é contrário à decisão do presidente. Por isso, interlocutores do Palácio do Planalto tentam postergar a votação. Para derrubar o veto é necessário o voto da maioria absoluta das duas Casas - 257 deputados e 41 senadores.
Está prevista para a próxima semana uma reunião de líderes no Senado para decidir sobre quando o veto será analisado. O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), tentar conter a pressão interna no Parlamento e de empresários para que o item seja incluído já na sessão que deve ocorrer até quinta-feira (23).
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