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Comissão do Senado aprova PEC com duração de 2 anos e impacto de R$ 168 bilhões

Comissão do Senado aprova PEC com duração de 2 anos e impacto de R$ 168 bilhões

No primeiro teste no Congresso, PT obtém vitória parcial ao evitar desidratação maior e conquistar valor entendido como viável; proposta vai a plenário

Publicado em 6 de dezembro de 2022 às 21:04

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THAÍSA OLIVEIRA, THIAGO RESENDE E ALEXA SALOMÃO

BRASÍLIA, DF - No primeiro teste de articulação do governo eleito, o PT conseguiu aprovar nesta terça-feira (6) a PEC (proposta de Emenda à Constituição) da Transição — mas com valor menor e tempo mais curto para a apresentação de uma nova regra fiscal.

A proposta aprovada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado retira o Auxílio Brasil (que voltará a se chamar Bolsa Família) do teto de gastos pelo prazo de dois anos e reduz o impacto fiscal para R$ 145 bilhões — R$ 30 bilhões a menos que o apresentado pelo relator.

A PEC também prevê mais R$ 23 bilhões para investimentos fora do teto em caso de arrecadação de receitas extraordinárias. Na prática, a proposta eleva o gasto extrateto para R$ 168 bilhões.

O texto foi aprovado na CCJ em votação simbólica, sem contagem de votos. A proposta depende agora da aprovação de 49 dos 81 senadores no plenário em dois turnos. A sessão está prevista para esta quarta-feira (7).

Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária semipresencial.
Proposta depende agora da aprovação de 49 dos 81 senadores em dois turnos. (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

A versão final aprovada na comissão representa uma vitória parcial do futuro governo. Líderes do Congresso chegaram a articular a redução do prazo da PEC para apenas um ano em vez de quatro anos — todo o mandato do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

No entanto, o período de dois anos já concede um alívio orçamentário na largada da gestão Lula 3. Ainda sem base política fiel no Congresso, a estratégia do PT foi buscar apoio à PEC com base em promessas e sinalizações a partidos que tentam espaço na Esplanada dos Ministérios, como PSD, MDB e União Brasil.

Aliados de Lula avaliam ter entre 54 e 55 votos no plenário — são necessários 49. A bancada do Podemos afirmou que vai tentar reduzir o prazo da PEC de dois anos para um ano nesta quarta. Nesse caso, o grupo também precisará do apoio de 49 senadores.

"Há quase unanimidade entre os senadores de que (o prazo( de dois anos é coerente", afirmou o relator do texto, senador Alexandre Silveira (PSD-MG), após a aprovação.

"A Câmara é completamente independente. É uma Casa que tem as suas lideranças, mas me parece que há uma sinergia muito grande com a maioria das lideranças da Câmara."

"O mais importante é a gente ter a aprovação do principal", afirmou o senador Rogério Carvalho (PT-SE). "(Hoje), uma universidade presta um serviço, (e o valor) tem que estar subordinado ao teto. Tem uma série de coisas (na PEC) que abre espaço para que o país possa respirar e gerar empregos."

A votação na CCJ ocorreu mediante acordo depois que o governo eleito concordou em reduzir o valor estimado para o pagamento do benefício social e enviar um novo arcabouço fiscal até agosto de 2023. O relatório apresentado por Silveira previa o envio até dezembro de 2023.

A proposta foi colocada pelo senador Jaques Wagner (PT-BA) aos integrantes da CCJ após conversa com Silveira e Lula. Wagner afirmou que o futuro governo estava disposto a reduzir o valor do impacto fiscal da PEC, mas brigaria pelos dois anos de duração.

"Eu fui conversar com o presidente eleito e dizer para ele quais eram as proposições que estavam aqui. O envio do novo arcabouço fiscal já foi concordado, e nós reduzimos (o prazo para apresentação)", afirmou Wagner aos senadores.

"Concordamos com a redução de R$ 30 bilhões. Evidentemente que a equipe nova preferia que a redução não fosse de R$ 30 bilhões, fosse de R$ 20 bilhões. Eu estou aqui já assumindo a responsabilidade na tentativa de chegarmos a um acordo de aceitar R$ 30 bilhões", completou.

Economistas da transição já haviam declarado que um adicional entre R$ 135 bilhões e R$ 150 bilhões seria suficiente para honrar promessas de campanha do petista. A ideia é que esse valor seja usado para manter o benefício social no valor de R$ 600 e pagar mais R$ 150 por criança até seis anos.

No entanto, o texto não coloca um carimbo no valor de R$ 145 bilhões. Se Lula gastar menos com o programa social, poderá usar a sobra desse montante em outras áreas. O modelo é de interesse do PT, que já vê dificuldade em implementar o adicional por criança nos primeiros meses de governo.

Em acordo com líderes do Congresso e o PT, o relator deixou uma brecha para que a PEC também possa abrir espaço no Orçamento de 2022. Com isso, há margem para que o governo de Jair Bolsonaro (PL) libere emendas parlamentares que estão bloqueadas por causa do aperto fiscal.

A articulação para usar a PEC de Lula para destravar as emendas de aliados de Bolsonaro foi revelada pela Folha de S.Paulo em novembro.

Outro dispositivo permite investimentos adicionais quando houver receitas extraordinárias, até o limite de R$ 23 bilhões — por isso, na prática, o extrateto chega a R$ 168 bilhões. O relator retirou a trava de que essa medida valeria apenas a partir de 2023.

Com isso, segundo técnicos e líderes partidários, há espaço para que o dispositivo comece a valer já neste mês e libere recursos no Orçamento para as emendas de relator — controladas pela cúpula do Congresso e usadas como moeda de troca em negociações políticas.

Antes da sessão da CCJ, Silveira negou que tenha participado de negociações para destravar emendas de relator. Segundo ele, a antecipação foi incluída para que o governo atual consiga fechar as contas —como mostrou a Folha de S.Paulo, o Ministério da Economia teme o risco real de que falte dinheiro inclusive para o pagamento de aposentadorias.

"Eu não tive nenhuma participação nessas negociações sobre o que chamam de orçamento secreto, e eu chamo de emendas de relator. O que tem no relatório, na verdade, é para se discutir na CCJ valores para fechar o exercício deste ano porque há um déficit. Esse governo não tem números para fechar o país do ponto de vista fiscal e isso é muito sério."

Ao excluir o Bolsa Família do teto, os R$ 105 bilhões hoje reservados ao programa no Orçamento de 2023 (dentro do teto) podem ser redistribuídos para outras áreas. O montante era suficiente, no entanto, apenas para o pagamento mensal de R$ 405 por família —sendo que o valor atual está em R$ 600.

A PEC da Transição também inclui o vale-gás na lista de programas que ficam dispensados de compensação fiscal no ano que vem. O benefício no valor de R$ 110 para a compra do gás de cozinha acaba neste mês.

Segundo o economista Marcos Mendes, um dos pais da regra do teto de gastos, a proposta do relator tem vários pontos positivos. No entanto, Mendes, que também é colunista da Folha, considera elevado o valor.

"Ao deixar o Bolsa Família dentro do teto, a expansão fiscal ainda é muito grande", afirma. Na avaliação do economista, o valor ideal precisa ficar abaixo de R$ 90 bilhões.

Também merece atenção o dispositivo que permite tirar do teto "despesas custeadas por recursos oriundos de transferências dos demais entes da federação para a União", destinados à execução direta de obras e serviços de engenharia.

"Isso tem cheiro de jabuti", diz ele. Jabuti é o nome dado a emendas alheias à proposta original de um projeto, que atende a interesses de terceiros e podem ter consequências financeiras controversas.

Os gastos extras aprofundam o resultado negativo nas contas públicas previsto para 2023, caso não haja elevação nas receitas ou corte de despesas de forma suficiente. O Orçamento projeta oficialmente um rombo de R$ 63,5 bilhões, mas o atual governo atualizou essa estimativa para um número menor, embora ainda negativo em R$ 40,4 bilhões.

A existência de déficits públicos indica que o governo está financiando despesas por meio de emissão de um volume maior da dívida brasileira. O custo fica próximo da taxa básica de juros da economia, a Selic, hoje em 13,75% ao ano.

PONTO A PONTO DO RELATÓRIO

  • Não tira o Bolsa Família do teto de gastos 
  • Tem brecha para liberar emendas de relator em 2022 
  • Permite usar R$ 23,9 bilhões para investimentos fora do teto 
  • Os R$ 145 bi de aumento são um valor nominal fixo para 2023 e 2024, não se incorporando na base de cálculo e não sendo reajustado pelo IPCA a cada ano 
  • O Congresso terá liberdade para alocar como quiser o espaço aberto no teto 
  • Altera o indexador do montante total de precatórios a serem pagos. Atualmente, esse valor é corrigido pela correção do teto. Para evitar que o aumento do teto seja parcialmente consumido pelo pagamento de mais precatórios, alterou-se o indexador do limite de precatórios para o IPCA. Vai continuar a bola de neve de precatórios não pagos 
  • A DRU (Desvinculação de Receitas da União, que permite ao governo usar livremente 20% dos tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas) foi prorrogada até o final de 2024. Nesse caso, há pouco efeito prático, pois muitas receitas vinculadas, como as da educação, estão fora do mecanismo, além de não mais haver superávit no Orçamento da seguridade social que era usado para cobrir o déficit no orçamento fiscal 
  • Prevê que o Executivo irá enviar uma nova proposta de regra fiscal até 31 de agosto de 2023. Quando aprovada essa nova regra (por projeto de lei complementar), será revogado da Constituição o teto atual. A aprovação de um projeto de lei complementar é mais fácil (precisa de menos votos) que uma PEC (proposta de emenda à Constituição)

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