As principais companhias aéreas brasileiras tiveram uma semana de boas notícias, como aumento de receitas, renegociação de dívidas e alta no valor das ações. No entanto, os passivos seguem elevados, o que ainda preocupa analistas. Para os passageiros, não há previsão de queda no valor das passagens.
Os balanços do quarto trimestre de 2022 foram divulgados nos últimos dias. A Azul, por exemplo, faturou R$ 4,4 bilhões no período, o que gerou um lucro Ebtida (antes de amortização, impostos e outros fatores) de R$ 1,097 bilhão. No entanto, ao incluir os pagamentos de taxas e dívidas, a empresa teve um prejuízo líquido ajustado de R$ 610 milhões, 40% maior do que no quarto trimestre de 2021.
Na Gol, a receita foi de R$ 4,72 bilhões, a maior da história da empresa, lucro Ebtida de R$ 1,17 bi e lucro líquido de R$ 230 milhões. No último trimestre de 2021, o prejuízo líquido havia sido de R$ 2,8 bilhões.
Na Latam, a receita foi de US$ 2,74 bilhões, lucro Ebtida de US$ 139 milhões e lucro líquido de US$ 2,5 bilhões. No mesmo período de 2021, a empresa tinha tido cerca de US$ 2,7 bi de prejuízo.
O valor do lucro líquido da Latam foi distorcido porque a empresa saiu de um processo de recuperação judicial em novembro, por conta de reclassificações de dívidas que ocorreram no período.
As três empresas possuem dívidas bilionárias, que vão sendo roladas. É comum que as empresas aéreas façam grandes empréstimos para comprar ou arrendar aviões, equipamentos muito caros, pagos ao longo dos anos. Durante a pandemia, no entanto, a suspensão de voos fez as empresas perderem muito caixa. Sem dinheiro, ficou mais difícil honrar os compromissos, que precisaram ser renegociados.
Dentre as três companhias, a que fez a maior reestruturação foi a Latam, que passou por recuperação judicial nos EUA, iniciada em maio de 2020. Ao fim do processo, a dívida da empresa foi reduzida em 38%, de US$ 10,4 bilhões para US$ 6,5 bilhões.
Nesta semana, a Azul anunciou uma renegociação com arrendadores de aviões, categoria que detém 80% de sua dívida bruta. Pelo acerto, parte dos valores devidos será trocado por ações da empresa, e parte foi refinanciada com taxas mais baixas.
Na Gol, além do lucro líquido, também foi bem-visto pelo mercado o anúncio de um aporte de US$ 451 milhões feito pela Abra, holding criada a partir da união da empresa brasileira com a colombiana Avianca. As duas empresas fazem agora parte de um mesmo grupo, mas manterão marcas e operações separadas.
Os números animaram investidores. As ações da Azul quase dobraram de preço em uma semana: eram cotadas a US$ 4,19 na sexta (3), e fecharam a US$ 7,27 na sexta (10). Com a Gol, a alta foi menor, mas ainda expressiva: foram de R$ 5,13 na sexta (3) para R$ 7,13 sete dias depois. Já as da Latam ficaram praticamente estáveis, indo de US$ 0,40 para US$ 0,43 em uma semana.
Porém, analistas apontam que as empresas seguem em situação delicada. "As ações da Azul tiveram forte alta na semana, mas estão em valor muito baixo na comparação com a série histórica", avalia José Eduardo Daronco, analista da Suno Research. No fim de março de 2022, as ações da Azul estavam no patamar de US$ 15.
"As empresas conseguiram jogar as dívidas da pandemia para a frente, mas o 'para frente' chegou, em um cenário de custos mais altos. E a demanda corporativa ainda não se recuperou por completo", avalia.
André Castellini, analista de aviação civil da Bain&Company, aponta que os títulos de dívida da Azul estavam sendo negociados a 30% ou 40% do valor de face, em um sinal da falta de confiança do mercado. "As renegociações e investimentos dão um oxigênio, trazem liquidez para as companhias e tiram o risco de uma concordata em curto prazo", avalia.
No entanto, o meio para rolar as dívidas e estender o prazo incluiu pagar taxas maiores. "As empresas aéreas saem desse processo com dívida cara e um produto, as passagens aéreas, mais caro. Mas as empresas estão operando próximas do break-even [ponto de equilíbrio] de caixa, e com um produto mais caro, o que normalmente faz o mercado encolher", diz Castellini.
O analista avalia ainda que uma eventual queda no preço das passagens só deve ocorrer caso o real ganhe força frente ao dólar. Como cerca de 70% dos gastos das companhias aéreas são cotados na moeda americana, o câmbio impacta muito nas passagens.
Os bilhetes aéreos no Brasil somam alta de 43,57% nos últimos 12 meses, segundo dados do IPCA. A inflação geral no período foi de 5,6%.
As empresas atribuem a alta ao aumento do preço do querosene, o principal custo de operação. O combustível teve forte alta em 2022, mas o preço atual está 18,2% mais baixo do que há um ano, na média global, segundo dados da Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo).
"Acho que todas as companhias aéreas querem recuperar a lucratividade que perderam nos últimos anos. O consumidor está disposto a pagar os preços que estão aí. Não vemos queda na demanda e, de fato, pensamos que a demanda está mais forte do que nunca", disse Abhi Shah, presidente da Azul, em conferência com investidores.
"A gente espera que na medida que o combustível continue uma tendência de queda, as passagens também acompanhem, mas não há previsão [de queda nas passagens], diz Jerome Cadier, presidente da Latam, em entrevista a jornalistas.
Para 2023, as expectativas são de novas altas na demanda e nos números. A Azul espera obter uma receita recorde de R$ 20 bilhões no ano. No fim de março, a empresa passará a ter mais voos do aeroporto de Congonhas, um dos principais do Brasil para viagens corporativas.
A Gol espera ter margem Ebtida de 24% neste ano, e reduziu sua projeção de investimento em 2023, de R$ 700 milhões para R$ 600 milhões. "Esperamos que a recuperação do mercado corporativo no quarto trimestre continue a se intensificar em 2023. Apesar do maior custo de vida, os brasileiros desejam viajar", disse a Gol, em comunicado de anúncio dos resultados.
A Latam espera alta de 20% no volume de passageiros e cargas e atingir um Ebtida em torno de US$ 2 bilhões. "O grupo continua direcionando esforços para reduzir ainda mais os custos e aumentar a capacidade, mantendo um forte foco na lucratividade e na geração de caixa", disse a empresa, em comunicado.
Dados deste começo de 2023, também divulgados nos últimos dias, mostram que a demanda segue aquecida. A Azul teve alta de 25,9% no volume de passageiros em fevereiro, na comparação com o mesmo mês de 2022. Na Gol, a alta foi de 22% na mesma comparação. E na Latam, em janeiro deste ano, a alta foi de 24,9%.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta