Uma brecha na lei aprovada pelo Congresso para congelar salários de servidores públicos até o fim de 2021 permite que progressões de carreira continuem sendo concedidas normalmente.
Somente no funcionalismo do Executivo federal, esses benefícios geram um custo adicional de R$ 500 milhões ao ano.
Além do bloqueio de reajustes, a equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) tentou impedir temporariamente as promoções automáticas.
Mas a proposta foi derrubada no Senado por pressão de parlamentares da oposição, do centro e de aliados do presidente Jair Bolsonaro.
A Câmara também chegou a discutir o assunto, mas, por resistência política, os servidores foram poupados nesse ponto da medida.
Técnicos do time de Guedes queriam que o funcionalismo também desse uma parcela de contribuição na crise provocada pelo coronavírus, que gerou perdas salariais e fechou vagas na iniciativa privada.
Após debate com o Congresso, ficaram proibidos os reajustes de remuneração, mas não as progressões automáticas.
Isso significa que, mesmo durante a pandemia, o governo seguirá liberando que servidores avancem degraus na carreira, assim como a promoção em massa na Advocacia-Geral da União (AGU).
O órgão chegou a colocar 92% da categoria de procuradores federais no topo da carreira, com salários de R$ 27.303. Foram promovidos 606 procuradores de uma só vez.
Após repercussão negativa, a AGU anunciou que decidiu suspender a medida , embora argumente que tudo foi feito conforme orientação da lei.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) também pediu que o órgão de controle barrasse as promoções concedidas na AGU.
Na representação, o subprocurador-geral, Lucas Rocha Furtado, argumenta que, ao contrário do entendimento da equipe econômica, a lei sancionada em maio também impede esses tipos de ascensão nas carreiras, pois o texto veda a concessão de qualquer tipo de vantagem ou aumento até o fim do próximo ano.
"Progressão funcional implica adequação da remuneração", afirmou Furtado.
Em maio, entrou em vigor um pacote de socorro financeiro a estados e municípios durante a pandemia. Guedes queria, como contrapartida, medidas de controle das despesas com funcionalismo.
Alinhado com a equipe econômica, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), apresentou uma versão que ainda restringia as progressões e promoções até o fim de 2021. Militares também seriam atingidos.
A proposta desagradou a partidos. Alcolumbre, então, preservou os avanços nas carreiras e manteve apenas a proibição de reajustes salariais.
O custo anual de R$ 500 milhões diz respeito às progressões automáticas por tempo de serviço e promoções por mérito, como no caso de cursos de capacitação. O governo não detalhou esse gasto por tipo de benefício.
O número mostra apenas uma fatia do custo total, já que as progressões também são comuns no Judiciário e no Legislativo, bem como nos estados e nos municípios.
O secretário especial adjunto de Gestão do Ministério da Economia, Gleisson Rubin, afirmou à reportagem que, considerando a regra vigente, o governo não pode simplesmente parar de fazer esses pagamentos adicionais. "A legislação hoje permite, essa é a constatação", disse.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa, apresentada ao Congresso neste mês, proíbe progressões automáticas, como as gratificações por tempo de serviço.
Segundo Rubin, o objetivo da reforma é promover mudanças mais profundas na estrutura do serviço público, já que medidas como a proibição de reajustes são ações paliativas.
"A vantagem do congelamento de salários é que os efeitos vêm no curto prazo, é uma resposta rápida. A desvantagem é que isso não mexe em questões estruturais. A PEC foi encaminhada para tentar dar resposta a questões estruturais", disse.
O texto também veda a liberação de licença-prêmio, férias superiores a 30 dias e reajustes salariais retroativos.
O efeito da medida, no entanto, não será sentido a curto prazo. Os atuais servidores continuarão com direito a receber penduricalhos e promoções automáticas mesmo se a proposta for aprovada.
As novas regras só terão efeito para pessoas que passarem em concurso ou forem contratadas após a promulgação da PEC, que ainda tem longo percurso no Congresso.
A decisão de poupar os atuais servidores foi tomada para reduzir as pressões sobre o Congresso e facilitar a aprovação. Como resultado, o governo pode levar décadas para efetivamente conseguir extinguir benefícios considerados distorcivos.
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