A retração de 1,5% da economia brasileira no primeiro trimestre de 2020 foi apenas um sinal inicial do impacto da crise do coronavírus, que chegou a ser descrito pelo ministro Paulo Guedes (Economia) como um "meteoro" que tirou o país da trajetória de recuperação.
Desde o final do ano passado, a projeção era de perda de fôlego para o crescimento no começo de 2020. Apesar de a retração trazer um cenário pior que o previsto lá atrás, o resultado do primeiro trimestre não traduz adequadamente os efeitos econômicos da crise. O baque da pandemia, afirmam os economistas, será retratado em sua totalidade apenas nas próximas divulgações do PIB (Produto Interno Bruto).
Para o segundo trimestre deste ano, as projeções apontam uma retração em torno de 10% em relação aos três primeiros meses do ano. A expectativa é que abril possa ter sido o fundo do poço e que a economia comece a se recuperar, muito lentamente, a partir desse ponto, com já mostram alguns dados econômicos preliminares.
Não se espera uma normalização total das atividades para este ano, mas uma reabertura gradual pode dar fôlego à recuperação, desde que não haja uma segunda onda de contaminações pelo vírus. Com isso, o PIB voltaria a crescer em 2021, mas só chegaria à situação do final de 2019, que já não era tão boa, em 2022, último ano do atual mandato presidencial.
O Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) revisou a projeção de queda do PIB neste ano de 5,4% para 6,4%. Para o segundo trimestre, é esperada queda de 9,4% em relação ao trimestre anterior.
O Itaú Unibanco manteve a projeção de queda de 4,5% para 2020 e espera contração de 10,6% no trimestre. Patamares semelhantes aos projetados pelo Banco Inter, que vê recuos de 4,5% no ano e de 11% no segundo trimestre. Mais pessmista, o banco UBS fala em 16% no segundo trimestre e 7,5% no ano.
Luana Miranda, pesquisadora da área de Economia Aplicada do Ibre, afirma que o dado do consumo das famílias veio pior que o projetado pela instituição. Ela diz que a economia não estava tão pujante nos meses de janeiro e fevereiro, mas que não haveria uma queda do PIB no primeiro trimestre se não fosse a pandemia.
"Apesar de a economia não estar bombando em janeiro e fevereiro, não haveria queda no PIB se não fosse a quarentena. Podeira não ser um crescimento espetacular, mas uma queda não estava nas nossas contas antes da crise", afirma. Luana afirma que não será possível recuperar em 2021 tudo o que será perdido neste ano, embora se espere crescimento por conta da base de comparação favorável. "Essa recuperação, essa volta para o período pré-coronavírus, só em 2022. O país já tinha problemas estruturais que está há décadas tentando resolver, já vinha com desemprego alto, muitos desalentados, dívida alta em comparação com outros emergentes, Essa crise intensifica os nossos problemas econômicos. A bola de neve é maior para 2021", afirma Luana.
"Mesmo que haja uma reabertura da economia, essa recuperação vai ser gradual. As pessoas não vão voltar da noite para o dia só porque o governo liberou. E um encerramento do isolamento antes do tempo pode trazer uma nova onda de contaminação."
A economista do Itaú Unibanco Julia Gottlieb afirma que os dados de maio já mostram pequenos sinais de recuperação da atividade e que, a partir do terceiro trimestre, se espera uma retomada conforme as medidas de isolamento social forem diminuindo.
"Obviamente, isso requer que a gente passe pelo pior da curva de casos da doença, mas já começa a ter sinais de relaxamento das medidas de isolamento. Existem incertezas sobre a velocidade da retomada e da capacidade de recuperação no pós-pandemia, mas a gente vê uma volta ao longo do segundo semestre", afirma Gottlieb.
Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco, afirma que entre os riscos para a projeção feita pelo banco está uma propagação do vírus que não permita a reabertura da economia como tem sido anunciada por algumas autoridades. Ele disse não trabalhar com uma normalização total de todos os setores neste ano. "A gente considera que você vai reabrindo gradualmente, com algumas restrições. No final do ano, vai estar mais próximo do normal, mas não 100% normal como estava antes dessa história toda começar. Alguns setores vão reabrir parcialmente. É razoável ter um cenário em que teatros e cinemas voltam com ocupação de um terço ou metade da capacidade", afirma.
Rafaela Vitoria, do Banco Inter, frisa que, mesmo em cidades que já reabriram o comércio, as vendas dos shoppings têm se situado em torno da metade do que ocorria antes da pandemia. A retomada, diz ela, vai depender também do sentimento de segurança da população em relação aos riscos de contaminação.
Na sua opinião, a contração no consumo nos primeiros meses de pandemia está mais ligada a questões sanitárias, como o medo de contaminação ou as restrições ao comércio, do que ao desemprego ou à perda de renda, já que os programas de auxílio federal estão injetando dinheiro na economia.
Ela cita como exemplo o aumento da taxa de poupança interna, que passou de 12,2% para 14,1% no primeiro trimestre, em um sinal de que a população decidiu segurar dinheiro diante das incertezas. " É uma crise bem diferente de outras. Não é um estrangulamento econômico, de crédito."
Mas, a depender da duração das medidas de isolamento, pondera a economista, o aprofundamento das taxas de fechamento de empresas e de desemprego pode prejudicar ainda mais a retomada.
"Alguma recuperação vai ter no segundo semestre, mas há grande dúvida sobre a velocidade", diz ela. "Vai depender muito da evolução da pandemia, das taxas de contaminação, de ocupação de hospitais... A partir do momento em que pessoas se sentirem mais seguras, vão voltar."
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