Um erro do governo federal na edição do decreto que isentou o botijão de gás de cozinha dos impostos federais vem impedindo o repasse do benefício ao consumidor. A medida foi publicada na última terça (2), mas o setor diz que até agora a Petrobras só emite notas com a incidência dos tributos.
Na última semana, ao invés de perceber queda no preço do botijão de 13 kg, o brasileiro pagou mais caro por ele. Segundo a ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o preço médio do produto subiu 0,7% em relação à semana anterior, para R$ 81,43.
O problema, segundo empresas do setor, é resultado da falta de regulamentação do decreto que estabeleceu a isenção, que não definiu como separar os volumes de gás de cozinha destinados a botijões de 13 kg daqueles volumes vendidos em vasilhames maiores ou a granel.
O desconto prometido pelo governo reduziria o preço em R$ 2,18 por botijão. Foi anunciado ao mesmo tempo da isenção de PIS/Cofins sobre o óleo diesel, como parte de um esforço do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para enfrentar a insatisfação dos consumidores com a escalada dos preços dos combustíveis.
O presidente da Abragás (entidade que reúne os revendedores de gás de cozinha), José Luiz Rocha, explica que o decreto limitou o benefício ao gás vendido para consumo residencial em botijões de 13 quilos ou menores, mas a Petrobras, que é responsável por recolher os impostos, não tem como identificar o destino do produto.
Esse papel é das distribuidoras e dos revendedores. As primeiras definem, de acordo com a demanda de seus clientes, quanto gás vão envasar em botijões menores e quanto destinarão a outros tipos de vasilhames.
Os últimos é que têm o contato com o consumidor final e poderiam saber se o uso é residencial. "O gás é um só. Como dividir o que vai para 13 kg e o que vai para granel?", questiona Rocha. "A Petrobras depende dessa informação para emitir notas fiscais diferentes."
Petrobras, Receita Federal e distribuidoras vêm trabalhando para resolver o impasse, mas as alternativas propostas até o momento criam um ambiente de insegurança jurídica para as empresas do setor.
O setor negocia um mecanismos de auto-declaração, no qual as distribuidoras informariam à estatal quanto gás pretendem envasar em botijões de 13 quilos a cada compra do produto. A expectativa é que os primeiros descontos comecem a chegar ao mercado ainda esta semana.
As distribuidoras alegam, porém, que a solução gera riscos e temem penalidades caso as previsões de destinação do gás não se confirmem. E reclamam que o modelo pode levar a fraudes, com a venda em vasilhames maiores de gás com isenção de impostos.
Até março de 2020, a Petrobras praticava preços diferentes de acordo com o destino do produto: o envasado em vasilhames de 13 quilos era mais barato do que os outros usos. Mas quem definia os volumes era a ANP, com base no histórico de vendas de cada distribuidora.
As empresas do setor defendem que o modelo volte a ser utilizado, mas a proposta enfrenta resistência da Receita Federal.
No mercado, a avaliação é que a isenção foi anunciada sem planejamento e tem efeitos adversos, como subsidiar consumidores de alta renda. Segundo a Abragás, consumidores de baixa renda representam cerca de 25% das vendas de botijões no país.
"De novo, o governo deu subsídio para quem não precisava", diz Rocha. "Se o governo precisa ajudar a baixa renda, tinha que ter criado programa de governo para atender essa população." Segundo ele, estimativas de especialistas apontam para renúncia fiscal de R$ 1,2 bilhão por ano com a medida.
Em 2021, o preço médio do botijão de gás no país já subiu 8,4%, acompanhando a alta das cotações internacionais do petróleo e a desvalorização do real, movimento que vem impactando fortemente também gasolina e diesel.
A escalada dos preços dos combustíveis neste início de 2021 se tornou um dos principais focos de preocupação do governo e levou ao anúncio de troca no comando da Petrobras, medida que derrubou as ações da empresa e provocou uma debandada inédita em seu conselho de administração.
A Petrobras disse em nota que "para que seja possível segregar os volumes de faturamento incentivado dos volumes de faturamento não incentivado os distribuidores devem apresentar ao produtor de GLP [gás liquefeito de petróleo, o gás de cozinha] declaração de destinação de produto".
Segundo a empresa, distribuidoras que apresentaram declarações já conseguiram adquirir o produto com desoneração.
O Ministério de Minas e Energia disse que não comentaria o assunto. O Ministério da Economia e a Receita Federal não haviam respondido aos pedidos de entrevista até a conclusão desta reportagem.
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