Publicado em 24 de abril de 2025 às 10:37
SÃO PAULO - Aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) podem pedir, pelo aplicativo ou site Meu INSS, a exclusão de descontos de mensalidades de associações ou sindicatos. A opção visa proteger os beneficiários do instituto de débitos ilegais em seus benefícios.
Denúncias sobre déscontos feitos sem o aval dos segurados motivaram a Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal e a CGU (Controladoria-Geral da União) na manhã desta quarta-feira (23).
A ação resultou na saída do cargo do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto. A investigação aponta descontos de R$ 6,3 bilhões nos benefícios entre 2019 e 2024 — em valores legais e ilegais. Ao todo, somente no primeiro trimestre de 2024, 5,4 milhões de aposentados pediram exclusão desses débitos.
Segundo a investigação, o esquema teria começado em 2016, ainda na gestão de Michel Temer (MDB), mas ganhou força a partir de 2019, no primeiro mandato do então presidente Jair Bolsonaro (PL), e atingiu a casa dos bilhões a partir de 2022, com instrução normativa que facilitou os descontos associativos.
As associações são entidades às quais aposentados e pensionistas podem se filiar para ter benefícios como plano de saúde, academia, dentista, colônia de férias e consultoria jurídica para entrar com ações judiciais, entre outros. É descontada uma mensalidade diretamente do benefício previdenciário.
Em 2024, uma instrução normativa conjunta do INSS e do Ministério da Previdência Social, publicada por determinação do próprio Stefanutto, determinaram regras mais duras para tentar conter o avanço dos descontos ilegais.
Entre as normas estavam a obrigatoriedade de biometria do aposentado que autorizava o desconto e assinatura eletrônica confirmando que estava ciente de que se filiou à associação ou sindicato.
A biometria, no entanto, foi implantada apenas em fevereiro deste ano pela Dataprev (empresa de tecnologia do governo federal), quase um ano depois da normativa. Houve também a criação de um limite para o desconto, de até 1% do teto do INSS.
Ainda em 2024, a Polícia Civil de São Paulo e o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) passaram a investigar associações que movimentavam milhões por mês no Estado em valores descontados de aposentadorias e pensões.
A investigação começou após uma aposentada do litoral paulista entrar na Justiça contra o órgão. Foi descoberto que ao menos cinco associações teriam funcionários laranjas e cometeriam fraudes nos benefícios.
Com esses dados e ao perceber o avanço das reclamações contra descontos ilegais, o presidente do INSS ordenou investigação no próprio órgão, que apontou descontos ilegais na casa dos R$ 45 milhões.
A operação da manhã desta quarta envolveu cerca de 700 policiais federais e 80 servidores da CGU, que cumpriram 211 mandados de busca e apreensão, sequestro de bens e pedidos de prisão temporária em 13 Estados e no Distrito Federal.
A defesa de Stefanutto não irá se posicionar porque está em busca de acesso ao processo.
Associações se filiam ao INSS após um processo de análise da legalidade da associação. Há ao menos 30 entidades inscritas no órgão, que têm permissão para descontar mensalidades das aposentadorias e pensões de quem aceita se filiar. Desse total, 11 estão sendo investigadas pela PF.
Segundo o advogado Rômulo Saraiva, especialista em Previdência, há dois processos criminosos para conseguir o desconto. Os fraudadores primeiro conseguem acesso aos dados de aposentadorias e pensões dos segurados, que seriam sigilosos.
Depois, fraudam a assinatura eletrônica do segurado e toda a documentação de filiação à entidade. Depois, enviam esses dados à Dataprev (empresa de tecnologia do governo federal), que faz o desconto mensalmente.
O segurado precisa ter uma conta no portal Gov.br e acessar o extrato de benefício no aplicativo ou site Meu INSS.
No documento, constam todos os descontos feitos na aposentadoria, caso sejam de mensalidade associativa ou de crédito consignado.
É possível ainda bloquear o benefício para desconto de mensalidade associativa. Esse serviço também está disponível no Meu INSS. Siga os passos abaixo:
Os beneficiários podem pedir a devolução de descontos indevidos pelo telefone 0800 que aparece ao lado do nome da associação ou do sindicato no holerite. O valor, no entanto, deverá ser devolvido pela associação ou sindicato. O INSS não fica com esse dinheiro.
Também é possível enviar um email para acordo.mensalidade@inss.gov.br, informando o ocorrido. É também necessário apresentar um documento de identificação (RG, CIN, CNH ou CTPS), CPF e o número do benefício. Não há prazo específico para a devolução.
Reclamações e denúncias sobre débitos não autorizados de associações ou entidades podem ser registradas diretamente no Portal Consumidor.Gov e na Ouvidoria do INSS, pela Plataforma Fala BR.
As reclamações, segundo o advogado Rômulo Saraiva, são importantes para que o próprio órgão mapeie as falhas e quais são as entidades mais reclamadas e que podem estar cometendo ilegalidades.
Associações e sindicatos são órgãos autorizados a fazer descontos nos benefícios previdenciários, desde que tenham convênio com a Previdência, e que estejam com a documentação correta para o funcionamento.
Para que o desconto possa ser feito, a associação deve ter autorização prévia do beneficiário.
O desconto também deve ser formalizado por um termo de adesão assinado por assinatura eletrônica avançada e biometria, apresentação de documento de identificação oficial e número do CPF.
As advogadas Gisele Kravchychyn e Marcella Hunas, do escritório Kravchychyn Advocacia, afirmam que caso o valor não seja pago pela associação ou sindicato, é possível entrar com ação judicial para:
Rômulo Saraiva afirma que a ação pode ser aberta no Juizado Especial Cível do estado, se for contra a associação, ou no Juizado Especial Federal, se for contra a associação e o INSS. Segundo ele, aposentados têm conseguido indenizações que vão de R$ 3.000 a R$ 5.000 pelos transtornos.
Em caso de dúvidas ou dificuldades, Gisele e Marcela recomendam a orientação de um advogado, que poderá analisar o caso. Para entrar na Justiça, no entanto, não há necessidade de um defensor, mas, se o INSS recorrer, será preciso ter um.
"A aposentadoria é um direito que deve ser respeitado. Nenhum desconto pode ocorrer sem autorização clara e formal. Estar atento aos extratos e buscar orientação ao menor sinal de irregularidade é essencial para proteger sua renda e garantir o respeito à sua história de trabalho", diz Gisele.
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