O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), para afagar o ministro Paulo Guedes (Economia), congelou o programa Pró-Brasil. O plano prevê gastar R$ 215 bilhões em obras públicas.
Entusiastas de mais gastos para estimular a retomada da economia, integrantes da ala militar dizem que Bolsonaro, no entanto, defende o programa e a revisão do teto de gastos.
O teto, medida aprovada na gestão Michel Temer (MDB), limita os gastos públicos à inflação do ano anterior. A equipe econômica atual é contra o descumprimento da regra.
Para evitar mais desgaste após a saída de Sergio Moro (Justiça), o presidente preferiu empoderar Guedes. Bolsonaro disse nesta segunda-feira (27) que o ministro tem a palavra final sobre economia.
Guedes, porém, tomou conhecimento do plano dos militares um dia antes do anúncio feito pelo general Walter Braga Netto (Casa Civil).
O ministro chamou o programa de "PAC da Dilma". Segundo ele, o plano não sairia do papel como anunciado, não sem estourar o teto.
O ministro não quer abrir mão dessa "poderosa âncora fiscal", nas palavras de assessores, no momento em que a União já despejou mais de R$ 800 bilhões na economia.
Os recursos tentam conter a crise do coronavírus. Metade desse volume prejudica as metas fiscais.
Assessores de Guedes dizem que ele aceita discutir uma flexibilização do teto no futuro. Por isso, ele prefere ficar no cargo para reduzir ao máximo possíveis danos de uma política intervencionista.
Desde a sexta-feira (24), o mercado começou a especular em torno de uma possível saída de Guedes do governo por não ter sido consultado sobre o Pró-Brasil. O plano contraria sua política liberal.
Em reunião no Palácio da Alvorada nesta segunda, Bolsonaro tratou despistar os rumores. "O homem que decide economia no Brasil é um só, chama-se Paulo Guedes. Ele nos dá o norte, nos dá as recomendações e o que nós realmente devemos seguir", disse.
Participaram do encontro, além de Guedes, a ministra Tereza Cristina (Agricultura), o ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), o ministro Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União) e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
À imprensa, na frente do Alvorada, Guedes enviou uma série de recados aos defensores do programa.
"Naturalmente, o presidente já está olhando para o futuro e nos pediu, a todos, estudos. O chefe da Casa Civil, general Braga Netto, a função dele é coletar esses estudos porque ele é um coordenador das ações. Ele coordena as ações e integra as ações dos ministérios. Da mesma forma que ele integra essas ações, a conta vem para a Economia, o Orçamento é com a Economia", afirmou o ministro.
Guedes disse que o país sairá da crise e reafirmou "a todos que acreditam na política econômica que ela segue, é a mesma política econômica".
"Vamos prosseguir com nossas reformas estruturantes. Vamos trazer bilhões em investimento em saneamento e infraestrutura, com reforço na safra, a logística está funcionando, e o presidente está coordenando isso."
Na reunião, Bolsonaro afirmou que novas ações do governo que tenham impacto na economia só vão prosperar após o aval de Guedes.
A fala, segundo membros da área econômica, deu a entender que, após a saída de Moro, Bolsonaro não quer perder mais um nome forte de seu governo. Assim como Guedes, Moro era chamado de superministro.
Bolsonaro ressaltou que todos os ministros podem estudar programas e dar as ideias que quiserem. A decisão final, porém, é de Guedes.
Integrantes da equipe econômica relatam que os militares não são economistas e, por isso, o ministro fez uma explicação sobre como uma mudança de rumos na economia pode acabar com a confiança do mercado e arruinar os planos de retomada da atividade no país.
O ministro afirmou que o Brasil só terá solvência se mantiver confiabilidade a médio e longo prazo.
A avaliação é que mudanças na percepção do mercado provocadas por eventual afrouxamento fiscal iriam desestruturar a curva de juros do país.
Isso reduziria investimentos e teria potencial para ampliar a dívida pública.
Após o encontro, a equipe econômica entendeu o recado do presidente como um reforço ao poder de Guedes no governo.
Para técnicos da pasta, ao menos por enquanto, está descartada uma intervenção mais forte da ala militar na política econômica, com manutenção da linha liberal e reformista no pós-pandemia.
Nos bastidores, entretanto, até mesmo assessores de Guedes afirmam que haverá um "caminho do meio". Seria uma alternativa que combinará obras públicas com medidas estruturantes.
O que ainda não se sabe é qual será a envergadura do programa Pró-Brasil.
Guedes prefere, por exemplo, dar mais atenção a projetos de Tarcísio. Ele elencou uma lista que poderá ter algo entre 70 e 130 obras orçadas em torno de R$ 30 bilhões ao longo de três anos.
Dentre essas obras, que ainda não foram divulgadas, há rodovias, ramais ferroviários e outros projetos que darão mais vazão à safra agrícola.
Guedes considera que, no pós-crise, o agronegócio será o grande responsável por não deixar o PIB do país cair tanto quanto preveem os principais bancos de investimento.
Para o escoamento da safra com mais rapidez, seria preciso priorizar as obras. Nesse caso, são necessários recursos públicos.
Tarcísio afirmou em conversas com Guedes que seu plano não deverá estourar o teto de gastos. Consumirá somente cerca de R$ 6 bilhões a mais em três anos.
Muitas das despesas da Infraestrutura também poderiam ser remanejadas (postergadas) para priorizar o programa no momento.
Diferentemente de Tarcísio, o ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) apresentou uma proposta de R$ 185 bilhões em gastos. Desse total, R$ 157 bilhões serão para 9.400 obras novas.
O plano deve estourar o teto.
Dentre as obras, está a ampliação do Minha Casa Minha Vida, que terá uma nova configuração e mudará de nome. Possivelmente, se chamará Casa Verde e Amarela.
Em conversas com assessores, Guedes disse que prefere autorizar subsídios para a capacitação de profissionais a liberar dinheiro para programa habitacional.
O ministro da Economia quer centrar esforços em destinar recursos para onde possa haver "multiplicação de resultados", como nas obras que, a pedido de Cristina, entraram no programa da Infraestrutura.
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