O ministro Paulo Guedes (Economia) demonstrou nesta terça-feira (10) um tom otimista ao falar sobre a situação do país e o cenário pós-Covid. Ele disse que a perda de empregos não foi tão forte como em anos anteriores, afirmou que o governo vai fazer quatro privatizações em 2021 e celebrou a queda dos juros ao fazer um balanço sobre sua gestão.
O tom agradou investidores que participaram de uma teleconferência do ministro com a agência Bloomberg, mas também foi alvo de críticas. Dados e o próprio histórico do governo na agenda econômica enfraquecem o discurso do ministro.
Sobre a situação do desemprego, por exemplo, Guedes afirmou que o país está em situação melhor do que o observado no fim do governo de Dilma Rousseff e início do de Michel Temer. "Perdemos menos empregos neste ano do que na recessão de 2015. E perdemos menos neste ano, com toda essa pandemia, do que em 2016", disse.
Pelos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que mede apenas o emprego formal, o ministro acerta. Em 2015, foram 729 mil empregos perdidos até setembro. Em 2016, houve uma perda de 683 mil postos no mesmo período. Neste ano, o número está negativo em 558 mil.
Mas os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que são mais amplos por englobarem também o mercado informal, mostram que a situação está pior em 2020.
A taxa de desocupação no Brasil foi de 13,8%, no trimestre encerrado em julho de 2020 (mais recente, pela Pnad Contínua). Em 2016, foi de 11,3% em julho e 12% outubro. Em 2015, foi de 8,3% e 9%, respectivamente.
Como o IBGE interpreta como desocupadas somente as pessoas sem trabalho que estão procurando emprego, a taxa pode ter indicado nos últimos meses uma situação do mercado melhor que a real. Isso porque, com a pandemia e atividades fechadas, muitas pessoas pararam de procurar emprego.
Técnicos do IBGE e do Ministério da Economia veem um aumento na taxa agora e em 2021, com a volta das atividades e a maior procura por trabalho. A visão foi corroborada recentemente por Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica do Ministério da Economia.
Mesmo assim, Guedes diz que outros dados indicam uma recuperação em V na economia brasileira, como o movimento medido por notas fiscais eletrônicas.
Em meio ao otimismo, Guedes afirmou que o governo vai retomar a agenda de reformas e que quatro grandes privatizações serão feitas até dezembro de 2021. Seriam elas Correios, Eletrobras, Porto de Santos e PPSA (dos contratos do pré-sal).
As vendas, no entanto, são prometidas desde a campanha eleitoral. No começo de julho, Guedes disse: "Nós vamos fazer quatro grandes privatizações nos próximos 30, 60, 90 dias". Um mês depois, ele repetiu o prazo: "nos próximos 30 a 60 dias".
Agora, o prazo ficou para daqui um ano e, segundo ele, as propostas devem ser apresentadas ao Congresso em 30 a 60 dias.
Sobre esse ponto, o próprio Guedes criticou o governo pela falta de privatização de estatais e se disse frustrado com a situação. Ele evitou mencionar mais datas porque as pessoas dizem que ele não entrega o prometido. "Continuamos entregando, mas os políticos têm seu próprio tempo", disse.
Guedes se disse frustrado com a falta de vendas. "Estou bastante frustrado de estarmos aqui há dois anos e não termos conseguido vender nenhuma estatal. É bastante frustrante", afirmou também nesta terça, desta vez em um evento sobre desestatização promovido pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Ele voltou a dizer que a política tem atrapalhado as vendas. "O governo liberal-democrata que foi eleito e que falou o tempo inteiro que ia privatizar, aí tem acordo político de repente na Câmara e no Senado que não deixa privatizar. Que história é essa?", disse Guedes.
E cobrou do próprio governo a retomada da agenda. "Precisamos recompor nosso eixo político para conseguir fazer as privatizações prometidas durante a campanha", afirmou.
Sobre política externa, Guedes disse que a China estatal está em declínio. "O fenômeno chinês é de mercado. É um regime politicamente fechado que, para sobreviver, mergulhou sua população nos mercados globais e deixou crescer uma China de economia de mercado dentro da China estatal. A China estatal está em declínio, as empresas estão cada vez mais frágeis, com déficits enormes, com pouca capacidade de adaptação", afirmou.
Marcos Caramuru, ex-embaixador do Brasil na China e sócio da Kemu (consultoria em negócios com a China), afirma que não vê elementos para uma afirmação tão direta sobre as empresas estatais do país asiático.
"Não me consta isso. Claro, existe uma ineficiência nas estatais em geral no mundo inteiro. Mas daí dizer que as empresas estão em declínio, eu não iria tão longe. Não as vejo fora do jogo econômico", afirmou. "Não sei se diria isso com essa tranquilidade", disse.
Ao fazer um balanço da atual gestão, Guedes também citou itens como a reforma da Previdência e a queda dos juros. O corte da taxa básica, no entanto, foi parte de um movimento global ocorrido em meio à queda da atividade econômica durante a pandemia do coronavírus.
Em outro momento, Guedes lamentou o fato de bilhões serem gastos em rolagem da dívida, mas afirmou que poderia haver hiperinflação caso não se faça isso. "O país gastando US$ 100 bilhões por ano só para manter o financiador da dívida sossegado. Se não, há o perigo de uma combustão instantânea. O país pode ir para a hiperinflação muito rápido se não rolar a dívida satisfatoriamente", afirmou.
A fala foi criticada pela economista Elena Landau. "Nosso elefante em loja de cristal ainda sai com uma dessas", afirmou em rede social. Ela classificou as falas do ministro como "loucuras" que só foram ofuscadas por declarações ditas pelo presidente Jair Bolsonaro no mesmo dia.
Guedes admitiu que o auxílio emergencial pode voltar a ser pago à população no ano que vem, mas apenas caso o país seja atingido por uma nova onda do coronavírus.
As declarações foram dadas em resposta a uma pergunta sobre o auxílio emergencial e sua possível continuidade após o fim do ano. "Deixamos bem claro para todo mundo. Se houver uma segunda onda no Brasil, temos já os mecanismos. Digitalizamos 64 milhões de brasileiros. Sabemos quem são, onde estão e o que eles precisam para sobreviver", afirmou.
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