O ministro da Economia, Paulo Guedes, quase conseguiu a cabeça de um colega da Esplanada, Ricardo Salles, que é ministro do Meio Ambiente. Guedes voltou de Davos, na Suíça, onde participou do Fórum Econômico Mundial, extremamente inquieto com a recepção de investidores estrangeiros a seus apelos para que injetassem dinheiro no Brasil. O evento aconteceu no fim de janeiro na famosa estação de esqui suíça.
Nesta segunda-feira (24), o superministro da Economia se vê envolto em outros desafios, como acalmar o Congresso Nacional na disputa pelo controle de parte do Orçamento da União e fazer andar sua agenda econômica. Nesse contexto, além da preocupação com a articulação política para implementar as reformas econômicas, um dos motivos alegados por investidores para segurar os investimentos foram as dúvidas em relação à política ambiental do governo Jair Bolsonaro.
Salles, que chegou ao governo por indicação da bancada do agronegócio, tem uma visão sobre o ambiente alinhada com a do presidente. Mas, para ambos, muitas áreas de proteção poderiam ser exploradas economicamente, ajudando no crescimento do país. No lançamento do Conselho da Amazônia, no dia 11 deste mês, por exemplo, Bolsonaro afirmou que havia muita "terra para pouco índio".
Ainda assim, e apesar das falas do presidente, Salles foi identificado como o grande responsável pelo mau humor do empresariado estrangeiro para com o Brasil, em especial pelo que consideram política ambiental desastrosa do governo federal.
Em um ano, foram muitos os episódios que provocaram desconfiança dos investidores em relação à gestão ambiental do ministro, entre eles as queimadas e o desmatamento recorde na Amazônia. O discurso reativo de Salles também foi criticado. O ministro publicamente já defendeu proposta de cobrar dinheiro de países desenvolvidos para compensar a adoção de políticas ambientais mais sustentáveis pelo Brasil.
O feedback dos estrangeiros desagradou ao ministro da Economia. Guedes voltou ao Brasil disposto a melhorar a imagem que os empresários têm da política ambiental de Bolsonaro. O próprio Guedes tem, em sua equipe, uma área dedicada à sustentabilidade, inclusive no texto com sugestões à reforma tributária que deve ser enviado pelo governo ao Congresso em algum momento.
De acordo com relatos feitos ao jornal Folha de São Paulo, Guedes voltou do fórum determinado a promover ações que melhorem a imagem do Brasil no exterior. Ele teria até passado por cima de Salles ao dar ordens ao Ibama para enviar equipes de fiscalização à Amazônia. Guedes usou o argumento de que "tem dinheiro" para que os fiscais façam ações de supervisão contra o desmate.
Salles, ao saber da intervenção no Meio Ambiente, ficou irritado e reagiu. Ele lembrou a Guedes que a pasta não está sob os domínios da Economia. A resposta inflamou ainda mais o superministro, que foi ao Palácio do Planalto pedir a cabeça do colega.
Sentindo que estava em posição frágil, Salles recuou e pediu a intervenção da ministra Tereza Cristina (Agricultura). Mesmo consciente de que a política apregoada por Salles prejudica a economia brasileira, Tereza Cristina entrou no circuito e tentou colocar panos quentes.
O ministro do Meio Ambiente, por sua vez, submergiu e só voltou aos holofotes na última semana, quase um mês depois da ação de Guedes. Salles procurou reconstruir pontes com o ministro publicamente. No dia 12, teceu inúmeros elogios a Guedes em uma rede social, chegando ao ponto de chamá-lo de "melhor ministro da Economia do mundo".
Apesar da intervenção, Tereza Cristina demonstra nos bastidores estar descontente com Salles pela repercussão negativa que sua gestão está tendo para o agronegócio. O setor como um todo não aprova a política e a atitude adotadas pelo ministro.
As críticas se fundamentam em dois motivos: Salles fez várias promessas que não cumpriu --uma delas era rebaixar o Parque Nacional da Lagoa do Peixe, no Rio Grande do Sul, a área de proteção ambiental, que tem normas menos restritivas-- e adotou um discurso que gera uma reação negativa no exterior.
No próprio Meio Ambiente, Salles enfrenta resistência de técnicos. Integrantes de suas equipes já se recusaram a fazer projetos que podem violar normas ambientais.
Segundo uma fonte que está a par dos acontecimentos na pasta, o ministro dá ordens e ninguém as segue por estarem os servidores contrariados. Eles argumentaram à reportagem que preferem desobedecer aos comandos do chefe da pasta, que é uma indicação política, a ter de responder a inquérito no Ministério Público, já que são servidores públicos com estabilidade.
Passado o ápice do atrito, os três ministérios - Meio Ambiente, Agricultura e Economia - vão se reunir nas próximas semanas para tentar aparar as arestas e reverter os danos da política ambiental brasileira no exterior. A expectativa é que o governo Bolsonaro module o tom da política ambiental no exterior após o recado dado por investidores durante o Fórum Econômico Mundial.
Essa tendência deve ser enfraquecida também com a neutralização da área ideológica no campo internacional, como a subordinação do assessor especial para assuntos internacionais de Bolsonaro, Filipe Martins, a um militar. Seguidor do escritor Olavo de Carvalho, Martins agora tem seu trabalho sob o crivo de um almirante. Flávio Augusto Viana Rocha foi escolhido pelo presidente para chefiar a SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos), que agora está vinculada à Presidência.
A assessoria de assuntos internacionais, atribuição de Martins, responde à SAE. E, para os egressos das Forças Armadas, o governo erra ao adotar um tom hostil na política ambiental.
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