O ministro Paulo Guedes (Economia) informou a aliados que sua equipe deve discutir com ministros do Palácio do Planalto nomes indicados por políticos do centrão. Os congressistas têm interesse em ocupar cargos de estatais e outros órgãos.
O movimento ocorre após a saída de Salim Mattar (ex-secretário de Desestatização), integrante da equipe de Guedes responsável por privatizações e por barrar indicações consideradas perigosas -de candidatos sem experiência para o cargo ou com ficha criminal.
Salim saiu há pouco mais de um mês em meio ao esgotamento da vontade do governo em privatizar e ao conflito entre a agenda de Guedes e os interesses políticos de Bolsonaro, que busca a reeleição e acena ao centrão.
A saída de Salim ocorreu com a de Paulo Uebel (também ex-secretário especial de Guedes), no episódio chamado publicamente pelo ministro de debandada da pasta.
Guedes confirmou os pedidos de demissão na sequência de uma reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e com o líder do PP na Casa, deputado Arthur Lira (AL).
A avaliação oficial do trabalho de Salim é que não houve privatizações conforme esperado, mas também não houve escândalos no período. Agora, a visão é que Salim saiu e o centrão chegou.
Por isso, Guedes avalia uma atuação dos novos secretários especiais com a ala militar do governo. O objetivo é que os currículos dos indicados sejam analisados em conjunto para verificar se eles têm perfil adequado ao exigido pela vaga e também se há registros criminais.
A equipe seria liderada por dois membros da equipe econômica e dois ministros palacianos. Entre os integrantes do Planalto, ficariam responsáveis Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo).
Ramos é responsável direto pela negociação entre governo e Congresso. Mais recentemente, inclusive, ele passou a cuidar da agenda econômica na interlocução com congressistas (no lugar do próprio Ministério da Economia).
Já no time de Guedes, os responsáveis pelas avaliações seriam os novos secretários especiais Caio Andrade (de Desburocratização, Gestão e Governo Digital) e Diogo Mac Cord (de Desestatização). Justamente os nomes que substituíram Uebel e Salim, respectivamente.
O quarteto substituiria a tarefa de Salim, que costumava se encontrar mais de uma vez ao mês com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para conversas no Palácio do Planalto.
Era comum Salim levantar a ficha corrida dos candidatos aos cargos para questionar as indicações, além de verificar se uma determinada pessoa tinha formação profissional para determinada vaga.
Conforme a versão oficial, Salim foi colocado para cuidar das estatais justamente porque a Localiza, locadora de veículos fundada por ele, tinha governança considerada boa.
A visão oficial no ministério é que a indicação política não necessariamente significa permitir a entrada de criminosos no governo e que, em muitos casos, é necessário indicar algum nome.
Segundo essa visão, políticos do Nordeste, por exemplo, poderiam indicar engenheiros daquela região para conduzir trabalhos, como obras de infraestrutura.
Salim saiu do governo, segundo ele, por avaliar que seu esforço pelas privatizações dali em diante seria muito grande em comparação ao resultado. Para ele, as vendas não andaram conforme o planejado por culpa do "establishment".
Hoje, o ex-secretário é mais explícito ao culpar também o presidente por não privatizar empresas que precisam apenas de aval do Executivo.
"Depende só dele. Falta vontade", disse Salim na segunda-feira (21) em live com Marcos Cintra, ex-secretário especial da Receita Federal, em evento promovido pelo Instituto Indigo (do PSL).
"Bolsonaro foi cercado por assessores e ministros que o influenciam. A influência do Guedes transformando Bolsonaro num liberal teve como contraefeito uma série de outros assessores e ministros tirando dele [presidente] a ideia liberal, levando para a social-democracia intervencionista, estatista, de gastar mais do que pode e de fazer obra", afirmou.
Segundo disse Salim, cinco bancos não serão mais privatizados. São eles Basa (Banco da Amazônia), BNB (Banco do Nordeste), Caixa, Banco do Brasil e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Cintra também lamentou que o presidente tenha abandonado as ideias de Guedes. "É resultado dessa fé débil do presidente nesses conselhos liberais", disse Cintra.
A visão oficial no ministério, segundo interlocutores, é que adversários e até a própria imprensa teriam "empurrado" Bolsonaro para o centrão ao discutirem a possibilidade de impeachment. Por esse motivo o presidente teria, conforme essa interpretação, procurado sustentação política.
Para amarrar a base de apoio para que suas propostas avancem no Congresso, Bolsonaro negocia com representantes de partidos como PP e Republicanos, que integram o centrão em troca de cargos ou de verbas em obras em seus redutos eleitorais.
Hoje, a interlocução política do governo é feita entre o ministro Ramos, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), o senador Fernando Bezerra (MDB-PE) e o senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
Os três últimos são líderes do governo na Câmara, no Senado e no Congresso, respectivamente. Eles têm influência nas discussões com o deputado Arthur Lira (PP-AL) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI).
O movimento em torno das indicações acontece após um enfraquecimento político de Guedes no governo.
Enquanto divide o ônus do tema com o Planalto, também estaria fazendo um aceno aos ministros palacianos nas escolhas.
Guedes teve atritos com ministros militares durante a pandemia, como na formulação do plano Pró-Brasil -programa que teria obras públicas, algo que contraria o chefe da equipe econômica.
Antes da eleição, Bolsonaro disse que trataria de votações diretamente com os parlamentares, "evitando a liderança partidária que hoje em dia ainda funciona como um sindicato, que, de acordo com o número de deputados, aquele líder partidário procura o governo e fala 'eu quero tantos ministérios, eu quero diretoria de estatais, diretoria de bancos oficiais' e, daí, o problema vem".
Mas a situação política de Bolsonaro se agravou, e o presidente começou a conversar com dirigentes partidários sobre o tema.
"Conduzi a conversa ao longo dos dois últimos meses. Conversei com praticamente todos os presidentes e líderes de partidos. Sim, alguns querem cargos, não vou negar. Alguns, não são todos", disse em sua live de 28 de maio deste ano.
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