Os impactos da pandemia da Covid-19 sobre as operações da Vale seguem controlados e a projeção para a produção de minério de ferro está mantida no intervalo entre 310 milhões e 330 milhões de toneladas em 2020, afirmou ao Estadão/Broadcast em entrevista exclusiva o diretor executivo de ferrosos da mineradora, Marcello Spinelli.
Em meio à disparada dos preços globais da commodity, que já ultrapassou os US$ 100 por tonelada, o mercado tem revelado preocupação com os efeitos que um agravamento da doença no Brasil pode ter na oferta de minério da companhia. "Não há mudança no guidance (projeções), nem previsão de reduzir", disse Spinelli. "Todos os riscos que a gente colocou de antemão estão sendo gerenciados conforme previsto."
Em abril, a Vale revisou para baixo suas estimativas de produção em 2020, alegando o risco de redução de mão de obra em suas minas por causa da pandemia, além dos efeitos remanescentes da tragédia de Brumadinho. A meta de produção de finos de minério inicialmente era de 340 milhões a 355 milhões de toneladas.
De acordo com Spinelli, a Vale tem feito um rígido controle de entrada e saída de empregados, monitorando as condições de saúde de quem continua trabalhando e fazendo quarentenas preventivas. No Pará, onde está o projeto S11D, o maior da Vale, a companhia tem à disposição trabalhadores temporários eventuais para conter um processo de falta de empregados - o Estado chegou a adotar o lockdown em algumas regiões pela gravidade da situação de saúde pública.
"Como essa jornada (contra o coronavírus) vai ser longa, colocamos nas projeções a possibilidade de perda. É uma guerra, ela é constante e só vai acabar quando houver a vacina. Por enquanto, estamos vendo impactos muito pequenos", afirma.
Sobre o cenário para os preços do minério de ferro, Spinelli diz que o fator China é crucial para explicar a curva de alta. Dados da consultoria Mysteel apontam que o estoque de minério de ferro nos portos chineses caiu a 107,8 milhões de toneladas, o menor patamar desde 2016.
Enquanto os estoques de aço começaram a cair após a pandemia arrefecer no país, o nível de utilização dos altos fornos das siderúrgicas já chega a 91,4%. Hoje 92,6% das fabricantes de aço chinesas estão operando com lucratividade. Com a produção de aço indo bem, a demanda por minério é impulsionada.
"Eles (chineses) não vão abrir mão dessa produção (de aço) porque ela é fundamental na estratégia maior do Estado (de retomada econômica via estímulos à infraestrutura e construção)", diz. Como matéria-prima da siderurgia, o minério de ferro entra nessa equação.
Spinelli traça um cenário de desvio de oferta de minério de mercados nos quais a economia está em marcha mais lenta - como a Europa e outros asiáticos, a exemplo de Japão e Coreia do Sul -, para a China em recuperação pós-pandemia. "Todos os grandes fornecedores - inclusive nós - vão realocar oferta para a China. Vamos fazer uma oferta no mínimo igual à do ano passado e, provavelmente, superior", afirma.
O país asiático já é o principal mercado da Vale. Em 2019, as entregas de minério de ferro e pelotas da empresa para o China somaram 190,2 milhões de toneladas, 61% do volume de vendas da companhia. Do lado da oferta, a estimativa é de aumento sazonal no segundo semestre, tanto por parte da Vale quanto das mineradoras australianas, em função da concentração de problemas climáticos no início ano.
A captura da maior oferta direcionada à China em termos de prêmios para o minério de alta qualidade da Vale dependerá, segundo o diretor, das margens que serão obtidas pelas siderúrgicas chinesas. "Vamos ter de monitorar quanto a indústria chinesa ficará saudável. Se a demanda estiver alta, naturalmente as margens tendem a aumentar para o aço e elas podem comprar mais (minério) premium", diz.
Spinelli diz que uma paralisação nas atividades em Itabira (MG) poderia alterar as estimativas de produção. No ano passado, a mineradora produziu 36 milhões de toneladas no complexo. A Justiça determinou a interdição das atividades da mineradora na cidade, após receber denúncia de que 200 funcionários estariam com a Covid-19. Na última sexta-feira, 29, a Vale foi atendida em um pedido de liminar contra a decisão.
"Sem dúvida (poderia mudar as projeções), mas é um caso muito objetivo. Estamos fazendo a testagem, que é tida por todos, inclusive a OMS (Organização Mundial da Saúde), como a grande alavanca para reconhecer o problema e proteger as pessoas", disse Spinelli.
No relatório de produção e na divulgação de resultados do primeiro trimestre, a Vale mencionou também o atraso na retomada de operações interrompidas, como em Timbopeba (MG), para justificar a revisão das estimativas de produção. As medidas de isolamento têm dificultado o trabalho de campo e, assim, a obtenção de autorizações dos reguladores e do Ministério Público.
Na mina de Brucutu, o mais provável é a Vale seguir atuando com apenas duas linhas até o fim do ano. A companhia, diz Spinelli, decidiu aprofundar as investigações sobre a segurança da barragem Laranjeiras, em Brucutu, e espera, além disso, corrigir ou melhorar a condição da estrutura em até 90 dias. Com isso, dificilmente a empresa conseguirá acionar as outras três linhas de produção da unidade. "Não vamos fazer atalho para isso por causa de produção", diz.
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