BRASÍLIA- O Ministério Público Federal afirmou à Justiça que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenta "colocar para debaixo do tapete" um dano "multimilionário" ao tentar trancar investigações sobre seus negócios com recursos provenientes de fundos de pensão de estatais.
Em documento enviado ao TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) nesta segunda-feira (17), a força-tarefa da Operação Greenfield sustenta que projetos tocados por uma gestora de ativos do ministro entre 2009 e 2013 deram, em valores atualizados pela inflação, prejuízo de R$ 360 milhões aos investidores. A defesa do ministro afirma que ele é alvo de um inquérito ilegal e sem provas.
Na última sexta (14), o desembargador federal Ney Bello, do TRF-1, suspendeu temporariamente, após pedido da defesa de Guedes, dois procedimentos investigatórios criminais (PICs) que apuravam a suspeita de envolvimento do ministro em ilegalidades na administração de aportes feitos por entidades de previdência ligadas a estatais, como Petros (Petrobras), Previ (Banco do Brasil), Postalis (Correios) e Funcef (Caixa Econômica), em dois fundos de investimento criados pela BR Educacional Gestora de Ativos, empresa da qual ele era sócio.
Trata-se dos fundos de investimento em participações (FIPs) Brasil Governança Corporativa e BR Educacional.
A suspensão das investigações, requerida pela defesa de Guedes por meio de um habeas corpus, vale por 40 dias. Ficou marcado para 22 de setembro julgamento em que a 3ª Turma do TRF-1 decidirá se a apuração deve prosseguir ou não.
A defesa pede que, no julgamento do mérito da ação, as investigações sejam trancadas em definitivo.
Os fundos aplicaram mais de R$ 1 bilhão nesses FIPs para que eles investissem em empreendimentos diversos. O MPF apura possíveis crimes de gestão temerária e gestão fraudulenta na condução de dois projetos específicos, que geraram perdas: investimentos na empresa HSM do Brasil e na Enesa Participações.
Os casos foram revelados pelo jornal Folha de S.Paulo em 2018.
Não fosse a suposta condução indevida desses negócios, segundo os investigadores e auditores envolvidos no caso, as entidades de previdência poderiam ter obtido lucros maiores.
O desembargador atendeu a pedido da defesa de Guedes. Os advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso alegaram que o ministro sofre coação ilegal e que os procuradores investigam os PICs "mesmo já afastada a mais remota possibilidade de infração penal, insistindo na tramitação dos feitos".
Os advogados argumentaram que não houve prejuízo aos investidores dos dois fundos de investimentos, considerado o conjunto de todos os projetos desenvolvidos. Pelo contrário, acrescentaram eles, ambos foram superavitários e proporcionaram substancioso ganho de capital aos seus cotistas.
"Ao meu sentir, é no mínimo plausível a tese segundo a qual não há ato típico de gestão temerária ou quiçá fraudulenta no caso em comento", afirmou o desembargador.
Os advogados também afirmaram que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) concluiu não haver irregularidades na gestão dos fundos sobre responsabilidade, entre outras pessoas, de Guedes.
"É razoável crer que descabe falar na ocorrência de gestão temerária ou fraudulenta, tendo em vista que não houve qualquer prejuízo ou risco aos participantes do fundo, assim como também não restou demonstrada qualquer prática irregular que tenha implicado em risco ao Sistema Financeiro Nacional, conforme declarações da própria CVM", escreveu o desembargador.
No documento enviado ao TRF-1, o MPF sustenta que a CVM "não examinou, sequer de forma superficial", o mérito dos casos, apenas negou-se a abrir procedimento para apurar os fatos. "Não é possível afirmar que a CVM tenha absolvido o impetrante."
Os procuradores também destacaram que as duas investigações não examinam todas as aplicações realizadas pelos FIPs, mas pontualmente os investimentos na HSM Brasil e na Enesa.
Eles explicaram que, em 2010, o FIP Brasil Governança Corporativa investiu R$ 112 milhões em ações da Enesa, vendidas em 2018 pelo valor simbólico de R$ 100 mil. Atualizada pela inflação, a perda é de R$ 287 milhões.
Os investidores afirmaram que o FIP Brasil Governança Corporativa tem gerado prejuízos e que quase todo o investimento na Enesa Participações foi perdido.
"Dessa forma, o esforço de Paulo Guedes para arquivar a investigação sobre o investimento suspeitíssimo na empresa Enesa Participações deve ser entendido como uma tentativa de colocar para 'debaixo do tapete' um dano - possivelmente criminal - multimilionário, que hoje contribui para a situação delicada por que passam os maiores fundos de pensão do país - bem como seus participantes, aposentados e pensionistas, que são obrigados a realizar contribuições extraordinárias para colmatar o rombo deixado por administrações anteriores das entidades fechadas de previdência complementar", continuaram.
O FIP Brasil Governança Corporativa, segundo eles, encontra-se ainda em funcionamento, sendo seu encerramento sucessivamente adiado desde 2017, "na esperança de obter um preço melhor pelas ações que permanecem em sua carteira". "Seriam necessárias amortizações de mais R$ 336 milhões para evitar um resultado final negativo, se comparado a um investimento livre de risco", dizem os procuradores.
No caso da HSM Brasil, sustenta a Greenfield, a perda em valores de hoje é de R$ 72 milhões.
"O prejuízo com as negociações de ações da HSM do Brasil afetou diretamente o valor da cota do FIP BR Educacional, embora o conjunto de investimentos do FIP (ao contrário do FIP Brasil Governança Corporativa) tenha apresentado resultado positivo para os cotistas", afirmam os procuradores.
A Greenfield informou que todos os documentos solicitados pelo ministro para que fossem juntados aos procedimentos criminais foram incluídos.
"O MPF jamais negou qualquer pedido desta natureza. Ou seja, apesar da contestação da defesa de que as declarações da CVM não foram juntadas aos autos, tal requerimento não foi realizado."
A defesa de Guedes afirmou nesta segunda, em nota, que as informações prestadas pela Greenfield "constituem prova inequívoca de que o ministro encontra-se sendo investigado em um inquérito ilegal e manifestamente sem provas".
"Apesar de escrever longas 13 páginas, o MPF em nenhuma linha justifica o fato de ter omitido a existência de decisão da CVM, que expressamente reconheceu a lucratividade e legalidade dos fundos `investigados', eximindo-se, ainda, de sua obrigação processual de ter que juntar aos autos tais documentos que inocentam Guedes", diz o texto.
"Portanto, é descabido e persecutório falar em fraude, e a maior prova disso é que os fundos da gestora de Paulo Guedes deram lucro aos fundos de pensão, conforme expressamente dito, inclusive, pela CVM."
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