O mercado doméstico de câmbio viveu uma sessão agitada e de muita volatilidade nesta sexta-feira, 22, com oscilação de mais de 13 centavos entre a mínima e a máxima, em dia marcado por especulações em torno da permanência de Paulo Guedes - outrora "posto Ipiranga" do presidente da República, Jair Bolsonaro, e último fiador do governo junto ao mercado - à frente do ministério da Economia.
O dólar já abriu o dia em forte alta e varou o teto de R$ 5,70 logo na primeira hora de negócios, ainda espelhando a debandada na equipe econômica, puxada pela saída na quinta à noite do secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e do secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, na esteira da mudança das regras do teto de gastos embutida da PEC dos Precatórios.
No início da tarde, no auge da boataria de que Guedes estava demissionário, a moeda norte-americana chegou a ultrapassar a marca de R$ 5,75, ao correr até a máxima de R$ 5,7545 (+1,53%). O movimento altista arrefeceu após notícia de encontro entre o presidente Jair Bolsonaro e Guedes, às 14h30.
O alívio do mercado financeiro veio de vez quando Bolsonaro e Guedes apareceram juntos, selando a permanência do ministro no governo. Embora Guedes tenha perdido grande parte da sua credibilidade entre os investidores, sua presença ainda serve de contraponto para as tendências mais populistas da ala política do governo, afirmam operadores.
Com mínima a R$ 5,6223, registrada na reta final do pregão, o dólar à vista encerrou a sessão desta sexta-feira em queda de 0,71%, a R$ 5,6273. Apesar disso, a moeda norte-americana termina esta semana com valorização de 3,16% e já acumula alta de 3,33% em outubro - o que evidencia uma reprecificação relevante do real nos últimos dias.
"O mercado estava precisando de mais informações e as explicações de Guedes acabaram fazendo preço. Tivemos um estresse muito grande ontem e em parte do pregão de hoje, com o dólar flertando com 5,80, e era de se esperar que houvesse alguma correção", afirma o gerente da mesa de derivativos financeiros da Commcor DTVM, Cleber Alessie Machado, que chama a atenção para a fala de Guedes sobre dados positivos da arrecadação, em uma tentativa de dizer que o aumento de gastos com o Auxílio Brasil não prejudica a política fiscal.
Em sua fala, Bolsonaro disse que tem "confiança absoluta" em Guedes e que o ministro "entende as aflições que o governo passa". Após defender o Auxílio Brasil no valor de R$ 400, o presidente diz que o governo tem responsabilidade e não fará "nenhuma aventura".
Guedes, por sua vez, refutou que tenha pedido demissão e disse faltou tolerância aos "jovens" da equipe econômica para conciliar a solução técnica com a fiscal, em referência a Bruno Funchal e Jeferson Bittencourt, cujas saídas ele classificou como algo "natural". O substituto de Funchal será o Esteves Colnago, que hoje ocupa a Assessoria Especial de Relações Institucionais do Ministério da Economia. "A preferência da economia era manter o teto e pedir uma autorização para gastar um pouco mais, ali ao lado. Mas, tecnicamente, (a mudança no teto) é defensável", disse Guedes cuja proposta inicial era de gastos de R$ 30 bilhões fora do teto, mas que acabou cedendo à reformulação da âncora fiscal.
O ministro disse que foi mal interpretado quando disse que era preciso "licença para gastar um pouco mais", ao se referir ao Auxílio Brasil, e ressaltou que a solução costurada na PEC dos Precatórios não altera os fundamentos fiscais da economia brasileira. "As finanças não foram abaladas. Não estou preocupado se foi extrateto ou levantamento do teto", comentou.
A economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte, vê a queda do dólar após o discurso do Guedes como um "pequeno ajuste" depois de um período de grande estresse, mas ressalta que a percepção de risco segue em nível elevado. "O fato de o Guedes continuar deu algum ânimo e possibilitou esse ajuste, já que ele é o único braço relativamente liberal no governo", diz Consorte. "Mas o dólar no patamar atual sugere que o mercado não gostou das mudanças fiscais, que ainda são vistas como 'pedaladas'. Devemos ver ainda bastante volatilidade".
Para Machado, da Commcor DTVM, após as movimentações dos últimos dias, a taxa de câmbio já carrega um prêmio de risco considerável, o que pode, em tese, abrir espaço para uma queda do dólar. A disputa pela formação da taxa Ptax de fim de outubro na semana que vem e eventuais fluxos podem, contudo, levar a moeda a flertar novamente com R$ 5,75. "Pelos fundamentos, é mais plausível o dólar ir para R$ 5,50, porque o pior momento do ajuste de prêmios já passou. Mas é preciso ver a questão do fluxo e da demanda", ressalta Machado.
A expectativa dos analistas é que o BC continue a atuar com leilões extras de swaps cambiais para suprir demandas específicas, além das ofertas ligadas ao overhedge dos bancos e das rolagens de contratos vincendos. A perspectiva de uma aceleração do ritmo de aperto monetário pelo Copom na próxima semana pode dar também algum fôlego ao real, caso não haja novas surpresas no front fiscal.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta