Aguardada pelo governo e com promessa de trabalho durante o recesso parlamentar, a comissão de deputados e senadores destinada a analisar propostas de reforma tributária nem sequer foi criada no Congresso.
Em dezembro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anunciou que o colegiado seria formado imediatamente e funcionaria no recesso. Na ocasião, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu a atuação célere do grupo sob o argumento de que seria importante ter um relatório pronto no colegiado após o carnaval.
Depois de quase um mês, Alcolumbre não formalizou nem a abertura de prazo para a indicação de membros pelos partidos. Sem isso, não é possível instalar o colegiado. Nem mesmo reuniões informais ocorreram nessas últimas semanas.
"Acho que isso vai ficar mesmo para fevereiro. É ruim, porque a ideia era que, em fevereiro, já teríamos um texto a ser votado", disse o deputado Hildo Rocha (MDB-MA).
Rocha é presidente da comissão da Câmara que analisa a reforma tributária. Ele deve ocupar a vice-presidência do colegiado formado por deputados e senadores que estudará o mesmo tema.
A reestruturação do sistema tributário deve ser feita por uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), que tem uma tramitação mais lenta no Congresso e depende do apoio, em dois turnos, de 60% da Câmara e do Senado. Também deve ser necessária a aprovação de outros instrumentos legais.
Como 2020 é ano de eleição municipal, tradicionalmente o ritmo de trabalho do Legislativo cai, sobretudo no segundo semestre.
"Aprovar PEC no ano eleitoral é muito difícil. E, até agora, não fui procurado para tentar avançar na reforma", contou Rocha.
Técnicos do Congresso dizem não ter recebido informação e afirmam acreditar que são baixas as chances de o colegiado ser criado no recesso, que vai até 2 de fevereiro.
Até a última atualização deste texto, a assessoria do presidente do Senado não havia se manifestado sobre o atraso no cronograma divulgado em dezembro.
A equipe econômica aguarda a instalação do grupo para apresentar as propostas do governo para a reforma tributária.
Com articulação de Maia, o líder do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), apresentou, em abril, uma PEC para alterar o sistema tributário.
O projeto teve apoio dos principais líderes do centrão -grupo de partidos que atuam de maneira independente em relação ao governo e que, juntos, representam a maioria dos deputados.
A versão da reforma elaborada pela Câmara prevê a substituição, em dez anos, de cinco tributos que incidem sobre o consumo (ICMS, PIS, Cofins, ISS e IPI) por um imposto único: o IBS (imposto sobre bens e serviços).
A proposta já passou pela CCJ (comissão de Constituição e Justiça) e pela fase de debates em comissão especial.
A equipe de Jair Bolsonaro enfrenta uma espécie de crise de ciúmes entre Câmara e Senado. As Casas, desde o começo do ano, disputam o protagonismo na agenda econômica e reformista encabeçada por Paulo Guedes (Economia) e apoiada por Maia.
Um exemplo da falta de sintonia é o impasse na formação da comissão mista (composta por deputados e senadores) para discutir o tema. O colegiado é discutido desde setembro do ano passado.
Em busca de protagonismo nesse tema, líderes da Câmara também tentam driblar os planos do governo de realizar uma reforma em etapas, começando pelo PIS/Cofins.
Deputados que estão à frente da discussão consideram que uma reforma do sistema sem incluir de saída o ICMS, principal motivo de disputa entre estados no sistema tributário, não seria efetiva.
O governo argumenta que as propostas são complementares, pois a reforma mais ampla (do Congresso) precisa de um tempo de transição de até dez anos para entrar em vigor, enquanto a unificação do PIS e da Cofins já simplificaria o sistema tributário no curto prazo.
Historicamente, presidentes falham ao tentar aprovar uma reformulação tributária no Congresso. A medida enfrenta resistência de diversos setores, que rechaçam pagar mais impostos que atualmente.
Embora argumentem que a ordem é que haja neutralidade na reformulação do sistema tributário, auxiliares de Guedes reconhecem, nos bastidores, ser inevitável que alguns setores passem a pagar mais tributos após a reforma.
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