O crescimento de 1,2% da economia brasileira no primeiro trimestre de 2021 zerou as perdas registradas desde o início da pandemia do coronavírus, mas deixou para trás o segmento que mais emprega no país, aquele que inclui os serviços que dependem de aglomerações e contato social.
Classificado nas estatísticas oficiais como "outros serviços", atividades como alojamento, alimentação, lazer e turismo respondem por 20% do PIB (Produto Interno Bruto) e 32% do emprego no país.
Essas empresas ainda estão com um nível de atividade 9,5% abaixo do patamar pré-crise, do último trimestre de 2019, enquanto o PIB como um todo já voltou àquele nível, segundo dados divulgados nesta terça-feira (1º) pelo IBGE.
"O lado B do nosso PIB positivo é que você vê ainda segmentos que são intensivos em mão de obra, como outros serviços, contraindo bastante", afirma Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
Serviços que empregam menos, como informação e financeiro, por outro lado, já se recuperaram da crise e estão em pleno crescimento.
"Enquanto a pandemia não passar, vai ser essa questão de ter um PIB até um pouco melhor do que inicialmente previsto, mas com pouco emprego. São dois mundos, uma economia em duas velocidades."
Rafaela Vitoria, economista-chefe do Banco Inter, afirma que, apesar da expectativa de melhora do mercado de trabalho no segundo semestre, questões como a renovação do auxílio emergencial e a criação de um novo programa de renda mínima para 2022 são fundamentais.
"Apesar de uma recuperação a partir do segundo semestre por causa da vacinação, a gente ainda vai sair da pandemia com o mercado de trabalho bem mais fragilizado. Então programas sociais vão ser ainda fundamentais para a gente ter um crescimento mais sustentável de longo prazo", afirma Vitoria.
"Esse PIB não reflete essa situação frágil do nosso mercado de trabalho. A gente tem um PIB forte, mas um mercado de trabalho ainda fraco, justamente porque os setores que empregam mais são os setores que estão para trás ainda."
O economista Fábio Astrauskas, professor do Insper e sócio-diretor da Siegen Consultoria, avalia que o desempenho do PIB provocou uma "surpresa positiva", dado que o primeiro trimestre teve piora da pandemia e suspensão de programas como o auxílio emergencial.
Na visão do analista, a economia tem condições de crescer acima de 4% no acumulado deste ano, já que foi menos prejudicada do que o esperado entre janeiro e março. A reação, contudo, tende a ser pouco sentida por boa parte da população, segundo ele.
A explicação para isso é o desempenho mais modesto de serviços, o principal setor do PIB e o grande empregador brasileiro, combinado com a inflação em alta, diz Astrauskas.
"Tem aquela frase de que é preciso crescer o bolo para depois reparti-lo. O problema é que o bolo está crescendo para quem já está comendo muito mais. Precisamos de melhor distribuição de renda, e a reforma tributária é importante para isso", comenta.
Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, mantém a projeção de crescimento de 3,3% para o PIB deste ano. A previsão não foi revisada para cima porque ainda existem riscos no cenário dos próximos meses, indica o analista.
Agostini cita um "descompasso" entre a demanda internacional e as condições do mercado interno. Nesse sentido, ressalta que, enquanto a procura por commodities segue aquecida, o consumo das famílias continua fragilizado no país. Segundo o economista, inflação e desemprego em alta desafiam a melhora doméstica.
"Uma saída que o Brasil está encontrando é a das exportações, mas temos grandes problemas de renda dentro do país", pontua.
"O aumento da inflação pesou, principalmente, no consumo de alimentos ao longo desse período. O mercado de trabalho desaquecido também. Houve ainda redução significativa nos pagamentos dos programas do governo às famílias, como o auxílio emergencial", disse a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.
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