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Reforma Tributária: texto-base é aprovado pela CCJ e vai a votação no Senado

Reforma Tributária: texto-base é aprovado pela CCJ e vai a votação no Senado

Relator negociou novas concessões para aumentar apoio político; texto deve ser votado no plenário nesta quarta (8)

Publicado em 7 de novembro de 2023 às 16:44

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IDIANA TOMAZELLI E THAÍSA OLIVEIRA

BRASÍLIA - A Reforma Tributária avançou mais uma etapa no Senado Federal com a aprovação do texto-base da PEC (proposta de emenda à Constituição) na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) nesta terça-feira (7).

O placar foi de 20 votos a 6, em apoio ao parecer do relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM). Nas últimas semanas, ele ampliou as exceções e elevou de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões o repasse anual que a União precisará fazer aos Estados para que consigam financiar a atração de investimentos locais após a reforma.

Senador Eduardo Braga
Eduardo Braga, relator da reforma tributária no Senado. (Jefferson Rudy/Agência Senado)

A comissão ainda precisa analisar os destaques (sugestões de mudança no texto). Depois, a proposta terá de ser votada em dois turnos no plenário do Senado, o que está previsto para ocorrer nesta quarta (8). Se aprovada, a PEC deve passar novamente pelo crivo dos deputados, já que sofreu alterações.

Para angariar apoio político, o relator aceitou novas emendas parlamentares horas antes da votação. As alterações têm impacto para famílias de baixa renda, para setores econômicos e para estados e municípios, mas mantêm a espinha dorsal da reforma.

Braga ressaltou que as mudanças foram acordadas com o Executivo. "Isso tudo foi discutido com o ministro da Fazenda [Fernando Haddad], com o governo e com os senadores que compõem a CCJ", disse.

"O relatório não é uma obra de arte perfeita, mas, na democracia é a construção possível, principalmente na correlação de forças da democracia. Esta é a primeira Reforma Tributária que o Brasil constrói em regime democrático, o que é muito difícil."

Além dos ajustes no texto, o governo também deflagrou uma estratégia de articulação. Após derrotas importantes sofridas na Casa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entrou em campo na véspera da votação e conversou com lideranças do Senado no Palácio do Planalto.

Apesar do risco remoto de rejeição a uma proposta tão relevante quanto a Reforma Tributária, o chefe do Executivo recebeu o alerta de aliados sobre a necessidade de fazer um gesto de aproximação aos senadores, que vinham relatando incômodo com a falta de envolvimento do Planalto nas negociações.

No encontro, segundo relatos, o presidente pediu votos e reforçou a mensagem de que a reforma é uma agenda estratégica para o governo. Já Haddad defendeu a pauta econômica de forma mais abrangente, ressaltando a importância de aprovar também as medidas que podem incrementar a arrecadação em 2024.

Além da atuação direta do presidente, o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, chegou pouco antes das 9h ao Senado. Appy acompanhou toda a sessão da CCJ junto com assessores e dialogou com parlamentares sobre as alterações de última hora, repetindo o ritual adotado desde a apreciação da PEC na Câmara.

Um dos principais ajustes de texto foi feito na chamada transição federativa, que vai durar 50 anos e compreende a redistribuição de receitas entre estados e municípios para evitar oscilações abruptas após a migração da cobrança dos tributos da origem (onde bens e serviços são produzidos) para o destino (onde ocorre o consumo).

Essa transição é invisível ao contribuinte, mas tem bastante peso e relevância para o planejamento fiscal dos governos regionais.

Na versão inicial do texto, estados e municípios poderiam manter patamar de receitas semelhante ao atual independentemente de esforço para fiscalizar o cumprimento da nova legislação ou do seu desempenho econômico – permitindo que alguns pegassem "carona" na eficiência dos demais.

Por isso, o relator incluiu um fator de ajuste para premiar os entes que forem mais eficientes e conseguirem ampliar sua fatia no bolo total de receitas, como antecipou a Folha.

Braga também incluiu um cashback (devolução de tributo pago) obrigatório para famílias de baixa renda na aquisição do gás de botijão. Na primeira versão, o reembolso já era compulsório para a conta de luz.

O relator ainda ampliou o escopo da prorrogação de benefícios fiscais a montadoras do Nordeste, Norte e Centro-Oeste para contemplar também automóveis flex (movidos a etanol e gasolina) e manteve a isenção para compra de veículos por pessoas com deficiência, transtorno do espectro autista ou por taxistas.

Braga também fez um aceno aos estados do Centro-Oeste, permitindo que eles mantenham a taxação de produtos primários e semielaborados (como commodities agrícolas e minerais) até 31 de dezembro de 2043. Essa mudança é uma forma de compensá-los pela fatia menor no FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional).

Desde o início da atual gestão, Haddad elegeu a Reforma Tributária como uma das prioridades da agenda econômica.

A proposta aprovada na CCJ prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O sistema será dual: uma parcela da alíquota será administrada pelo governo federal por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).

Também será criado um Imposto Seletivo sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde (como cigarros e bebidas alcoólicas) ou ao ambiente, à exceção dos produzidos na Zona Franca de Manaus.

A implementação dos novos tributos começará em 2026, com uma alíquota teste de 0,9% para a CBS e de 0,1% para o IBS.

Em 2027, PIS e Cofins serão completamente extintos e substituídos pela nova alíquota de referência da CBS. As alíquotas do IPI também seriam zeradas para a entrada em vigor do Imposto Seletivo.

A migração dos impostos estaduais e municipais para o novo IBS será mais gradual. Até 2028, a cobrança se manterá em 0,1% -dividida em duas alíquotas de 0,05%, uma estadual e outra municipal.

Em 2029, a cobrança de ICMS e ISS passa a ser reduzida em 1/10 por ano até 2032. Em 2033, os impostos atuais serão totalmente extintos.

As alíquotas definitivas de cada tributo serão detalhadas depois, em lei complementar, mas estimativas do governo indicam que a cobrança total do novo IVA deve ficar entre 26,9% e 27,5% – já contando com o efeito das exceções adicionais incorporadas por Braga em seu parecer.

A alíquota padrão vai incidir sobre a maior parte do consumo de bens e serviços no país. Se confirmados os cálculos do governo, ela tende a ser uma das mais elevadas entre os 174 países que adotam o modelo IVA para tributar o consumo.

A reforma ainda prevê alíquota zero para itens da chamada Cesta Básica Nacional, uma relação mais restrita de itens essenciais consumidos pelas famílias brasileiras.

Há outras duas categorias de alíquotas. A primeira é a reduzida, equivalente a 40% do valor cheio, aplicável a bens e serviços como saúde, educação, medicamentos, transporte coletivo urbano, semiurbano e metropolitano, além da cesta básica estendida (que inclui outros produtos alimentícios e de higiene não contemplados pela isenção).

A segunda é a intermediária, equivalente a 70% da cobrança integral, válida para profissionais liberais de categorias regulamentadas, como advogados, engenheiros e contadores, que estejam fora do Simples Nacional --na prática, profissionais que faturam mais de R$ 4,8 milhões ao ano.

Algumas das exceções, como saúde e educação, são também comuns em outros países que adotam o modelo IVA. Outras, no entanto, foram vistas pelo próprio governo como problemáticas. O tratamento diferenciado para profissionais liberais, por exemplo, não tem paralelo no mundo, segundo técnicos do Executivo e especialistas.

O texto aprovado ainda manteve regimes específicos aprovados pela Câmara, como combustíveis e serviços financeiros, e incluiu no rol de atividades agências de viagens e turismo, serviços de saneamento e de concessão de rodovias, além de operações que envolvam a disponibilização de estrutura compartilhada em telecomunicações.

A parcela dos serviços de transporte intermunicipal e interestadual também ficará num regime específico, o que acabará sendo mais vantajoso para o governo do que o tratamento anterior, com alíquota reduzida --que poderia acabar gerando uma carga negativa, dada a quantidade elevada de créditos acumulados por essas companhias.

O texto ainda prevê uma reavaliação da conveniência de todos esses regimes a cada cinco anos.

Apesar das flexibilizações no texto, grande parte dos economistas defende a aprovação da reforma. Uma das vantagens do novo modelo é a redução significativa da tributação em cascata.

Com a PEC, as empresas poderão fazer uso mais amplo dos tributos pagos na aquisição de insumos como créditos para abater do valor a ser recolhido na comercialização de seus produtos ou serviços. Hoje, esse processo tem um alcance bem mais limitado, o que acaba fazendo com que as companhias paguem imposto sobre imposto.

Durante a tramitação no Senado, Braga ainda inseriu uma trava: a carga sobre o consumo não poderá ser maior do que a média observada entre 2012 e 2021 – um patamar próximo a 12,5% do PIB (Produto Interno Bruto).

Em entrevista à Folha, o relator defendeu o mecanismo como uma forma de evitar aumento da carga para financiar expansão de despesas do governo, sobretudo em momentos de menor dinamismo da atividade econômica. "Se o [crescimento do] PIB for zero, amigo, vai ter que cortar gasto, porque não vai poder esticar a corda em cima do contribuinte", disse Braga no início do mês.

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