SÃO PAULO - A proposta de reforma tributária em análise no Congresso possui diversas formas de exceção. Entre elas, os chamados regimes específicos de tributação. São setores que poderão recolher os novos tributos em um formato diferente daquele que valerá para os demais.
A reportagem procurou o Ministério da Fazenda e entidades que representam algumas dessas empresas para ouvir qual seria essa diferença. Em geral, o pedido do setor privado é para manter a carga tributária atual, com alíquota mais baixa possível e sistema não cumulativo.
O ministério diz que a proposta para regulamentação desses regimes não está definida e será discutida com os Estados e municípios, que também são afetados por qualquer impacto na arrecadação.
O texto atual da proposta dá algumas pistas de como serão esses regimes, que poderão contar com alíquota reduzida, isenção ou até manter uma tributação cumulativa sobre faturamento.
Inicialmente, a diferenciação seria aplicada a combustíveis e lubrificantes, operações de crédito e bens imóveis, como em outros países. Mas a lista cresceu no Congresso e passou a incluir, por exemplo, transporte interestadual, turismo e entretenimento.
O regime específico se refere à forma de recolher dois novos tributos, a CBS federal e o IBS de estados e municípios, que vão substituir outros quatro (PIS, Cofins, ICMS e ISS).
Alguns especialistas avaliam que alguns setores podem se arrepender da decisão de permanecer em um sistema semelhante ao atual na tentativa de serem menos tributados. Caso isso ocorra, será necessário mudar o regime por meio de projeto de lei.
As operações de crédito costumam ter isenção em outros países. A versão atual da reforma diz que a carga dos tributos extintos sobre empréstimos deve ser mantida até 2031. Provavelmente com uma cobrança sobre faturamento. Tarifas bancárias e comissões serão tributadas pela regra geral, com alíquota cheia e direito a crédito.
De acordo com o texto da proposta, outros serviços financeiros também terão tributação diferenciada, como operações de câmbio, seguros, consórcios, previdência privada, arranjos de pagamento e corretagem.
O regime específico se aplica a quatro tipos de operações imobiliárias: (a) construção e incorporação; b) parcelamento do solo e alienação de bem imóvel; c) locação e arrendamento; d) administração e intermediação (corretagem).
O governo já citou a possibilidade de a venda do imóvel da construtora para o consumidor ter tributação reduzida. A transação entre pessoas físicas seria isenta.
Quando houver alguma tributação, esse imposto não deve ser recuperado. No caso de uma empresa que pague aluguel ou adquira um imóvel, por exemplo, o tributo não gera crédito para essa pessoa jurídica.
O presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), Renato de Sousa Correia, afirma que cada uma dessas operações poderá ter regras e alíquotas diferenciadas entre si. Em alguns casos, pode ser utilizado o chamado RET (Regime Especial de Tributação) para incorporações imobiliárias, que atualmente tem uma alíquota fixa sobre as receitas e inclui o PIS/Cofins.
Correia diz acreditar que se encontre uma solução para que essa tributação não seja cumulativa, ou seja, que a construtora possa recuperar os tributos pagos em seus insumos. "A gente defende o sistema não cumulativo como um sistema interessante para o país e para o setor."
O setor de saúde foi contemplado com isenção ou alíquota reduzida em 60%, o que manteria a carga desses serviços em um patamar próximo ao atual de 10%.
Avaliou-se, no entanto, que os planos de saúde precisam de uma alíquota em torno de 8% e que tribute apenas o valor da intermediação financeira entre clientes e médicos. Por isso, o setor demandou a entrada na lista de regimes específicos, afirma Breno Monteiro, presidente da CNSaúde (Confederação Nacional de Saúde).
"A gente defende uma alíquota de equilíbrio, que vai depender de o regime ser cumulativo ou não", afirma. "Não adianta manter a neutralidade para o hospital e aumentar a carga para a operadora."
Um mesmo dispositivo da proposta trata do regime específico de serviços financeiros, imóveis, planos de saúde e também concursos.
Nesses quatro casos não há limite para redução da alíquota. Os tributos podem ser cobrados sobre receita, faturamento ou valor agregado. Inclusive com alíquota uniforme em todo o país, sem que cada estado e município possa decidir a sua.
Os gastos das empresas com esses serviços não devem gerar créditos para elas.
Os novos tributos incidirão uma única vez, provavelmente na refinaria, e não a cada etapa da produção, para evitar sonegação.
As alíquotas podem variar de acordo com o produto, favorecendo combustíveis menos poluentes, e serem aplicadas por unidade de medida.
Se o consumidor desse produto for uma empresa, poderá usar o tributo pago como crédito — exceto se a aquisição for destinada a distribuição, comercialização ou revenda.
A questão mais polêmica para o setor, no entanto, está em um artigo que prevê que derivados de petróleo e combustíveis poderão ser tributados com o Imposto Seletivo. A extração de petróleo também será alvo desse tributo.
A CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) conseguiu incluir na lista de regimes específicos serviços de hotelaria, parques de diversão e temáticos, agências de viagens/turismo e bares e restaurantes.
Gilberto Alvarenga, consultor da CNC, afirma que muitas empresas podem preferir continuar com uma tributação menor e cumulativa, em vez da alíquota maior com aproveitamento de crédito prevista na regra geral da reforma.
O setor indica que irá brigar, no entanto, para que seja possível garantir a não-cumulatividade para, pelo menos, empresas que adquirem esses tipos de serviços.
"A gente não sabe se vai ser um desenho próximo ao de hoje, um regime cumulativo com uma alíquota menor, ou um desenho diferente, em um regime não cumulativo."
O Senado incluiu na lista atividades esportivas desenvolvidas por Sociedade Anônima do Futebol. O objetivo é permitir o recolhimento unificado dos tributos por essas entidades dentro do Regime de Tributação Específica do Futebol criado em 2021. Com isso, haveria uma equiparação com os clubes que atuam como entidades sem fins lucrativos e desfrutam de isenções tributárias.
A proposta prevê a exceção para serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual — o urbano e metropolitano terá alíquota reduzida em 60% — , ferroviário e hidroviário.
Em todos os casos, pode prever alterações nas alíquotas, com a mesma tributação em todo o país.
Também estão na lista aviação regional, cooperativas e operações alcançadas por tratado internacional, como missões diplomáticas.
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