SÃO PAULO - O aumento da taxa básica de juros (Selic) e da inflação tendem a encarecer as linhas de financiamento imobiliário atreladas à poupança e ao IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) e a deixar as modalidades tradicionais (prefixadas) mais vantajosas.
Essas linhas --cujos juros contam com uma taxa fixa mais uma porcentagem baseada na variação desses índices-- são novas, e cada vez mais têm sido usadas por alguns dos grandes bancos para impulsionar o crédito imobiliário em um cenário de juros historicamente baixos e demanda reprimida no setor.
Não são todos os bancos que oferecem as linhas pós-fixadas. Entre os grandes bancos, o financiamento imobiliário atrelado ao IPCA atualmente é oferecido somente pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal, enquanto o crédito atrelado à poupança é oferecido apenas pelo Itaú e pela Caixa Econômica.
Tais modalidades apareceram como diversificação nas ofertas de financiamento imobiliário das instituições financeiras e, pelo menos enquanto os juros básicos e a inflação estavam controlados em patamares baixos, eram atrativas para os consumidores.
Agora que essas taxas começam a subir, no entanto, a tendência é de uma correção para cima no custo para os tomadores --tanto para créditos novos, como para aqueles que pegaram um financiamento do tipo ao longo dos últimos anos.
"Os bancos já estavam ofertando bastante essas linhas indexadas e é preciso cuidado. Vimos o crédito imobiliário batendo recorde e muita gente pode ter escolhido essas linhas porque realmente estavam mais baratas. Mas agora o cenário já começa a mudar", afirmou Maurício Godoi, professor da Saint Paul Escola de Negócios.
Segundo o último relatório Focus do Banco Central, a projeção é que a inflação termine este ano em 4,92% -há quatro semanas, a previsão era de 4,71%.
Já em relação à Selic, a projeção é que a taxa básica de juros encerre 2021 em 5,25% ao ano (contra 5,00% há quatro semanas) -a Selic começou este ano em 2%.
Para 2022, a expectativa é que a inflação e a Selic encerrem em 3,60% e 6% ao ano, nesta ordem. Para 2023, as projeções passam para 3,25% e 6,50% ao ano, respectivamente.
Além de o aumento da Selic influenciar nos juros prefixados cobrados nas linhas mais tradicionais --que cobram uma taxa fixa mais a TR (taxa referencial, atualmente zerada) e representam a maioria das concessões do mercado--, a taxa também influencia na poupança.
Pela regra atual, a poupança tem rendimento equivalente a 70% da Selic mais a variação da TR. Na prática, isso significa que o aumento da taxa básica influencia diretamente nos juros do financiamento imobiliário atrelado à caderneta.
No início do ano, por exemplo, um consumidor pagava juros de 5,4% nessa linha de crédito -considerando taxa fixa de 4% ao ano e a Selic em 2%.
Ao final de 2021, caso as projeções do Focus se concretizem e a Selic atinja ao menos 5% ao ano, esse mesmo consumidor pagará juros de 7,5% -um aumento de 38,8% em relação ao que pagaria no início do ano.
A variação ao longo do tempo também acontece nas linhas atreladas à inflação --que podem acabar sendo desvantajosas para mutuários diante da alta volatilidade do indicador no atual cenário macroeconômico.
As taxas das linhas mais tradicionais costumam ser prefixadas a partir de 7%, aproximadamente.
No final de março, a Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) divulgou que o crédito imobiliário bateu um novo recorde em fevereiro, atingindo R$ 12,45 milhões -recorde nominal para o mês na série histórica iniciada em 1994 e quase o dobro em relação a igual mês de 2020 (R$ 6,38 milhões).
Para a presidente da associação, Cristiane Portella, a maior demanda por crédito imobiliário ao longo de 2020 também foi um reflexo dos efeitos trazidos pelo home office imposto pela pandemia do coronavírus.
"Estamos vivendo um momento de maior valorização da residência, com as pessoas buscando viver melhor. E aqueles que não perderam seus empregos ou que cuja empresa não quebrou, continuam com seus planejamentos. Para este ano, nossa previsão é de um crescimento de 27%", disse.
A projeção, segundo Portella, já considera uma expectativa de aumento dos juros. No ano passado, o crescimento do setor foi de 58%.
Segundo Godoi, uma boa alternativa para os consumidores que tomaram linhas atreladas ao IPCA e à poupança --e agora começam a ver as taxas decolando--, pode ser a portabilidade de crédito para instituições que ofereçam melhores condições.
"Não tem muito o que fazer. A melhor saída é tentar negociar com o banco ou fazer a portabilidade, sempre prestando atenção e fazendo uma análise dos possíveis custos que essa portabilidade pode implicar", disse.
Os especialistas afirmam ainda que o cuidado e a análise dos juros antes da contratação do crédito podem poupar dores de cabeça futuras.
"A variedade de linhas é importante para o consumidor, mas alguns cuidados precisam ser tomados antes da contratação. É preciso fazer uma busca em várias instituições financeiras, comparar condições de juros e prazos e sempre olhar o CET [custo efetivo total], que soma taxas adicionais que os bancos cobram", afirmou o presidente da plataforma digital de crédito imobiliário Credihome, Bruno Gama.
Gama recomenda consultar especialistas e até estudar as projeções de taxas de juros para os próximos anos.
"É importante o tomador estar ciente do seu contrato e das taxas cobradas para saber fazer boas escolhas", disse.
Com taxas prefixadas
Com taxa fixa + TR (taxa referencial)
Mais tradicional, responde pela maioria das concessões feitas no mercado. Como a variação é baseada na TR, hoje zerada, pode ser vantajosa. Porém, caso a TR se altere, as parcelas do crédito podem subir. Os juros começam em cerca de 6,25% ao ano
Atrelado ao IPCA (inflação oficial do país)
Atrelado à poupança
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