O fim da emergência de saúde pública anunciado no domingo (17) pelo ministro Marcelo Queiroga, da Saúde, afetará também a vida dos trabalhadores que, desde março de 2020, estiveram sujeitos a mudanças temporárias de regras e obrigações. A revogação do estado de enfrentamento à crise sanitária acabará definitivamente com a obrigação de as empresas exigirem o uso de máscaras, de afastarem automaticamente trabalhadores com sintomas gripais e de darem prioridade ao teletrabalho para aqueles com mais de 60 anos.
Poderá ainda antecipar o fim do trabalho remoto para gestantes. Até a exigência para que os aplicativos de entrega, como iFood, Rappi e Loggi, sejam obrigados a contratar seguros contra acidentes será revogada.
Passa de 170 o número de portarias do Ministério da Saúde que serão afetadas pela revogação do estado de emergência, que tratam desde regras para compras de insumos, mas que afetam também os regulamentos para os ambientes de trabalho.
Em entrevista coletiva nesta segunda-feira (18), Queiroga disse que uma portaria a ser publicada até o fim desta semana vai formalizar o fim do estado de emergência em saúde. Essa publicação será acompanhada de uma nota técnica que criará, segundo Queiroga, uma transição para normas e leis vinculadas à situação de emergência. "Foi criado um ordenamento jurídico próprio e algumas leis federais perderiam seu efeito", afirmou o ministro da Saúde. "É necessário que elas tenham uma transição."
Segundo Rodrigo Cruz, secretário-executivo do Ministério da Saúde, a portaria interministerial 17, de 22 de março deste ano, que dispensou o uso de máscaras, já foi uma flexibilização possível a partir dos dados epidemiológicos disponíveis, o mesmo parâmetro usado na decisão de encerrar o estado de emergência.
A declaração de emergência foi feita por meio da portaria 188, de 3 de fevereiro de 2020, pouco mais de um mês antes de a OMS (Organização Mundial da Saúde) classificar a contaminação pelo coronavírus como uma pandemia.
Enquanto a medida não for publicada, todas as portarias ou leis vinculadas ao estado de emergência em saúde continuam valendo.
Serei obrigado a voltar ao trabalho presencial?
As opções pelo trabalho remoto, pelo home office ou pela atividade presencial são decisões da empresa e não são afetadas pelo estado de emergência. Apesar de o trabalho fora das dependências da empresa ter sido adotado por mais companhias a partir do início da pandemia, ele não era obrigatório.
As empresas que adotaram o teletrabalho ou modelos híbridos de trabalho precisarão agora formalizar a opção em aditamento contratual, pois, na avaliação da advogada Maria Lucia Benhame, não haverá mais qualquer justificativa para que o modelo fique sem regulamentação.
O que muda quanto ao uso de máscaras?
A portaria interministerial 17, de 22 de março, já tinha acabado com a obrigatoriedade de as empresas exigirem e fornecerem máscaras descartáveis ou de tecido aos funcionários. A obrigação foi mantida apenas em relação aos funcionários com condições clínicas de risco ou com 60 anos ou mais.
As regras dessa portaria estão condicionadas ao estado de emergência de saúde pública e, a menos que a nota técnica prevista pelo Ministério da Saúde defina outros parâmetros, todos os seus artigos perderão a validade.
O professor de direito do trabalho Ricardo Calcini diz entender que, independentemente do fim da eficácia da portaria, a exigência do uso de máscaras em ambientes fechados é uma prerrogativa do empregador. Sem a portaria e sem o estado de emergência, porém, ele acredita que a tendência é as organizações também dispensarem a obrigação, uma vez que a imposição também perde o propósito.
Estou grávida e afastada do trabalho presencial. Serei obrigada a retornar à empresa?
Sim, a empresa poderá exigir o retorno. O afastamento obrigatório das gestantes foi previsto em uma lei alterada recentemente, que manteve o home office ou teletrabalho apenas para aquelas que ainda não estejam totalmente vacinadas. Na avaliação da advogada Maria Lucia Benhame, com o fim o estado de emergência em saúde pública, gestantes terão que voltar ao trabalho, vacinadas ou não.
Se eu tiver sintomas de gripe ou resfriado, não preciso mais ficar afastado?
Não, a menos que a nota técnica do Ministério da Saúde traga alguma nova regra sobre o afastamento de trabalhadores com sintomas ou que tenham tido contato com pessoas contaminadas. Ricardo Calcini diz que as empresas poderão prever parâmetros em seus planos de segurança e saúde.
É mais provável, porém, que passem a valer as regras gerais para licenças médicas, segundo as quais é necessário passar por atendimento médico e, a critério do médico, ficar ou não afastado. Sem o atestado médico, a ausência é considerada uma falta não justificada.
A advogada Cássia Pizzotti, do escritório Demarest, recomenda que as empresas definam protocolos em seus programas de controle de saúde ocupacional, os PCMSO, independentemente da revogação da situação de emergência. Na avaliação dela, ter um conjunto de regras para abordar questões de saúde é um diferencial para evitar novos surtos em ambiente de grande circulação de funcionários.
Alguma lei deixará de valer com o fim da emergência?
Sim, todas aquelas que tiveram sua eficácia vinculada à emergência em saúde pública, como é o caso das grávidas. É também a situação da lei 14.297, que obrigou as plataformas de entrega a contratar seguro e prever uma assistência financeira aos entregadores de moto que atuam por meio delas, em caso de afastamento.
Esse benefício previsto na lei trata de afastamento por contaminação por Covid-19. Ele é pago por 15 dias e pode ser prorrogado por até um mês (45 dias, ao todo) nos casos em que o médico recomendar, por meio de laudo, a manutenção do afastamento. O valor da assistência financeira corresponde à média dos três últimos pagamentos mensais recebidos pelo entregador.
Para a advogada Maria Lúcia Benhame, somente após a publicação da portaria com a revogação do estado de emergência será possível prever quais leis serão afetadas, uma vez que o governo falou em criar uma transição.
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