As novas gerações estão se conectando cada vez mais cedo com a tecnologia. Embora seja benéfica na solução de problemas diários, assim como no mundo real, a internet apresenta uma série de riscos para crianças e adolescentes. Nesse contexto, pais e educadores desempenham um papel fundamental na proteção dos pequenos, seja ficando atento aos sinais, seja adotando medidas para garantir uma navegação segura.
Nos últimos meses, esse debate foi intensificado após a descoberta de crimes praticados por uma plataforma em que havia incitação à automutilação e ao abuso infantil. Um adolescente do Espírito Santo chegou a ser apreendido. Algumas ferramentas on-line também estão sendo utilizadas para estimular ataques a escolas, como o que houve no município de Aracruz, no Norte capixaba, no final de 2022.
Psicóloga da Safernet, Bianca Orrico aponta para um aumento desses registros de violência on-line. Segundo ela, os principais motivos seriam a divulgação de casos, o que chama atenção para o tema, e a democratização da internet, ampliando o acesso em todas as faixas etárias.
A Safernet é uma organização não-governamental que atua desde 2005 na manutenção dos direitos humanos na internet. Entre os eixos trabalhados pela entidade está a ajuda para crianças, pais e educadores que querem saber como proceder diante de uma situação de violência virtual; denúncias; e a educação, que visa a orientar sobre a melhor aplicabilidade da tecnologia no dia a dia.
“Hoje em dia, é como se a internet fosse uma praça pública, cheia de milhões de pessoas. Esses crimes sempre ocorreram, mas a gente sabe que, com os avanços tecnológicos, muitas oportunidades foram geradas. Isso carrega também uma série de riscos. São ameaças que envolvem compartilhamento de dados não autorizados, assédio, cyberbullying, entre outros”, pontua Bianca.
Uma pesquisa da TIC Kids Online Brasil de 2022 revelou que 96% dos usuários de 9 a 17 anos acessam a internet todos ou quase todos os dias. Desses, 33% reportaram ter acontecido alguma coisa na rede que não gostaram, os deixaram ofendidos ou chateados. O estudo também apontou que as redes sociais foram visitadas por 86% dos entrevistados.
“Os dados mostram a dificuldade de ter um ambiente em que a criança possa exercer o seu direito à interação, sem estar submetida a diversos riscos. Tem crescido cada vez mais, por exemplo, o acesso a conteúdos violentos ou extremistas e ameaça de exposição de imagens íntimas — que envolvem, sobretudo, adolescentes”, adverte a psicóloga.
Ainda segundo a especialista, apesar dos pais e responsáveis já estarem de olho no que os filhos consomem na rede, é preciso redobrar a atenção. Isso porque, conforme explica, muitos ainda consideram a internet um espaço seguro.
“O filho está em casa, sentado em frente ao computador, e eles acham que não existe o perigo de ‘receber doces de estranhos na rua’, como antigamente. Mas é exatamente isso o que acontece on-line, só que em outro formato. Quando há alguma violência, eles costumam não relatar por medo de uma repressão e de não poder mais consumir o próprio lazer”, afirma.
Em casos de agressões virtuais, os pequenos podem dar “sinais” de que algo está errado. Quem está perto precisa ficar alerta aos indícios e, caso necessário, buscar ajuda especializada — como de um psiquiatra ou psicopedagogo — para que a criança ou adolescente se sinta acolhido.
“É preciso observar mudança de comportamento repentina, desconexão das atividades escolares, isolamento social, agressividade, mudanças nos hábitos de sono e de alimentação. Há vários indícios importantes de que algo não vai bem”, relaciona Bianca.
A doutora em Educação e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Cleonara Maria Schwartz avalia ainda que outra maneira de impedir essas situações é utilizar ferramentas de controle parental, que prometem auxiliar no monitoramento das atividades na internet. Ela cita o Google Family Link, Qustodio, Safe Kids e Fami Safe como alguns dos principais e mais indicados por especialistas.
Bianca Orrico reforça, entretanto, a importância do diálogo entre as famílias e a garotada como principal ferramenta para interromper o ciclo de violência.
“Quando as crianças são muito pequenininhas, essas ferramentas são úteis, só que elas não garantem o total bloqueio de alguns produtos. Elas são muito espertas, podem até conseguir driblar os apps sem serem notadas. Por isso, [as ferramentas] precisam ser gradativamente abandonadas à medida que forem crescendo. Adolescentes precisam ter privacidade, mas com segurança e responsabilidade”, ressalta.
Na avaliação de especialistas, apesar de as famílias já se movimentarem para garantir essa segurança on-line, qualquer esforço poderá ser em vão se não houver uma contribuição das escolas. É o que constata a mestre em Educação Jane Haddad, que avalia a necessidade de chamar até mesmo a comunidade para procurar novas formas de encarar o assunto.
Coordenadora de Soluções Educacionais do Itaú Social, a pedagoga Cláudia Petri também defende uma inserção desses temas na grade curricular tanto no ensino fundamental, quanto no médio.
“A escola pode promover reflexões, debates junto aos alunos, sempre disseminando informação. Trazer o jovem para uma roda de conversa sobre essas temáticas. Além disso, ajudar também os estudantes no uso responsável das redes sociais e dos aplicativos, como o WhatsApp. E desenvolver projetos também que possam discutir assuntos como fake news”, destaca.
Para ajudar nesse processo, a entidade oferece o curso ‘Prevenção da Violência On-line na Primeira Infância”. De forma gratuita, é possível acessá-lo pelo site da Polo.
“Pode dar subsídio aos educadores, de forma geral, sobre como tratar esse tema em relação aos próprios alunos. É gratuito, possui certificado e oferece materiais de apoio e ferramentas para potencializar o diálogo sobre a construção de rotinas saudáveis frente à tecnologia”, explica Cláudia Petri.
A Safernet também promove uma iniciativa que oferece caderno de aulas e suporte gratuito para professores e estudantes de todo o Brasil. O projeto tem adesão gratuita para escolas públicas, privadas ou secretarias de educação. Basta que a instituição se interesse para que a ONG faça o acompanhamento antes e durante a aplicação. Outros detalhes podem ser conferidos em New Safernet.
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