Carol Duarte faz a jovem Eurídice de A Vida Invisível. Separada da irmã, Guida/Júlia Stocker, pelo pai intransigente, passa o filme sonhando com o reencontro. Desde maio, quando o longa de Karim Aïnouz integrou a seleção oficial do Festival de Cannes - na mostra Un Certain Regard, que venceu -, o cinéfilo tem acompanhado as andanças de A Vida Invisível pelo Brasil e pelo mundo.
O filme teve direito a noite de gala no Teatro Municipal, durante a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e também abriu o Cine Ceará. Além disso, é o representante do Brasil para concorrer a uma vaga no Oscar de melhor filme internacional. Em dezembro sai a longlist, com dez pré-indicados. Já será uma vitória e tanto, pois mais de 90 filmes de todo planeta concorrem à indicação.
Alguns desses longas já estão em cartaz nas salas de São Paulo. São filmes sobre mulheres e três ou quatro realizados por elas (Adam e A Camareira). A Vida Invisível junta-se ao grupo nesta quinta, 21.
O diretor Karim Aïnouz, criado pela mãe, num ambiente predominantemente dominado por mulheres - a avó, mais quatro tias -, quis retratar as mulheres de uma certa geração, oprimidas por homens dominadores, mas que resistem.
Entrevistadas pelo jornal O Estado de S. Paulo, durante a Mostra, Carol e Júlia adotaram o mesmo discurso. "O cinema e a classe artística têm sido demonizados no Brasil, mas em Cannes fomos premiados com A Vida Invisível e Bacurau (de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles)", diz Carol.
"Foi uma coisa muito intensa, mostrou como nosso cinema é relevante, por mais que digam o contrário. Os ataques estão muito fortes e, dependendo do tema, um filme é existência, mas também é resistência. Apesar da tentativa de sucateamento, o cinema brasileiro está fervilhando. A Vida Invisível é a prova", afirma.
Carol veio do teatro, como Júlia Stockler. O audiovisual começa a acontecer em sua vida quando ela interpretou a transexual da novela A Força do Querer, como Ivana/Ivan. Depois veio outra novela, O Sétimo Guardião, e um episódio da série Segunda Chamada. "A experiência com o Karim foi muito vertical", conta.
"Ele gosta de dizer que cinema não é discurso, mas comprometimento com as personagens, então trabalha muito com o elenco. Foram três meses de processo, de filmagem. A Júlia e eu ficamos totalmente imersas nas personagens. Karim não permitia o uso de celular no set, eu deixei de ser a Carol. Todo mundo me chamava de Eurídice. Foi uma imersão muito profunda."
Para Júlia, "o filme possui uma dinâmica social muito grande". "Karim falou muito pra gente da mãe dele, da avó, das tias, dessas mulheres invisíveis, mas guerreiras. No inconsciente dele, essa coisa de discutir as mulheres era muito importante. As mulheres daquela geração, mas numa perspectiva moderna. Quero ver o que as mulheres de hoje vão pensar."
Havia uma questão social, política. Abordar o gênero, mas, ao mesmo tempo, esse gênero era uma linguagem, uma forma. "Ele falava muito de suas referências. Tinha o Douglas Sirk, um europeu que foi para Hollywood e virou um grande diretor de melodramas. Mas o top, para o Karim, era o (Rainer Werner) Fassbinder. Ele reinventou o melodrama como gênero e o Karim mostrou para gente O Medo Devora a Alma, sobre a ligação de uma mulher madura com um imigrante mais jovem."
Durante o processo, e já que as cartas eram essenciais na trama, as duas atrizes foram solicitadas a escrever muitas cartas. Segundo Júlia, "isso ocorreu até o último momento". "Mandei cartas até por áudio de celular para a montadora. Foi um processo muito apurado, cada palavra e intenção foi ensaiada e discutida com o Karim e a assistente de direção (Nina Kopko)."
Mais tarde, depois da Mostra, na abertura do Cine Ceará, Fernanda Montenegro leu a carta de Karim convidando-a para atuar no filme, e dizendo porque sua participação seria tão importante. Quem estava lá garante que foi emocionante.
Fernanda faz a personagem de Carol, a Eurídice, mais velha. Durante todo o filme ela não desiste de encontrar a irmã e aí, no finalzinho... Embora se trate de uma adaptação do livro de Martha Batalha é bom não estragar a surpresa. A presença de Fernanda Montenegro agrega ao final e o filme sobe de voltagem. Como parte do processo, Karim exortou suas atrizes a escreverem a história das personagens que não está na tela.
"O Karim estimulou a gente a criar um diário íntimo. Eu escrevi sobre o que achava que poderia ser a história de Guida na Grécia, com aquele homem", afirma Júlia.
Carol e Júlia não gravavam juntas, não compartilhavam o set e Karim fazia questão de mantê-las distantes. "O trabalho de preparação foi tão bom que, até quando Karim improvisava, ou propunha para a gente coisas diferentes, estávamos preparadas", reflete Júlia. "Como ele queria, as personagens estavam dentro de nós."
Como parte da campanha para o Oscar, o produtor Rodrigo Teixeira está promovendo sessões especiais do filme em Los Angeles. Cada filme tem direito a até 15 sessões - já foram realizadas sete.
Teixeira tem convidado atrizes, não só porque a categoria equivale a 15% dos votantes, mas também porque o tema pode é mais sensível para elas. Ele também conta com o efeito multiplicador dessas opiniões. Penélope Cruz e Isabelle Huppert já viram e gostaram.
O sonho é cravar a candidatura de A Vida Invisível entre os cinco finalistas e ainda colocar a grande Fernanda, que já concorreu a melhor atriz - por Central do Brasil, de Walter Salles - entre as melhores coadjuvantes.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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