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MAM-Rio promove retrospectiva do cineasta Rodrigo de Oliveira

MAM-Rio promove retrospectiva do cineasta Rodrigo de Oliveira

Carioca de nascença, mas capixaba de coração, Rodrigo dirigiu os longas-metragens "As Horas Vulgares", "Teobaldo Morto, Romeu Exilado" , "Todos os Paulos do Mundo" e finaliza "Os Primeiros Soldados"

Publicado em 8 de abril de 2021 às 12:00- Atualizado há 4 anos

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Rodrigo de Oliveira, cineasta carioca radicado no Espírito Santo
Rodrigo de Oliveira, cineasta carioca radicado no Espírito Santo. (Mario Miranda Filho/Agencia Foto)
Gustavo Cheluje
Repórter do Divirta-se / [email protected]

Carioca de nascença, mas capixaba de coração, o realizador Rodrigo de Oliveira ganhou uma retrospectiva de sua cinematografia promovida pela Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio). Até 25 de abril, os cinéfilos podem conferir os seis filmes (três longas e três curtas) do cineasta, em sessões on-line, com transmissão gratuita pelo canal da Cinemateca do MAM-Rio, na plataforma Vimeo.

Amante e mestres como Pier Paolo Pasolini e Phillipe Garrel, Oliveira exprime dos citados realizadores - em seus projetos como diretor - o gosto pelo intimismo, pelo vazio existencial, o silêncio, e pela turbulenta relação do homem com as forças da natureza.

Basta olhar para projetos como "As Horas Vulgares" (2012), baseado na obra de Reinaldo Santos Neves e co-dirigido em parceria com Vitor Graize, elegantemente fotografado em preto-e-branco por Lucas Barbi, e “Teobaldo Morto, Romeu Exilado” (2014), sua primeira direção solo, para constatarmos um realizador inquieto e atento às crises existenciais inerentes ao nosso cotidiano. 

É também de autoria de Oliveira, em parceira com Gustavo Ribeiro, o documentário "Todos os Paulos do Mundos" (2017), sensível retrato da carreira de Paulo José como ator, partindo dos clássicos como "Todas as Mulheres do Mundo" a "Macunaíma". Pelo trabalho, Rodrigo levou o Grande Prêmio Brasil de Cinema de Melhor Documentário, em 2019, o Oscar do cinema brasileiro. 

"Toda retrospectiva é uma tentativa de construir História, e, no caso da minha, o que se carrega junto é o valor de uma geração inteira do cinema capixaba. Até pouco tempo, vivíamos de tentativas quixotescas de bravos realizadores que filmavam quase à revelia da valorização que o Estado e a cultura davam ao cinema", afirmou Rodrigo de Oliveira, em bate-papo com o "Divirta-se" para falar sobre a mostra promovida pelo MAM-Rio.

Além dos longas, o evento contará com a exibição os três curtas do realizador, “Eclipse Solar” (2016), vencedor do Prêmio Canal Brasil de Curtas, “Ano Passado Eu Morri” (2017), que teve estreia no Festival de Brasília, e “Os Mais Amados” (2019), lançado no Festival de Vitória. 

A sessão “O Cinema de Rodrigo de Oliveira” também terá um debate com a presença do realizador, no próximo dia 15, às 16h, com transmissão pelo YouTube e Facebook. Mediada pela pesquisadora capixaba Kênia Freitas, a mesa contará com a presença de parceiros frequentes do cineasta, como o ator Romulo Braga, o fotógrafo Lucas Barbi, o montador Luiz Pretti e o produtor Vitor Graize

Abaixo, veja trechos da conversa de Rodrigo de Oliveira com o "Divirta-se":

O que a retrospectiva promovida pelo MAM-Rio representa para a sua carreira e também para o cinema capixaba?

  • Toda retrospectiva é uma tentativa de construir História, e, no caso da minha, o que se carrega junto é o valor de uma geração inteira do cinema capixaba. Até pouco tempo, vivíamos de tentativas quixotescas de bravos realizadores que filmavam quase à revelia da valorização que o Estado e a cultura davam ao cinema. Hoje, existe de fato uma geração, profissional e atuante, apoiada por políticas públicas, com eco da universidade e do mercado, tendo projeção nacional e internacional. Isso diz muito sobre o caminho que se cumpriu. Minha retrospectiva é a primeira desse tipo numa instituição como o MAM, mas certamente não será a última.

O seu trabalho como cineasta é sempre marcado por narrativas intimistas, com personagens em contato com a natureza, buscando sua essência. Essa sensibilidade vem de um resgate do seu trabalho como crítico de cinema, especialmente em sites como Contracampo e Cinética?

  • Ter entrado no cinema através da crítica marca profundamente a minha experiência na realização. Me orgulho de fazer filmes modernos, na tradição de modernismo que ficou interrompida pelo governo Fernando Collor (no início da década de 1990) com o fim da Embrafilme. Essa tradição, inclusive, o movimento de retomada da produção nacional não soube aproveitar: o cinema dos velhos mestres do Cinema Novo e do Cinema Marginal, que tiveram suas carreiras sustadas. Sabe-se lá o que teriam realizado se a indústria tivesse se recuperado nos mesmos termos. Essa consciência é a do estudante de cinema brasileiro, do crítico que se debruçou sobre a nossa história. Eu faço filmes no Espírito Santo, e a história do cinema brasileiro é onde eles vão morar quando saem de mim: é fundamental que os filmes conversem e tentem expandir essa história.

Cena do intimista longa-metragem  “Teobaldo Morto, Romeu Exilado”, primeiro projeto solo de Rodrigo de Oliveira
Cena do intimista longa-metragem “Teobaldo Morto, Romeu Exilado”, primeiro longa-metragem solo de Rodrigo de Oliveira. (Pique-Bandeira Filmes)

"As Horas Vulgares" (2012) foi um dos seus primeiros contatos com o mercado do audiovisual do país, visto que o filme chegou a ter distribuição pela Petrini Filmes. "Horas", inclusive, é um resgate de uma produção capixaba que ficou muitos anos estagnada...

  • "Horas" foi filmado em 16mm e finalizado digitalmente, em um momento em que o mercado ainda estava entendendo a chegada do digital. Sem o suporte digital, não teríamos como lançá-lo. O projeto foi o começo da retomada tardia do cinema capixaba, sendo o primeiro longa-metragem com financiamento público em 16 anos. Sobre ele, pesavam as esperanças de uma geração inteira que não conseguiu filmar nesse formato. Não é incomum ouvir que esse foi o primeiro filme capixaba que alguém de fora assistiu. A gente gostava dessa responsabilidade: a de levar o Espírito Santo para fora daqui, mas também a de fazer um filme profundamente capixaba, porque isso era necessário. 

Você venceu o Oscar do cinema brasileiro - o Grande Prêmio Brasil de Cinema - com o documentário "Todos os Paulos do Mundo". Como foi resgatar a carreira de um ator tão múltiplo e marcante na dramaturgia nacional, como Paulo José?

  • O encontro com Paulo José foi transformador, porque me tirou da teoria sobre o cinema brasileiro e me colocou nos braços da própria história viva dele. Estar com Paulo é estar com uma ideia de Brasil que está minguando, mas que tem uma força incrível de resistência, de amor e de verdade sobre o país real. Imagina o luxo de ter nas mãos os filmes com Paulo José e poder, como diretor e montador, cortar de um plano incrível do Joaquim Pedro de Andrade para outro do Domingos Oliveira, e colocar por cima uma voz do Paulo gravada pelo Walter Hugo Khouri?

Você nunca escondeu o entusiasmo com o cinema capixaba. Dos novos talentos da terra, alguém que se destaque?

  • As novas gerações me estimulam muito, inclusive no sentido de me aproximar e trabalhar junto. Eu sempre aguardo pelos filmes novos de Carol Covre, Daiana Rocha, Diego Zon, Anderson Bardot e Diego de Jesus, entre muitos outros.

Independente da pandemia da Covid-19, vivemos uma fase de desmonte das políticas públicas no Brasil para o setor cultural. Não temos Ministério da Cultura, por exemplo, e nem uma secretaria disposta a trabalhar efetivamente nos "gargalos" do nosso audiovisual, especialmente no que tange à distribuição. Como fazer cinema no Brasil sem esse apoio das instâncias públicas?

  • A cultura é um direito inalienável do povo brasileiro e não existe cultura que não venha do próprio povo. O Espírito Santo é um dos poucos lugares no Brasil onde ainda se pode sonhar com cinema, nos termos modestos que temos. Mas o tempo em que o cinema brasileiro podia ser encerrado com uma canetada já passou. Há muita luta ainda pela frente, mas vejo uma classe unida em torno de um valor inquestionável: o cinema é uma indústria sustentável, que gera empregos e devolve dinheiro à economia de modo muito mais direto e eficiente que outras indústrias maiores.

Rodrigo de Oliveira nos bastidores de seu novo longa rodado em Vitória,
Rodrigo de Oliveira nos bastidores de seu novo longa rodado em Vitória, "Os Primeiros Soldados". (Felipe Amarelo)

Seu novo longa-metragem, "Os Primeiros Soldados", está em fase de finalização. Já pode nos atualizar sobre o lançamento, que foi rodado em Vitória?

  • "Os Primeiros Soldados" aborda uma questão delicada e fala sobre três pessoas da comunidade LGBTQIA+ de Vitória que descobrem viver com o vírus HIV, no estouro da crise da AIDS no começo dos anos 1980, quando a doença ainda sequer tinha nome. O elenco é encabeçado por Johnny Massaro, pela grande atriz trans paulista Renata Carvalho e por um elenco enorme de talentos capixabas. Filmamos no final de 2019, em locações entre Vitória e Domingos Martins, e sonhamos com um lançamento no segundo semestre de 2021 ou assim que a vacina nos permitir.

“O CINEMA DE RODRIGO DE OLIVEIRA”

PROGRAMAÇÃO

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