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'Escrever música é como conversar com psiquiatra', diz Paul McCartney

'Escrever música é como conversar com psiquiatra', diz Paul McCartney

O ex-beatle se apresenta no próximo mês no Allianz Parque (São Paulo) e Curitiba

Publicado em 20 de fevereiro de 2019 às 21:57

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Paul McCartney. (Reprodução/Instagram @paulmccartney)

Paul McCartney volta ao Brasil para três shows em março. O ex-beatle se apresenta nas noites de 26 e 27 de março no Allianz Parque (São Paulo) e segue para Curitiba, onde sobe ao palco do estádio Couto Pereira em 30 de março.

Os ingressos para a primeira data estavam esgotados, mas a organização liberou um lote extra. Também há entradas para o show extra na capital paulista e para o evento de Curitiba. Os preços variam de R$ 130 a R$ 890 e estão disponíveis no site da Tickets for Fun.

Paul vem com a turnê Freshen Up Tour para promover o álbum “Egypt Station”, lançado em setembro de 2018.

O novo trabalho conta com 16 faixas. Segundo ele, escrever música é como conversar com um psiquiatra, um terapeuta.

Entre as canções, há a "Who Cares" em que Paul versa sobre bullying e consequências para as pessoas. "Nos meus tempos de escola, seriam apenas valentões e as pessoas implicando umas com as outras", diz. "Eu sei que isso acontece em todo o mundo com milhões de pessoas. Então o que eu queria era tentar ajudar, dar algum tipo de conselho."

Já a dançante "Back in Brazil" foi pensada durante turnê no país, em um dia livre quando ele estava sentado ao piano no quarto do hotel. A música apresenta uma história que Paulimaginou sobre dois jovens brasileiros que tentam se encontrar.

No disco, Paul ainda fala sobre temas atuais e políticos. É o caso de "Despite Repeated Warnings" (apesar de repetidos avisos), em que trata do aquecimento global. "É uma história como o Titanic. Tem um capitão louco, maluco, e tem todas as pessoas no barco que sabem que ele está errado. É muito simbólico do que está acontecendo em algumas áreas da política", afirma. "É uma produção que tenta lembrar as pessoas de que a mudança climática não é uma farsa."

Já "People Want Peace", o britânico relembra uma de suas passagens pelo Oriente Médio e momentos de conflitos e guerras. "Nós tocamos em Israel há alguns anos. Mas eu queria ir à Palestina antes, porque estava muito consciente da situação política da região. Não queria que parecesse que eu estava ignorando a Palestina e tomando partido de Israel", relembra. Quando perguntava às pessoas o que elas queriam, Paul relata a resposta: "Viver em paz."

Abaixo, veja comentários e explicações de Paul McCartney sobre a origem de todas as músicas de “Egypt Station”:

1. Opening Station

Quando decidimos que íamos chamar o álbum de “Egypt Station”, gostei da ideia de fazer uma montagem de sons, como em uma estação. Então nós encontramos uma estação e então adicionamos mais uma —os efeitos sonoros de estações reais— e começamos a criar e adicionar alguns pequenos ruídos para torná-la uma paisagem de sonhos. A ideia era que a música emanasse desse de local de sonho.

Eu escrevi essa música depois de passar por um período difícil. Nada muito sério ou algo do gênero – apenas um daqueles dias em que as pessoas s perguntam: “Meu Deus, o que estou fazendo errado aqui?”. E às vezes essa é uma boa maneira de escrever uma música —porque você está vindo da sua alma. Costumamos dizer que escrever uma música é como conversar com um psiquiatra ou com um terapeuta —mas você está dizendo tudo em uma música, e não em uma sala de um especialista. Então foi assim —eu apenas pensando nos problemas e colocando tudo em uma música.

Esta é uma espécie de música de recordação. Estou me imaginando, provavelmente nos anos 60, indo a uma festa, vendo alguém e pensando: ‘Ah, agora, tudo bem… Como eu puxo um papo aqui?’. É uma música de fantasia sobre um cara vendo alguém e pensando: ‘Oh, nós deveríamos tentar encontrar um lugar para ficarmos sozinhos, batermos um papo, e coisas assim. Ei, parece que você me deu um sorriso que dizia que queria muito mais do que só uma conversa…’. Então é essa ideia: você vem até mim ou eu vou até você?

Eu estava de férias, tocando meu violão, pensando nos dias em que eu tinha muito tempo livre. Eu costumava ficar por aí, sem fazer nada o dia todo, bem de bobeira… Ocupado sem fazer nada! Então eu peguei esse riff no violão e as palavras vieram para mim: ‘Eu costumava ficar o dia todo largado, eu ficava chapado, eu costumava ficar perdido, mas hoje em dia não…’ É uma canção sobre crescer. Você sabe que há um período em sua vida —ou na vida de algumas pessoas— quando elas não estão sendo tão produtivas, organizadas ou disciplinadas como poderão ser no futuro? Isso foi basicamente isso.

Eu estava pensando em uma música onde você realmente está falando com as pessoas que podem ouvi-la. E no meu caso eu estava imaginando jovens fãs —ou apenas jovens em geral— que poderiam estar passando por algum tipo de problema em seu meio. Hoje em dia seria bullying na internet, trollagem e tudo mais. Nos meus tempos de escola, seriam apenas valentões e as pessoas implicando umas com as outras. Eu sei que isso acontece em todo o mundo com milhões de pessoas. Então o que eu queria era tentar ajudar, dar algum tipo de conselho. A música pergunta: ‘Você já se cansou de pessoas intimidando você? As pessoas falam os seus nomes, fazem uma série de coisas ruins? Isso já aconteceu com você? Bem, quem se importa?’ E então, há uma reviravolta no final do refrão: ‘Quem se importa? Eu me importo.’

6. Fuh You

Certas músicas são escritas antes das sessões de gravação. Outras você compõe no estúdio, quando ideias vão aparecendo. Nesta música, eu estava no estúdio com Ryan Tedder, e o resto do álbum foi feito com Greg Kurstin. Mas nesta canção estávamos apenas pensando em ideias e pequenas melodias e acordes, e a música foi se juntando pouco a pouco. Então fui trabalhar para dar mais sentido na história. Um pouco assim: ‘Vamos, amor, agora fale sobre você, diga a verdade, me deixa conhecer você… Eu quero saber como você se sente, você me faz querer sair e roubar algo… Eu só quero isso para você’. Então essa foi a ideia base de tudo. É uma espécie de canção de amor, mas uma canção de amor atrevida. Então, lá vai você: “Fuh You”.

Eu estava em casa, olhando no canto, onde estava apoiado meu velho violão Martin. E geralmente ele fica lá, e quando eu sentir vontade de tocar, é só pegar e começar, tentar escrever uma música ou qualquer coisa. E eu pensei comigo mesmo: ‘Ultimamente não tenho tido tempo para tocar…’ Lembrei-me de que quando tocávamos violão muitos anos atrás, os instrumentos eram como nossos amigos. Um confidente. Você ia para um canto, escrevia uma música, e quase contaria seus problemas ao seu violão. Então essa é uma canção de amor para o violão. Eu contei para ele todas as pequenas coisas secretas —e, de fato, ao contrário dos meus outros supostos amigos, você ficou ao meu lado enquanto eu lutava. Assim o violão se tornou o símbolo de companheirismo, um amigo, um confidente.

Nós tocamos em Israel há alguns anos. Mas eu queria ir à Palestina antes de ir para Israel, porque estava muito consciente da situação política da região. Eu não queria que parecesse que eu estava ignorando a Palestina e tomando partido de Israel. Então eu fiz arranjos para atravessar para a Palestina, ir para uma pequena escola de música, apertar a mão das crianças e ouvi-las tocando música. Queria mostrar minha solidariedade com o povo palestino. Então voltei para Israel e encontrei algumas pessoas legais de um grupo político chamado One Voice. A ideia toda era uma verdadeira missão de paz. Porque essas crianças —e por crianças, quero dizer jovens adultos— eram ótimas. Eu perguntei: ‘O que você quer fazer?’ E eles disseram: ‘Tudo o que queremos fazer é viver em paz, criar nossas famílias e poder continuar nossas vidas em paz’. Isso está ligado a algo de quando eu era criança. Eu perguntei ao meu pai: ‘Nós estamos vendo todas essas guerras, nos jornais e na TV… As pessoas querem paz, ou elas apenas gostam de lutar?’ E ele me disse muito calmamente: ‘Não, não, filho. As pessoas querem paz. São os políticos e os líderes que entram em guerras. Não são as pessoas’. Isso sempre me pareceu uma ótima explicação.

9. Hand in Hand

Às vezes, as músicas vêm à sua cabeça tarde da noite. Eu tenho um piano em casa —na verdade, é muito especial para mim porque é o piano antigo do meu pai. Eu estava sentado lá uma noite e comecei a encontrar esses acordes que se tornaram o começo de ‘Hand in Hand’. É basicamente uma música de amor. Enquanto escrevia, estava imaginando que eu e Nancy passávamos pela vida de mãos dadas. Foi escrito nos primeiros estágios do nosso relacionamento. Então eu pensei: ‘Sim, bem, isso parece com um monte de gente.’ Há milhões de pessoas nessa situação: eles têm alguém que amam e querem passar pela vida de mãos dadas, uma grande parceria e tal. A gravação foi muito legal: era a banda e duas mulheres violoncelistas. Foi muito bacana, porque no final de tudo uma delas falou: ‘Sabe de uma coisa? Vou me casar pela segunda vez e estou um pouco nervosa. Mas essa música me fez pensar que vai dar certo. ‘E eu pensei: É isso!’ Você sabe que existe razão perfeita para escrever essa música.

Uma das coisas interessantes sobre as músicas é que elas geralmente vêm de algo que acontece em sua vida. A música é sua reação. Pode ser algo muito pequeno, como uma discussão com alguém e você sai e pensa: ‘Eu vou tocar guitarra por um tempo, sair dessa, superar isso…’ E essa música começou assim. Foi apenas uma música sobre pessoas, sobre como as coisas estão realmente bem, mas nem sempre parecem estar bem. Então eu tenho essa imagem de dominó. Você sabe quando as pessoas alinham os milhões de dominós e depois soltam o primeiro e ele passa por toda essa sequência? Para mim representa a vida, como uma pequena ação pode ter um efeito tão grande nessa imensa fila de dominós. É uma música muito pessoal, na medida em que, apesar de todos nós passarmos por tudo isso, mesmo que todos esses dominós caiam, a vida continua. E, de fato, no final, fica tudo bem.

Eu estava no Brasil em turnê. Foi um daqueles dias livres, sem nada planejado. E eu tinha um piano no quarto do hotel. Eu pego um pequeno som e vem essa história no Brasil com essa garota que sonha com um futuro, com um mundo muito melhor. Ela conhece um rapaz perfeito para seu plano de vida —então agora é uma história sobre um casal. As coisas estão indo bem e, em seguida, ela planeja um encontro, mas acontecem algumas coisas: ele não pode ir porque está trabalhando até tarde. Era apenas uma história de ficção de dois jovens brasileiros, mas como é um pouco dançante, eu queria colocar ritmos e sabores brasileiros.

Esta é uma expressão que meu pai costumava dizer. É engraçado, você sabe: à medida em que envelhece, você se lembra de coisas que seus pais, ou talvez seus professores ou amigos, disseram muito tempo quase como um slogan. E o grande slogan do meu pai era: ‘Bem, faça agora’. Você diria: ‘Eu faço isso depois…’ E ele responderia: “Não, faça agora”. Na verdade, ele costumava dizer: ‘D.I.N.’ (Do It Now). Sempre achei que a D.I.N. seria um ótimo nome para uma gravadora. Então, de qualquer maneira, essa coisa do “faça agora” sempre esteve na minha cabeça, e eu estava procurando uma ideia para escrever uma música com isso. E comecei a imaginar: ok, estou em uma jornada. Fui convidado para ir a algum lugar e, se não fizer isso agora, talvez nunca chegue a esse lugar. Basicamente a música é uma jornada imaginária, sugerida pelo fato de que meu pai teria dito: ‘Vá nessa jornada agora. Não deixe até que seja tarde demais. Faça isso agora.’

Algumas vezes eu entro no meu estúdio com meu engenheiro, Steve Orchard, e começamos a inventar coisas. Nós simplesmente não temos ideia do que vamos fazer, mas vamos brincar com as coisas que nos interessam. Eu poderia começar com uma ideia na bateria eletrônica, depois colocar um pequeno piano nela, ou colocar um baixo, e então talvez cantar algumas coisas. Estávamos assim um dia e começamos a fazer essa música. Eu estava tocando algo com o Auto-Tune que eu estava familiarizado e trabalhando com o Kanye. E pensei: ‘Vamos dar uma chance a isso…’ De certa forma, é um pouco sacrilégio falar assim. Mas então comecei a pensar: ‘Você está brincando comigo?’ Ouça alguns discos dos Beatles, como ‘Tomorrow Never Knows’. Nós nunca pensamos que algo era tão sagrado. Então começou como ‘She’s a Rock’, mas depois começamos a nos referir a ela como ‘Caesar Rock’, porque estávamos nos divertindo. E então apenas construímos isso. Eu gosto dessa música porque é um pouco estranha. Você sabe que é uma música onde vale tudo. E é exatamente disso que eu gosto. Um grupo de pessoas estava no estúdio, alguns dos engenheiros, parceiros, e eu disse: ‘OK, vamos lá, todos nós vamos entrar e ser esse grande coral’. É desse final que eu mais gosto. Então, sim, ‘Caesar Rock’ foi um com o qual nos divertimos muito…

14. Despite Repeated Warnings

Eu estava no Japão, lendo jornal, o Tokyo Times ou o Japan Times ou algo assim, e havia algo sobre mudança climática. É típico, você sabe, a maneira como as pessoas não estão fazendo nada sobre isso. Essa ideia de: ‘Tudo vai ficar bem, não se preocupe…’ Ah, sim, claro. Há icebergs derretendo, mas isso não importa, porque não está derretendo em Londres, então não precisa se preocupar… Essa frase estava no artigo: ‘Apesar dos avisos repetidos, eles não estão ouvindo…’ Eu pensei: ‘Ah, sim, isso resume o sentimento de muitas pessoas’. Minha ideia foi fazer uma música usando esse simbolismo. Uma pessoa será um símbolo de certos políticos que argumentam que a mudança climática é uma farsa —e nós conhecemos alguns deles… Pensei: ‘OK, é um capitão de mar, e ele está pilotando um barco, e ele vai em direção ao icebergs. Ele foi avisado, mas ele está indo porque acha que está certo, e todos estão fazendo muito barulho disso. Os argumentos usuais, sabe? É uma história como o Titanic. Tem um capitão louco, maluco, e tem todas as pessoas no barco que sabem que ele está errado. É muito simbólico do que está acontecendo em algumas áreas da política. Essa é uma daquelas músicas, como ‘Band On the Run’ ou ‘Live and Let Die’, que é meio marcante. É uma produção épica que está realmente tentando lembrar as pessoas que a mudança climática não é uma farsa – e que devemos evitar ter um capitão louco nos guiando para os icebergs.

Esta é uma continuação da paisagem sonora de abertura, e isso nos leva de volta à estação imaginária. Eu gosto da ideia de que é uma estação de trem ou uma estação de rádio. Então nos divertimos inventando uma paisagem sonora. Depois, no final, pensamos: ‘Bem, seria uma boa ideia, nesta grande estação, ouvir vagamente alguém ligando uma guitarra, como um músico de rua tocando algumas músicas e ganhando algum dinheiro’. Então você o ouve plugar e toca um riff como o começo de uma de nossas novas músicas, ‘Hunt You Down’. Então ele toca e gradualmente fica mais alto até se tornar a música real.

Esta é uma música de três partes que começa bem roqueira, ‘Hunt You Down’. As palavras são apenas: ‘Eu não consigo encontrar meu amor, não importa o quanto eu tente…” Você sabe, o velho tipo de letra de blues ‘reclamando’. Então, eu estou me divertindo com isso e fazendo esse rock’n’roll, e isso se tornou ‘Hunt You Down’. Em seguida, passa para outra música chamada ‘Naked’. Novamente, ele se conecta porque há uma mudança de andamento no final de ‘Hunt You Down’. Vai de 4/4 para 3/4, e para essa outra música, muito simples que gravei sozinho, sobre como ‘estou nu desde que nasci’. A ideia é que passamos por essa vida, que todos passam. De certa forma, há muitas situações pelas quais você passa e, bem, você está pelado. Socialmente, você pode se sentir nu – aquela sensação de “eu não sei como lidar com isso!”. E então há a conexão com outra canção que chamamos de ‘C-Link’ – apenas eu me entregando totalmente a querer tocar guitarra. A versão original tinha cerca de 11 minutos de duração. Mas sou somente eu tocando… As pessoas costumam perguntar: ‘Por que você ainda faz isso?’ E a resposta é que eu ainda estou feliz de ter o privilégio de poder subir para um amplificador, ligá-lo, pegar meu violão, ligá-lo e tocar muito alto. E tinham algumas pequenas frases de blues que eram mais melódicas do que outras, e isso sugeria outra coisa. Então orquestramos algumas das frases, fizemos um pouco mais de composição – uma ideia que eu imaginava fazer há muito tempo, apenas ter alguém para tocar blues com uma orquestra, e os acordes. Nesse caso, era C e, em seguida, C menor. A orquestra apenas segurando esse acorde para sempre e sempre e então esta guitarra tocando por cima. E assim termina o álbum. Bem no final da sessão, eu estava me divertindo tanto gritei e ficou gravado no álbum ‘Woo!’ E é isso, a Egypt Station.

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