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Artistas protestam para que cada 'play' pague um centavo de dólar no streaming

Artistas protestam para que cada 'play' pague um centavo de dólar no streaming

Sem renda de shows, eles também querem que a lógica dos pagamentos seja centrada no usuário

Publicado em 22 de março de 2021 às 12:25- Atualizado há 4 anos

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Fone de ouvido, música
Fone de ouvido, música. (StockSnap/Pixabay)

Uma pesquisa divulgada pela firma Alpha Data revelou que 1% dos artistas mais ouvidos no mundo responde por 90% das audições totais nos serviços de streaming.

A informação veio a público no ano passado, quando a pandemia já havia deixado sem renda de shows os músicos no planeta. Sem uma previsão de retorno, esses profissionais dependem mais do que nunca da remuneração da música gravada, o que hoje significa dinheiro do streaming.

Mas, se os artistas nunca acharam justa a remuneração dessas plataformas, agora a tensão está mais evidente. Na semana passada, músicos e profissionais da indústria se reuniram em frente a sedes do Spotify em grandes cidades de cinco continentes, incluindo São Paulo.

O que eles pedem? Que a lógica dos pagamentos seja centrada no usuário, e não na plataforma. E que o preço pago por cada "play" seja elevado até chegar a US$ 0,01. Isso mesmo, um centavo de dólar --ou cerca de R$ 0,05.

Segundo um estudo do Trichordist, o mais citado por especialistas, o Spotify paga em média US$ 0,00348 por "play", a Apple Music dá US$ 0,00675 e o YouTube paga US$ 0,00154.

"O modelo atual, contra o qual muitas vozes têm se levantado, tem o mérito da simplicidade", afirma Carlos Mills, presidente da Associação Brasileira de Música Independente, a ABMI. "Você tem uma piscina dos valores arrecadados todo mês. Você pega isso, deduz as taxas e divide proporcionalmente à quantidade de execuções de cada artista. Então, o dinheiro é proporcional à popularidade."

Hoje, diz Mills, se o mercado de música gravada está recuperado, é graças ao streaming. "A indústria fonográfica ficou 15 anos perdendo. Foi mais de US$ 1 bilhão por ano."

Mas, se as gravadoras se recuperaram e os independentes produzem mais e melhor, os shows historicamente sempre foram a maior renda dos músicos. Com a pandemia, os olhos estão nas plataformas.

O movimento Union of Musicians and Allied Workers, ou UMAW, que fez as manifestações contra o Spotify e inclui gente como Thurston Moore, ex-Sonic Youth, tem quase 30 mil assinaturas. Segundo eles, a plataforma "triplicou de valor na pandemia, mas não aumentou suas taxas para uma fração de um centavo".

O CEO do Spotify, Daniel Ek, botou a culpa nos artistas. "Você não pode gravar música uma vez a cada três anos e achar que isso é suficiente", ele disse, em agosto do ano passado, e acabou criticado por artistas nas redes sociais.

Mas a conta do pagamento médio, essa de frações de centavo, não é simples. Segundo estudo do SoundCloud, plataforma popular entre independentes, os fatores para determinar o preço de um "play" são e tão variados --geográficos, se os ouvintes pagam ou não, moedas-- que a transparência é comprometida.

Isso porque o modelo de remuneração é calculado a partir da plataforma --e não do usuário. Hoje, o Spotify recebe cerca de 10 mil novas músicas por dia, além dos usuários. Então, se um artista mantém sua quantidade de execuções mensais, o crescimento da totalidade de músicas e usuários da plataforma faria com que a remuneração fosse sendo gradativamente diluída a frações ainda menores.

A tese do estudo casa com o que disse Daniel Ek, do Spotify. Um artista precisa lançar novas músicas --ou aumentar a audiência das velhas-- para manter a remuneração.

O SoundCloud vai lançar em abril um modelo centrado no usuário --um dos pedidos do UMAW. Nesse formato, o músico recebe um valor proporcional ao tempo gasto pelos fãs ouvindo sua música, o que independe do total de usuários e artistas da plataforma.

A empresa quer aumentar em mais de 200% a remuneração em alguns casos. Mas, diz Mills, não existe bala de prata.

"O modelo 'user-centered' já vem sendo discutido há tempos, há estudos acadêmicos aprofundados sobre isso. A Deezer começou a fazer testes na França. Uma coisa que posso afirmar é que esse modelo iria melhorar para alguns, e piorar para outros, mas não resolver o problema, que é pessoas ganhando centavos."

De maneira geral, esse modelo tende a diminuir o abismo entre os Drakes e Marílias Mendonças e a massa de médios e pequenos. Gêneros e artistas de nichos --o tipo que usa o SoundCloud-- também tendem a ganhar no formato.

O produtor e DJ Antconstantino ganhou em três anos cerca de US$ 40 somando tudo que recebeu nas plataformas de streaming. No Spotify, ele publica músicas e remixes desde 2019 e tem quase 5.000 ouvintes mensais, um número baixo, mas não irrelevante.

Antconstantino começou a experimentar em outro canal, o Bandcamp, também popular entre independentes. Na pandemia, a empresa vem fazendo uma ação em que, uma sexta por mês, abre mão de suas taxas para repassar tudo que arrecada aos artistas.

Além disso, o artista pode determinar quanto cobra por música ou disco ou deixar que os fãs paguem quanto quiserem. "Isso acontece em diversas cenas, no exterior eles usam muito. Comecei a usar, botei tudo no 'pague quanto quiser'. Só nisso, ganhei uns US$ 100 rápido."

O DJ não saiu do Spotify, mas faz campanha para que fãs ouçam --e, se possível, paguem-- no Bandcamp. "O Spotify ajuda a expandir, a entrar em playlist. Mas, no meu caso, só serve para isso. Dinheiro chega em migalhas. Quem é menor deve ganhar é nada."

Plataformas mainstream são "as maiores prateleiras do mundo", argumenta Mills. Segundo ele, os modelos de SoundCloud e Bandcamp funcionam só para artistas médios e pequenos que tenham fãs --caso de Antconstantino.

Enquanto os 99% lutam pela sobrevivência longe dos palcos, é provável que o sonho do centavo ainda siga distante. Até porque há pouco interesse em mudanças por quem um dos lugares do topo --grandes gravadoras, plataformas e astros.

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