Mulheres como Elizabeth Bennet, do clássico “Orgulho e Preconceito” conquistaram os corações dos leitores. Nos romances de época produzidos na atualidade, a personalidade forte e uma postura a frente de seu tempo por parte das protagonistas, características da personagem criada pela britânica Jane Austen, se tornaram quase um denominador comum nas publicações. Autoras que fazem sucesso recentemente, como Sarah MacLean, têm esse elemento como ponto marcante de sua narrativa.
Pensando na explosão de obras do gênero e na relação do mesmo com a temática feminista, ao propor figuras que vão contra o padrão social de comportamento da época em que se situam, conversamos com as autoras Karina Heid e Tatiana Mareto.
Ambas best-sellers na Amazon, as capixabas que já falaram sobre seu sucesso em entrevista anterior ao Divirta-se, agora contam sua percepção sobre como os papéis femininos são desenvolvidos no romance de época.
Tatiana conta que escrever romances, especialmente de época, na atualidade é como andar na corda bamba para entregar histórias apaixonantes e protagonizadas por personagens fortes, independentes e conscientes, sem que isso as transforme em caricaturas. “É atender aos desejos e sonhos das leitoras que consomem romances e mostrar a possibilidade de relacionamentos pessoais sem violência, sem abuso e sem submissão”, completa.
Autora de Cachoeiro e Itapemirim, Mareto afirma que tenta escrever personagens masculinos que não propaguem um machismo exacerbado, comum para a época em que vive suas "heroínas", como Lady Eckley, da saga “Amores em Kent”. “Pensando no contexto em que vivemos, decidi que arriscaria escrevendo uma mulher como ela - imperfeita, porém dona de sua liberdade.”, comenta sobre a protagonista.
Nesse sentido, a escritora também pontua que está em constante conflito com a feminista que escreve romances que enaltecem o mito do amor romântico, ela mesma. Mas, afirmando observar para os romances de época com um olhar revolucionário e pontuando que por muito tempo sequer eram considerados literatura, ela destaca: “Se olharmos a Amazon Brasil, a categoria de mais vendidos na Loja Kindle (e-books) conta com um número significativo de romances femininos, o que sugere um fenômeno: muitas mulheres escrevendo para outras mulheres. Eu gosto disso. A literatura feminina é uma forma de subversão do status quo.”
Karina Heid, por sua vez, conta que chegou a se perguntar porque estava voltando ao passado em suas narrativas, visto que este é marcado por tanto ódio às mulheres e um machismo repressor. E acabou chegando a uma conclusão: “Entendi que era muito bom reescrever esse passado, ou seja, trazer uma mulher forte, fora dos padrões, numa época em que nós fomos silenciadas. É como se fosse uma pequena revanche”.
A escritora ainda acrescenta que a questão do gênero sempre acaba entrando em cena nos romances de época, no sentido de o escritor questionar uma regra, uma norma da época descrita em seu enredo.
Visto que a tensão de gênero se faz presente e assim surgem protagonistas que não se enquadram nos padrões das épocas descritas neste tipo de literatura, um desafio se faz presente: tornar crível algumas atitudes dessas personagens à frente de seu tempo. Para Mareto, esse é um ponto especialmente sensível na produção de romances de época.
“Nós sabemos que as rebeldes e as revolucionárias sempre existiram, mas elas eram enforcadas, presas, martirizadas, sofriam abusos físicos e psicológicos e eram excluídas da sociedade. Então, penso que a grande dificuldade de trabalharmos uma mulher muito 'desconstruída' nesse período é você dar as consequências que ela sofreria”, pontua, afirmando que tenta trazer esses desdobramentos para oferecer credibilidade às histórias de suas personagens.
Heid, autora da saga "Damas de Aço", acrescenta outro aspecto ao debate. “Quando você vai escrever um personagem, não importa se ele está no período paleolítico, se vive na Inglaterra Vitoriana, em um futuro distópico ou em uma fantasia, as pessoas que estão lendo só se interessam por questões humanas que elas conseguem se identificar”, reflete.
Vale destacar um ponto que chama a atenção nos livros de época: a sexualidade feminina, constantemente reprimida ao longo da história em diferentes sociedades. Karina comenta que os romances oferecem às leitoras uma oportunidade de debate sobre o assunto, considerado tabu.
“Uma das formas de controle sobre as mulheres era a sexualidade, uma forma de controle real sobre corpos e mentes femininas. Quando uma mulher rompe uma barreira, tanto no sentido de se encontrar como ser sexual, quanto no de aceitar que ela pode ter prazer naquele encontro, isso é uma grande ruptura”, acrescenta Tatiana a respeito dos romances de época.
Para que os leitores possam refletir sobre as questões pontuadas na matéria, selecionamos cinco romances femininos de época. Confira a lista:
O nome da personagem da saga "Amores em Kent" é Lady Eckley, e não Lady Ecley, como informado originalmente pela reportagem. O texto foi alterado.
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