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Crítica: 'Green Book' suaviza narrativa para falar de racismo

Crítica: "Green Book" suaviza narrativa para falar de racismo

Um dos principais concorrentes ao Oscar 2019, filme estrelado por Viggo Mortensen e Mahershala Ali

Publicado em 23 de janeiro de 2019 às 23:55

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Mahershala Ali como Dr. Donald Shirley e Viggo Mortensen como Tony Vallelonga. (Universal Pictures)

Há algo especial em “Green Book – O Guia”, que estreia hoje nos cinemas do Estado: a sensação de aconchego que causa no espectador. Vencedor de três Globo de Ouro (Filme Comédia ou Musical, Ator Coadjuvante e Roteiro) e do prêmio principal do PGA, o filme chega ao Oscar com cinco indicações e como um dos favoritos para o prêmio de Melhor Filme em um ano em que não há um favoritaço na categoria.

Dirigido por Peter Farrelly (“Débi & Loide” e “Quem Vai Ficar com Mary?”), o filme obviamente é um desvio da filmografia do diretor. “Green Book” é divertido, mas não é uma comédia, e nem deveria ser.

O filme se passa em 1962, época em que ainda havia segregação racial no Sul dos EUA, ou seja, negros não podiam frequentar ambientes ou estabelecimentos frequentados por brancos – e pouco importava se era um trabalhador do campo ou um dos maiores músicos do planeta, caso do pianista Don Shirley (Mahershala Ali).

Acontece que Shirley tinha uma turnê agendada pelo Sul e precisava de “apoio”. É quando surge a figura de Tony “Lip” Vallelonga (Viggo Mortensen), um ítalo-americano que trabalha como leão de chácara nos clubes de jazz em Nova York, o guia perfeito para uma viagem com promessa de truculência.

Tony Lip e sua esposa, Dolores (Linda Cardellini). (Universal Pictures)

O roteiro, a princípio, ensaia um conflito em Tony, um sujeito racista que passa a trabalhar para um negro, mas essa característica é estranhamente abandonada em função de uma repentina desconstrução do personagem; o racismo de Tony poderia ser trabalhado como fruto de sua ascendência italiana, do gueto branco em que vive, mas nada disso acontece. A escolha torna o filme mais leve, mais feel good, mas

também o torna mais superficial ao tratar de um assunto tão sério e sempre relevante.

CONTRASTES

Como bom road movie que é, “Green Book” concentra seu esforço na transformação dos personagens na estrada. Enquanto Tony deixa seu preconceito de lado ao perceber o racismo dos outros com Don Shirley, o pianista, de formação clássica, mas famoso pelo jazz, desce do pedestal para abraçar sua cultura e se impor também como cidadão.

É justamente quando esses contrastes entre os personagens estão no foco da narrativa que o filme entrega seus melhores momentos, sempre pontuados pela excelente atuação de Mortensen e Ali e pela ótima edição/montagem, que dá ritmo de jazz à turnê e desacelera nos momentos e que o espectador deve prestar mais atenção.

CRÍTICAS

Tal qual “Bohemian Rhapsody”, seu concorrente direto no Oscar, “Green Book” toma diversas liberdades para contar a história de Tony Lip e Don Shirley – como os dois morreram em 2013, fica difícil comprovar qualquer coisa. A família do músico, por exemplo, diz que a amizade entre os dois nunca existiu como no roteiro escrito por Peter Farrelly, Nick Vallelonga (filho de Tony) e Brian Currie. Mahershala Ali chegou, inclusive, a ligar para os familares vivos de Shirley e pedir desculpa se “os ofendeu com a representação de Don”.

“Green Book” necessita do selo de “história real” para funcionar como foi imaginado. Conduzido pela realidade, o filme pode fazer suas escolhas e ainda assim funcionar como uma necessária jornada de transformação conduzida de forma leve.

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Mas mesmo que a polêmica tire do filme sua ligação com os fatos e a força de sua mensagem, ao fim, ele ainda é o mais “família” da temporada de premiações, uma obra pop de fácil consumo e pronta para entreter.

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