"Doom" se recusa a amadurecer. Recentemente lançado, o game "Doom Eternal" mantém a ação brucutu que há três décadas marca a franquia. Novas armas, recursos e inimigos adicionam complexidade ao tiroteio frenético, exigindo ainda mais das sinapses do jogador.
A origem de "Doom" remonta ao começo da década de 1990, momento em que os videogames chegavam à adolescência, tanto em termos de público-alvo quanto de estética. Jogos passaram a ser mais radicais (usando um termo da época), com doses exageradas de violência.
Um dos títulos mais prestigiados era "Doom". Com um protagonista sem nome, foi o grande responsável por popularizar o tiro em primeira pessoa, com câmera subjetiva. Tanto é que antes da denominação "first person shooter" (FPS), que significa "primeiro atirador" em português, esse estilo foi referido como "tipo doom".
A influência não era só da mecânica. O clima de quarto de adolescente metaleiro infernal, com música pesada, pentagramas e cabeça de bode compunham uma atitude transgressora, tão influente quanto a câmera. "Heretic", "Duke Nukem" e "Turok" são alguns exemplos que beberam dessa fonte (de sangue).
O tempo passou e os FPS seguiram uma estrada narrativa após "Half Life", de 1998. Passaram também a emular grandes conflitos militares, históricos ou fictícios (como em "Call of Duty" e "Battlefield"). Cobertura, recarregamento, coice da arma, foram alguns dos elementos adotados, brecando o frenesi.
A Bethesda, atual dona da marca "Doom", surpreendeu o mundo em 2016 com um novo "Doom". Adaptou com êxito a proposta "vai, vai, vai" aos tempos atuais. Não tem botão parar, mirar ou correr --o personagem está sempre pronto para atirar, sempre acelerado.
"Doom Eternal" mantém a falta de sutilezas e incrementa o nível estratégico. Mais do que nunca, é preciso se mover para reabastecer armas e armadura. Os campos de batalha parecem parques temáticos, com propulsores, portais, caixas, barris explosivos.
Os demônios são assustadores? Sim, mas a proposta é o jogador atuar como predador. Ficar na defensiva é inviável.
A continuação adicionou camadas intrincadas à ação. Os inimigos passaram a ser vulneráveis a determinados armamentos e com pontos fracos. Mesmo com a agitação bárbara, é preciso atenção à munição e armadura.
"Doom Eternal" reúne em tese os ingredientes de um game patético. Isso é evitado pelo bom humor consigo, o jogo ri de si --característica que faz falta em "Darksiders", outro que parece oriundo de headbangers entusiasmados. Alguns dos itens espalhados pelo cenário de "Doom Eternal" são bonecos. O jogo é isso, a realização em videogame dos Comandos em Ação.
O jogo da Bethesda coloca no caminho plataformas flutuantes, barras de fogo, fases em cenários de gelo, castelo, itens coloridos... Nada a dever a "Super Mario Bros". O título de 2016 tinha um certo pudor em abraçar a filosofia antiquada dos fliperamas.
Houve uma mudança. O game investe em uma história profunda envolvendo uma batalha com o inferno. Quem quiser pode prescindir de ler a narrativa espalhada pelos cenários, afinal isto é "Doom". "A história em um game é como uma história em um filme pornô, espera-se que esteja lá, mas não é importante", disse certa vez John Carmack, um dos criadores do "Doom" original.
Escapista, brutal e intenso, é estranho jogar "Doom Eternal" em pleno período de pandemia. E quer saber? Para estranhos dias em que fazer nada ajuda, matar uns demônios ao som do instrumental de Pantera e Rage Against the Machine é uma ótima válvula de escape.
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