Após a morte de George Floyd, no dia 25 de maio, na cidade de Mineápolis, EUA, teve início uma onda de protestos no mundo. Os envolvidos nas ações pedem por justiça, pelo fim do racismo e da violência policial. As reivindicações nas ruas americanas se alastraram pelo globo através das redes sociais, acumulando pedidos por igualdade racial. No dia 2 de junho, por exemplo, houve uma comoção virtual pelas vidas negras perdidas.
A cena em que George Floyd é sufocado durante cerca de 7 minutos pelo ex-policial Derek Chauvin sensibilizou o mundo. A reflexão a respeito do racismo e suas consequências diárias têm se destacado nos debates públicos e, desde então, o assunto tem permeado o cotidiano de todos.
Na área cultural, diversas expressões artísticas tem surgido sobre o tema, na literatura não poderia ser diferente. Obras que retratam o racismo e como combatê-lo estão sendo listadas e o Divirta-se vem trazer sua contribuição para a análise do assunto.
A autora e atriz baiana, radicada no Espírito Santo, Suely Bispo, acredita que os livros podem fazer as pessoas se conscientizarem sobre o preconceito e as atitudes racistas. Bispo é curadora do projeto Pretaria Blackbooks, um clube de assinatura antirracista que reúne obras de escritores negros clássicos e contemporâneos.
Criada em 2015 pela quilombola do Sapê do Norte (ES), Mirtes Santos, o clube tem obras voltadas tanto para o público adulto como o infantil. Suley destaca que a iniciativa também visa a valorização dos autores negros. Tem como objetivo a formação desses leitores em relação à questão étnico-racial, explica a artista.
A atriz e autora Suely Bispo. (Divulgação/ Editora Cousa)
Em sua experiência com a literatura negra, Suely lamenta a falta de visibilidade que as obras e os autores têm. Cita como exemplo o autor Solano Trindade, que foi tema de seu mestrado. Muitas vezes não conseguem nem publicar seus livros, comenta.
Poetiza, Bispo tem duas obras lançadas, Desnudalmas e Lágrima Fora do Lugar, livros que são atravessados por sua experiência como mulher negra. A autora também é formada em história, área em que publicou o livro Resistência negra na Grande Vitória: dos quilombos ao movimento negro, que terá sua segunda edição lançada em breve, pela editora Cousa.
A artista afirma que, diante dos acontecimentos atuais, é preciso resistir e valorizar a existência negra. A respeito das manifestações virtuais pró-igualdade racial, frisa que não pode ser apenas um discurso, mas sim uma prática diária de conscientização. Sinto que temos que continuar lutando, pondera.
Professor do Departamento de Línguas e Letras da Ufes, Jorge Nascimento também é autor, tendo escrito o livro Visagens, uma compilação de crônicas que traz o racismo como um de seus expoentes, assim como outros preconceitos e violências. Trabalha ainda desenvolvendo pesquisas e orientação de trabalhos nas áreas de literatura marginal e RAP.
Em sua visão, Nascimento afirma não saber se a literatura pode conscientizar alguém, por o racismo ser ensinado em casa. No desenvolvimento de uma criança, os filmes, as propagandas, as relações na escola, tudo isso vai acumulando estereótipos e enraizando as ideias da superioridade branca, explica o escritor.
No entanto, Jorge destaca que os livros e a cultura são fundamentais, embora não acredite que sua eficácia seja percebida a curto prazo. A cultura, os saberes, a literatura são componentes que podem colaborar com o processo, reitera Nascimento.
Questionado sobre o que significa ser um autor negro no país, o professor e escritor declara que, independente de sua condição social ou profissão, é um exercício constante de afirmação identitária, social ou racial.
Fique por dentro de obras que podem auxiliar na reflexão sobre o racismo e na conscientização:
PEQUENO MANUAL ANTIRRACISTA
Livro "Pequeno Manual Antirracista". (Reprodução capa "Pequeno Manual Antirracista")
Autora: Djamila Ribeiro
Ano de lançamento: 2019
Sinopse: Neste livro, a filósofa e ativista Djamila Ribeiro trata de temas como atualidade do racismo, negritude, branquitude, violência racial, cultura, desejos e afetos. Nos capítulos, ela apresenta caminhos de reflexão para aqueles que queiram aprofundar sua percepção sobre o assunto. Há muitos anos se solidifica a percepção de que o racismo está arraigado em nossa sociedade, criando desigualdades e abismos sociais: trata-se de um sistema de opressão que nega direitos, e não um simples ato de vontade de um sujeito. Djamila Ribeiro argumenta que a prática antirracista é urgente e se dá nas atitudes mais cotidianas. Uma obra que pode auxiliar em um primeiro contato com o estudo e entendimento do racismo.
VISAGENS
Livro "Visagens", de Jorge Nascimento. (Reprodução capa "Visagens")
Autor: Jorge Nascimento
Ano de lançamento: 2018
Sinopse: O livro compila53 crônicas, onde temas como racismo, violência e cárcere são explorados em um contexto atual. A obra permitiu que o autor viajasse para cidades da Bahia, do Rio de Janeiro e do sertão de Pernambuco, conversando com o público em geral e com estudantes de diversas faixas etárias. Nos debates o tema do racismo sempre era discutido.
A RESPOSTA
Livro "A Resposta". (Reprodução capa "A Resposta")
Autora: Kathryn Stockett
Ano de lançamento: 2009
Sinopse: A protagonistaEugenia Skeeter Phelan terminou a faculdade e está ansiosa para se tornar escritora. Após um emprego como colunista do jornal local, ela tem a ideia brilhante de escrever um livro em que funcionárias do lar negras relatam o seu relacionamento com patroas brancas do Mississipi na década de 60. Mesmo com receio de prováveis retaliações, ela consegue a ajuda de Aibeleen, uma funcionária que criou 17 crianças brancas, e Minny, que, por não levar desaforo para casa, já esteve por diversas vezes desempregada após bater boca com suas contratantes. Aproveitando o surgimento das primeiras manifestações em defesa dos direitos civis, Skeeter espera que seu livro choque as pessoas brancas preconceituosas e traga orgulho e esperança à comunidade negra de Jackson. Uma obra que escancara a crueldade do racismo e as atitudes que se mantém seis décadas depois. A obra ganhou os cinemas com um filme emocionante, nomeado "Histórias Cruzadas".
SE A RUA BEALE FALASSE
Livro "Se a Rua Beale Falasse". (Reprodução capa "Se a Rua Beale Falasse")
Autor: James Baldwin
Ano de lançamento: 1974
Sinopse: A protagonistaTish tem dezenove anos quando descobre que está grávida de Fonny, de 22. A sólida história de amor dos dois é interrompida bruscamente quando o rapaz é acusado de ter estuprado uma porto-riquenha, embora não haja nenhuma prova que o incrimine. Convicta da honestidade do noivo, Tish mobiliza sua família e advogados na tentativa de libertá-lo da prisão. A obra também já ganhou as telonas, com direito a indicações ao Oscar nas categorias Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Trilha Sonora Original e Melhor Atriz Coadjuvante, este último rendendo prêmio a Regina King.
DESNUDALMA
Livro "Desnudalmas", de Suely Bispo. . (Reprodução capa "Desnudalmas")
Autora: Suely Bispo
Ano de lançamento: 2009
Sinopse: Uma obra poética que reúne o erotismo, a religiosidade e a arte. Dentre as temáticas, as vivências e reflexões sobre o racismo perpassam as páginas do livro. "Já houve tempo do ferro em brasa, que marcava a propriedade arbitrária dos senhores", diz trecho do poema Corpos Assinalados, que retrata o passado brutal do negro no Brasil. Livro para refletir nas sutilezas dos versos de Suely Bispo.
MEMÓRIAS DA PLANTAÇÃO
Livro "Memórias da Plantação". (Reprodução capa "Memórias da Plantação")
Autora: Grada Kilomba
Ano de lançamento: 2008
Sinopse: A obra traz relatos de episódios cotidianos de racismo, escritos sob a forma de pequenas histórias psicanalíticas. O livro aborda temáticas como as políticas de espaço e exclusão, os insultos raciais e as políticas do corpo e do cabelo. Grada Kilomba desmonta a normalidade do racismo, expondo a violência e o trauma de ser colocada/o como Outra/o. Publicado originalmente em inglês, se tornou uma importante contribuição para o discurso acadêmico internacional. Obra interdisciplinar, combina teoria pós-colonial, estudos da branquitude, psicanálise, estudos de gênero, feminismo negro e narrativa poética.
INFILTRADO NA KLAN
Livro "Infiltrado na Klan". (Reprodução capa "Infiltrado na Klan")
Autor: Ron Stallworth
Ano de lançamento: 2014
Sinopse: Ron Stallworth, foi o primeiro detetive negro da história do Departamento de Polícia de Colorado Springs. Em sua história verídica, Stallworth passou a investigar o grupo supremacista branco Ku Klux Klan, fingindo ser um homem branco racista. Durante os meses de sua investigação, juntamente a um colega que se passava por ele nas reuniões da Klan, o detetive sabotou vários rituais da famosa queima de cruzes, frustrou planos de detonar bombas em bares e boates gays ou frequentados por negros. Também revelou a presença de supremacistas brancos nas Forças Armadas e no Comando de Defesa Aeroespacial Americano. Um retrato vívido do racismo, a história ganhou até filme homônimo, lançado em 2018, que teve seis indicações ao Oscar e a vitória para Spike Lee e Kevin Willmott na categoria Melhor Roteiro Adaptado.
O SOL É PARA TODOS
Livro "O Sol é Para todos". (Reprodução capa "O Sol é Para todos")
Autor: Harper Lee
Ano de lançamento: 1960
Sinopse: O livro discute o racismo e a injustiça nos Estados Unidos. A trama se dá ao redor do advogado de um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca nos anos 1930. Ao longo do desenvolvimento do caso, o acusado enfrenta represálias de uma comunidade racista. Quem narra a história é Scout, filha do advogado. Assuntos como tolerância, inocência e preconceito perpassam a história. Com sua narrativa atemporal, o romance se tornou um clássico para todas as idades e gerações. A obra também tem versão em quadrinhos, para os que preferem a leitura acompanhada de ilustrações.
QUARTO DE DESPEJO
Livro "Quarto de Despejo". (Reprodução capa "Quarto de Despejo")
Autora: Carolina Maria de Jesus
Ano de lançamento: 1960
Sinopse: O livro é fruto da junção dos diários de Carolina Maria de Jesus. A catadora de papel relata na obra sua triste e cruel vida na comunidade do Canindé, em São Paulo, ao lado de seus três filhos. A experiência da autora comove o leitor com sua realidade, que faz pensar sobre o sofrimento da comunidade negra pobre no Brasil. Carolina se tornou mundialmente conhecida por seu livro, que tem grande valor dentro da literatura do país.
ESCRAVIDÃO
Livro "Escravidão". (Reprodução capa "Escravidão")
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Autor: Laurentino Gomes
Ano de lançamento: 2019
Sinopse: Resultado de seis anos de pesquisas e observações, que incluíram viagens por doze países e três continentes, este primeiro volume cobre um período de 250 anos, do primeiro leilão de cativos africanos registrado em Portugal, até a morte de Zumbi dos Palmares. Entre outros aspectos, a obra explica as raízes da escravidão humana na Antiguidade e na própria África antes da chegada dos portugueses, o início do tráfico de cativos para as Américas e suas razões: os números, os bastidores e os lucros do negócio negreiro. Uma história de dor e sofrimento cujos traços ainda são visíveis atualmente em muitos dos locais visitados pelo autor, como Luanda, em Angola; Ajudá, no Benim; Cidade Velha, em Cabo Verde; Liverpool, na Inglaterra; e o cais do Valongo, no Rio de Janeiro.
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