Quando se fala em Fleetwood Mac, pensa-se logo na banda de vocais femininos, que estourou mundialmente em 1975 com canções de pop-rock extremamente sofisticadas. Músicas como "Dreams", "Rhiannon", "Go Your Own Way" ou "Gipsy".
No entanto, esse disco de 1975 já era o décimo álbum gravado pela banda britânica. E antes dele, o Fleetwood Mac havia passado por uma fase completamente diferente, calcada no blues rock, aquele som que sempre ouvimos nos bares de beira de estrada que aparecem nos filmes norte-americanos.
Pois essa fase, capitaneada por Peter Green, no fim dos anos 1960, está ganhando uma celebração agora. Green foi o fundador da banda em 1967, mas teve um final trágico. Após usar LSD uma série de vezes, sua mente derreteu e ele nunca voltou ao normal.
"É uma história muito parecida com a Sid Barret [líder do Pink Floyd nos anos 1960]", admite o baterista Mick Fleetwood, em entrevista para a Folha. "A música deles era diferente, mas Green também nunca voltou de suas experiências com alucinógeno".
Em fevereiro de 2020, Fleetwood reuniu amigos e convidados para um show em Londres - que será lançado nas plataformas digitais na sexta (30). Trata-se de "Mick Fleetwood & Friends Celebrate the Music of Peter Green and the Early Years of Fleetwood Mac".
Como diz o enorme nome do álbum ao vivo, a festa é para Peter Green. "Foi ele que fundou o Fleetwood Mac e não eu, apesar do nome da banda", explica Fleetwood.
Generoso, Green nomeou a banda a partir dos sobrenomes da seção rítmica, o batera Fleetwood e o baixista John McVie. "Há uns 30 anos, eu pensei em fazer essa homenagem a ele. Convidei-o e preparei tudo. No último minuto, ele desistiu de aparecer. Desta vez foi parecido", conta Fleetwood.
"Ele disse que viria assistir ao show, traria um amigo para cuidar dele, mas desistiu. 'Não quero estar no meio de tantas pessoas', disse. Ele não estava mais saindo de casa e também não tocava mais em público."
"Mick Fleetwood & Friends Celebrate..." é aquele típico álbum de reunião de músicos. Um bando de tiozão que toca muito bem celebrando seu passado.
São 23 músicas e, entre os convidados de peso para a noite de blues, estão Dave Gilmour (Pink Floyd), Pete Townshend (The Who), Noel Gallagher (Oasis), Steven Tyler (Aerosmith), Kirk Hammet (Metallica), Bill Wyman (Rolling Stones) e alguns membros do próprio Fleetwood Mac, caso de Christine McVie, Jeremy Spencer e Neil Finn.
O repertório passeia pelos primeiros discos do Fleetwood, especialmente as canções compostas por Peter Green, como a instrumental "Albatross" (primeiro lugar na Inglaterra em 1968) ou "Black Magic Woman", que chegaria ao top ten americano em 1970 na versão do mexicano Carlos Santana. "Esse é o som dos primeiros álbuns do Fleetwood Mac. Se você gosta da gente, talvez queira conhecer", sugere Fleetwood.
Virtuose do instrumento, Peter Green fez parte do movimento blueseiro britânico de meados dos anos 1960, chegando a substituir Eric Clapton na John Mayall and the Bluesbreakers em 1966. No Fleetwood Mac, ele participou dos primeiros três álbuns, lançados em 1968 e 1969. Antes de sair, porém, deixou crescer a barba, passou a andar de roupão, virou religioso e quis convencer a banda a doar todo o dinheiro que ganhavam para a caridade. É claro que não deu certo.
Ainda nos anos 1970 foi diagnosticado com esquizofrenia causada por uso de drogas e se submeteu a tratamento de choque. Passou as décadas seguintes tentando se recuperar, morando com a mãe e o irmão, e nunca mais foi o mesmo.
"Sempre torci para que ele voltasse ao normal, mas isso nunca aconteceu. E ele sabia disso. Dizia que as drogas tinham fodido sua cabeça e se lamentava", diz Fleetwood.
Peter Green morreu em julho de 2020, cinco meses após o show organizado por Mick Fleetwood. Não houve tempo para ele escutar o álbum ou assistir ao vídeo com a apresentação, que deve ser lançado no futuro próximo. Mas ele soube que aconteceu.
"Peter não tinha ego, zero!", lembra o amigo. "Ele não fazia ideia de como as pessoas gostavam dele. Mas ele não se importava. Eu amo Peter Green."
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