Lady Gaga sente tantas saudades das pistas de dança quanto os seus milhões de fãs pelo mundo, trancafiados em casa. Depois de um hiato de quatro anos, a cantora retorna com um disco de inéditas e, mais do que isso, está de volta às cores, ao barulho e ao agito.
Até por isso, Gaga segurou o lançamento de "Chromatica", antes previsto para abril, o quanto pôde. Uma convocação explícita à festa, o álbum soaria deslocado num mundo assustado com o avanço do coronavírus. A pandemia ainda é uma realidade, mas - como é comum nos lançamentos de Gaga--, o disco vazou antes da hora, e sai oficialmente nesta sexta.
Bastante aguardado, "Chromatica" remete diretamente à época de maior sucesso da cantora, com os discos "The Fame", de 2008, "The Fame Monster", de 2009, e "Born This Way", de 2011. Desde que lançou "Artpop", de 2013, Gaga já se dedicou a cantar jazz com Tony Bennett, gravou um álbum voltado ao country ("Joanne", de 2016) e teve um hit ("Shallow") na trilha do filme "Nasce Uma Estrela", em que atuou.
Esse período pode ser visto tanto como uma busca por aprovação --ser mais do que uma cantora pop-- quanto um desvio natural da euforia dos anos anteriores. De toda forma, até "Artpop", um disco conceitual recebido friamente quando lançado, nos últimos anos se tornou um queridinho dos fãs --tamanha a demanda por novas músicas mais dançantes da cantora.
"Chromatica" é uma resposta a tudo isso, mas também um resgate. Não só das batidas contagiantes da Gaga de "Just Dance" e "Poker Face", mas da música eletrônica dos últimos 30 anos, do house dos anos 1990 à eletrônica do DJ Tiesto, do começo da década passada.
E Gaga amarra as referências trazendo tudo para o presente. Ela se junta ao girl group de k-pop Blackpink em "Sour Candy" enquanto intercala vozes de maneira entrosada com Ariana Grande em "Rain on Me".
Em 43 minutos, "Chromatica" não tem espaço para baladas ao piano e praticamente não há respiros entre as 16 faixas --da abertura instrumental a "Babylon", derradeira, que lembra "Vogue" de Madonna.
Até a participação de Elton John, ídolo e amigo de Gaga, é em uma música dançante. Mestre ao piano, o britânico empresta a voz grave para um pop. "Vivi meus dias apenas pelas noites/ Me perdi sob as luzes/ Quando eu era jovem, me sentia imortal", eles cantam juntos em "Sine From Above".
Majoritariamente produzido por BloodPop, "Chromatica" é quase inteiro sintético e pulsa eufórico. Se "Future Nostalgia", disco recente de Dua Lipa, soa como uma balada chique, "Chromatica" dispensa o requinte --é o porre depois de um término, dançar até se esquecer do dia seguinte.
Em "Alice", Gaga se diz presa na própria mente, pergunta onde está seu corpo e pede "maestro, toque sua sinfonia/ vou ouvir qualquer coisa/ me leve para uma viagem, DJ, liberte minha mente".
A faixa é um anúncio - ela quer fazer música para ouvir com o corpo, não com a cabeça. Paradoxalmente, ela acaba soando muito mais autêntica em "Chromatica" do que na tentativa de humanização de "Joanne".
Até porque, mesmo quando está fazendo música dançante, Gaga - que sofre de depressão - não soa alegre de graça. Seu pop eletrônico pode soar sombrio, lembrando New Order, e ela fala sobre os problemas nas letras. Em "Replay", diz que os traumas voltam à sua mente. Em "Fun Tonight", se diz "presa no inferno" da fama.
Os exageros que podem derrubar "Chromatica" para um público mais genérico --o drama, os refrões sempre épicos, a "sujeira" eletrônica-- são exatamente o que deve aproximá-la ainda mais dos monstrinhos (seus fãs) e do público LGBTQ.
Gaga está recuperando o tempo perdido. Se os fãs passaram sete anos longe da faceta dançante de sua cantora favorita, a resposta vem tão intensa e barulhenta quanto a pedida.
Em "Chromatica", Lady Gaga reivindica a pista de dança. Como canta em "Free Woman", "esta é minha pista de dança, pela qual lutei/ um coração, é para isso que estou vivendo/ então acenda meu corpo e me beije com força/ o centro da cidade é nosso, ouça nosso som".
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