Louis Armstrong, Chet Baker, Ella Fitzgerald, Miles Davis, Nina Simone... É praticamente impossível citar os inúmeros gênios do Jazz, movimento artístico-musical (visto como uma "religião" por seus fiéis seguidores) nascido em Nova Orleans (EUA), no final do século XIX.
Nesta sexta-feira (30), inclusive, comemora-se o Dia Internacional do Jazz e a alguns (bons) quilômetros de Louisiana, mais precisamente no estado de Illinois, vive um jazzista capixaba, Andrey Gonçalves, fã inveterado do gênero musical afro-americano. Andrey, que mora há oito anos na "Terra do Tio Sam", vê o período como uma oportunidade para o ritmo se popularizar ainda mais.
"A data, sugerida pelo pianista Herbie Hancock junto à ONU e a UNESCO, celebra a função diplomática do jazz, que é unificar as pessoas em todos os cantos do planeta. Acredito que a comemoração aumente a performance do gênero nas cidades e isso gera mais divulgação do estilo ao público", defende, dizendo que em Champaign-Urbana, região onde mora, há uma procura maior por bandas de jazz no fim de semana relacionado à data comemorativa.
"Com a chegada da primavera nos Estados Unidos, e, com ela, dias mais quentes, os bares que possuem área externa estão voltando a oferecer música ao vivo. Alguns locais na minha cidade terão shows com atrações ou eventos voltados à comemoração".
Com uma lista de turnês pela Europa, América do Sul e Estados Unidos, o contrabaixista e compositor capixaba está lançando o seu primeiro álbum solo, “Nocturnal Geometries” (disponível nas plataformas digitais). São sete faixas, em que Andrey flerta com o Jazz Contemporâneo, mesclando elementos - ou poderia chamar "pitadas" - da música brasileira.
"Mancada", por exemplo, traz em sua essência o bom e velho samba. "Ser brasileiro foi um elemento fundamental na gravação desse samba. A banda (Andrey gravou o disco acompanhado de seis músicos) se sente mais segura se você inspira confiança e demonstra segurança no que está fazendo. Além disso, o baterista, Andy Wheelock, tem uma grande paixão pela música brasileira e sabe tocar samba muito bem. Então, foi fácil achar o groove", explica, dizendo que, ao vivo, "Mancada" é muito bem-recebida.
"Geralmente, é uma das músicas mais elogiadas, porque expõe a plateia a algo que não estão acostumados a ouvir em um show de jazz", reitera.
Uma das faixas de “Nocturnal Geometries”, "Octatonic Lullaby", foi feita em homenagem à filha recém-nascida. De acordo com o músico, a canção mistura técnica à emoção paterna.
"Meu professor pediu pra compor uma música usando a escala octatônica, que, para mim, tem uma sonoridade muito angular, pontuda e agressiva. Estava frustrado porque o som da escala estava me impedindo de fluir com algumas ideias. Aí tentei fazer uma canção de ninar usando a escala, mas fiz como uma brincadeira para amenizar a minha frustração. E acabou virando essa música linda! Quando terminei a composição e a toquei no piano, liguei pra minha esposa e comentei: 'acabei de compor uma canção de ninar para quando nosso primeiro bebê chegar'", relembra, com carinho.
As faixas do álbum passeiam por várias vertentes do jazz, desde algo mais tradicional (como o walking bass), flertando com ritmos caribenhos, brasileiros e uma linguagem jazzística mais contemporânea.
"Atualmente, os grandes centros atraem músicos de todos os cantos do mundo e isso acaba gerando muito intercâmbio de ideias, principalmente no palco. No meio acadêmico, ocorre o mesmo. As escolas de música investem em bolsas para alunos internacionais, visando o enriquecimento das práticas musicais nas universidades", aponta, dizendo que os cursos de jazz norte-americanos estão cada vez mais criando práticas de banda concentradas exclusivamente em jazz afro-caribenho e música brasileira. No vídeo abaixo, veja trechos de uma das performances do artista capixaba, se apresentando com um contrabaixo acústico.
"Quando ensinei práticas de conjunto na Universidade de Illinois, os meus alunos adoravam tocar música brasileira, de compositores como Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Milton Nascimento e Toninho Horta".
Aluno de doutorado em Jazz e Educação Musical, pela Universidade de Illinois, Andrey Gonçalves tem muito da sonoridade capixaba em sua formação. "Estudei Música Popular na Fames, além de ter atuado no mercado. Por anos, toquei com diversos músicos, como Amaro Lima, Edivan Freitas e Aline Pignaton. Além disso, fui baixista e um dos fundadores do trio de samba-rock Tabacarana", enumera.
Questionado se pretende misturar elementos da música capixaba ao jazz, Gonçalves expressa um desejo. "Ainda não fiz esta mescla. O meu próximo disco, que já está em pré-produção e será lançado no fim deste ano, tem muito mais mistura com ritmos brasileiros. O congo capixaba estará presente", comemora.
Em seu doutorado, Gonçalves contou com a orientação do trombonista Jim Pugh, que, anteriormente, se apresentou com Chick Corea e hoje acompanha a Steely Dan, banda americana de jazz fusion dos anos 1970. Ele confirma que Pugh é uma influência em suas composições.
"O Jim me apresentou o uso de técnicas de composição contemporâneas ou não-convencionais no jazz. Além disso, me encorajou a usar a minha influência da música brasileira para compor melodias. Em pouco tempo de estudo, parei de querer imitar os ícones do jazz, passei a investi em achar a minha própria voz e comecei a acreditar no potencial das minhas composições", complementa, com orgulho.
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