Quando morreu, em 2002, Flavio Barbosa Mavignier Colin, ou só Flavio Colin, não imaginava que voltaria a ser um fenômeno editorial. O quadrinista carioca vivia à época com dificuldades para publicar suas criações -bem diferente do seu auge, nos anos 1970 e 1980, quando algumas delas, em edições com milhares de cópias, chegaram a ser distribuídas em postos de combustíveis, tamanha era a sua popularidade.
Este ano pode marcar uma grande virada para Colin. Ele e autores clássicos dos quadrinhos nacionais como Jayme Cortez, Ota, Luiz Gê, Julio Shimamoto protagonizam uma onda de reedições, chamando a atenção de um público totalmente novo, que veio da internet e, em muitos casos, nunca teve oportunidade de ler uma página desenhada por esses nomes.
Embora tenham obras bastante distintas ente si, um traço comum entre eles é o enfoque sobre momentos históricos brasileiros -caso, por exemplo, de "Guerra dos Farrapos", de Colin. Além disso, todos flertaram com a literatura de gênero, especialmente o terror e o suspense.
O grande culpado pela rememoração de Colin é Ivan Freitas da Costa, cofundador da CCXP, a Comic Con Experience, e da Chiaroscuro Studios. A princípio interessado em organizar uma exposição da memória do autor, ele passou a gerenciar a obra e o acervo dele convite da família do quadrinista.
"Desde o início o objetivo foi esse, trazer de volta o nome do Colin. Isso é importante para um país que normalmente tem o costume de esquecer dos seus grandes nomes", relata Freitas da Costa .
Ao menos três editoras lançaram ou pretendem lançar obras de Colin. Uma delas é a Figura, com uma coleção especial de "Aventuras do Anjo" -uma adaptação para quadrinhos de uma radionovela do fim dos anos 1940.
Rodrigo Rosa, editor da casa, conta que esse trabalho será a primeira "edição de artista" de Colin no Brasil. Isso significa que todo o material produzido será reproduzido fielmente na nova edição, sem nenhum tipo de tratamento.
"Vai aparecer o que ele anotou nas bordas, os retoques e tudo mais. É como se o leitor estivesse com os originais do Colin na mão. É uma coisa realmente focada em realmente pessoas interessadas na produção desse artista", relata. "A gente sabia que não atingiria tanto público como nossas edições atingem, mas chegou nas pessoas certas, e a campanha de financiamento se pagou e passou da meta", prossegue, sobre a ação no Catarse que recebeu mais de R$ 61 mil.
Outra editora a promover o resgate da obra do carioca é a Pipoca e Nanquim, que lança "Terror no Inferno Verde". É um compilado de histórias, especialmente de terror, feitas por Colin. O sucesso foi gigantesco, pondo a HQ entre as 20 de mais vendidas da Amazon em "Graphic Novel".
"Não basta lançar um álbum deles, é preciso ressaltar a sua importância e trazer à tona a história por trás das histórias", comenta Daniel Lopes, um dos editores e fundadores da Pipoca e Nanquim.
Colin não está isolado. Ele faz parte de um grupo de autores que reaparecem em novas edições, muitas podendo ser consideradas "de luxo".
A Pipoca e Nanquim tem capitaneado esse movimento, com o lançamento em quatro volumes de todas as tiras de "Horácio", um dos personagens mais clássicos de Mauricio de Sousa. Antes disso, ela já havia investido em outro nome famoso do terror nacional, Jayme Cortez, publicando no ano passado "Fronteiras do Além".
Segundo Lopes, as vendas ficaram "na média", mas o suficiente para investir em mais obras do tipo. "É também um trabalho de reapresentação de grandes artistas do passado para uma nova geração. Nosso papel é ampliar a base de leitores ávidos por obras e talentos assim."
Enquanto isso, a editora Figura relança no ano que vem as histórias do artista gaúcho João Mottini, nome ainda raro nas estantes do país. E a MMarte Produções vem publicando, aos poucos, HQs de Julio Shimamoto, homenageado na CCXP há dois anos. A casa editorial lançou "O Ditador Frankenstein", acrescentando ao seu catálogo no ano seguinte "O Lobisomem Errante".
No fim deste ano, a casa deve trazer "Os Estranhos Hóspedes do Hotel Nicanor", também de Flavio Colin, em colaboração com Otacílio d'Assunção Barros, o Ota, morto este mês.
"Para mim, não é uma questão de mostrar como eram os quadrinhos no passado, mas sim que essas obras permanecem atuais", diz o editor da MMarte, Márcio Paixão Jr.
O professor e pesquisador Nobu Chinen, autor de livros como "O Negro nos Quadrinhos do Brasil", destaca a importância desse resgate histórico das editoras.
"São profissionais que enfrentaram as dificuldades decorrentes de uma concorrência desproporcional com o material estrangeiro, a instabilidade do mercado de gibis e, muitas vezes, o preconceito em relação a essa atividade. Muitos nem puderam assinar seus trabalhos e permaneceram anônimos para o grande público. Por isso, os relançamentos são um reconhecimento merecido e muito bem-vindo até como forma de registro", diz ele.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta