Sabe esse jeito novo de nos referirmos como "antes" e "depois" da pandemia? O padre Marcelo Rossi já tem usado os termos há algum tempo, mas em outro contexto. É que o sacerdote, que celebra 25 anos no ofício neste ano, diz que evoluiu ainda mais - no sentido espiritual da palavra - depois que foi vítima de um empurrão de cima do altar durante missa em Cachoeira Paulista, no dia 14 de julho de 2019.
Após expor outros dramas pessoais até no "Fantástico", da TV Globo, e envolto sob a tese de que a fé o curou das doenças mais terríveis que já enfrentou - como a depressão -, o padre acredita que o atentado que sofreu foi mais um divisor de águas. E é essa reflexão que ele convida o leitor a fazer em "Batismo de Fogo", seu novo livro definido como "o mais pessoal já escrito" por ele próprio.
Nas 144 páginas da obra, padre Marcelo escreve mais uma vez sobre como percebe e analisa a depressão, chega a tocar no tema do suicídio e faz novas revelações pessoais na tentativa de mostrar exemplos para os cristãos. Em algumas passagens, o sacerdote dá detalhes de quando lançou mão de anabolizantes na juventude para conquistar uma estética padrão.
"Um adolescente no mundo da ginástica quer ter músculo. E você vai no grupo. As pessoas não sabem o encontro que tive com Deus e, depois de me perder na juventude, quero restaurar o que são os valores. Você não vale pelo que você tem, mas pelo que é", opina.
Durante o bate-papo, o religioso também falou de realizações e cuidados que tem tomado nas redes sociais e com a fama.
Eu estava agora conversando com a pessoa e ela me falou sobre como fez bem o livro para ela. Esse livro é diferente de todos que eu fiz. Pelo empurrão, eu percebi que quero passar para as pessoas que a fé é um caminho de superação. São poucos capítulos, mas eu quis falar de coração para tocar as pessoas. Esse empurrão me levou a uma experiência de reviver minha vida e compreender alguns pontos. Eu achava que estava fazendo as coisas para Deus, mas quem faz é Deus. Não sou eu. Como é importante o que refleti...
Mostrar um mundo de diferença fazendo a diferença. Não tem satisfação maior que fazer a diferença. A realização de você levar a pessoa a compreender esse mundo de hoje. É como se fosse uma bússola para Deus. No julgamento final, o que vai contar é o amor. Em um mundo tão superficial, levar o essencial, que é o amor a Deus, é recompensador. Em um dos capítulos do livro, também falo da volta ao primeiro amor, que é esse de Deus. O livro é como se fosse uma autobiografia. Como eu conheci Deus, o que fez eu me tornar sacerdote...
Eu confesso a você que foi uma benção. Você vê no livro que eu quase não uso a palavra "atentado", porque não é. A primeira atitude que tomei quando levantei foi fazer o meu B.O., que é "bíblia e oração". Eu não sabia nem quem foi, o que era... Mas fiz isso, esse B.O.. E como foi importante! Esse empurrão me fez evangelizar mais ainda, mas tomando um cuidado grande nas redes sociais. Tem que ter cuidado nesse trabalho. A faca na mão do médico salva, na do padeiro corta o pão... Mas na mão do assassino, a faca mata.
Eu tinha o livro pronto antes da pandemia. O ideal era lançar em 14 de julho, um ano após o empurrão. Não é uma comemoração, porque a minha vida depois do empurrão não tem o que comemorar, não fiz nada. Quem fez foi Deus. Fiquei cinco meses sem presença de pessoas, pela pandemia, e volto agora de modo muito prudente. Mas isso tudo gera um problema grande, que é a depressão. Vários amigos psicólogos e médicos que leram o livro elogiaram e tocaram nesse ponto.
Esse livro é uma autobiografia como nunca fiz na minha vida. E tudo por causa do empurrão. Estamos em um momento de reflexão para mostrar para as pessoas, que te colocam lá em cima, que não é assim. Quero viver a santidade, mostrar de onde surgiu minha vocação... A vida é uma passagem. Estamos nesse mundo, mas não somos desse mundo.
Um adolescente no mundo da ginástica quer ter músculo. E você vai no grupo. Um ou outro faz piada, mas, no fundo, você percebe: 'meu Deus, o que está acontecendo?'. As pessoas não têm noção do encontro que tive com Deus depois de me perder na juventude, e quero buscar restaurar o que são valores. Você não vale pelo que você tem, mas pelo que é. O sucesso de uma pessoa agora é o número de seguidores que tem no Instagram, mas não é nada disso. As redes são uma benção, desde que usadas da forma correta.
Sabe que as redes sociais têm algo que gosto muito? Sempre gostei da palavra partilhar. O compartilhar, que está nas redes sociais, é mais forte ainda. É o que Jesus fazia. O que eu procuro é isso. Compartilhar de coração para coração. E esse livro é um modo de abrir meu coração para que as pessoas me conheçam. Por isso é um livro tão pessoal, por isso 'Batismo de Fogo'.
No livro, eu falo muito sobre isso. É tão difícil você falar qual é a causa. É uma somatória de muitas coisas. Mas vou te colocar um dado grande: quando Deus me deu a coragem de não esconder aquilo, quando eu coloquei esse problema a público, as pessoas se identificaram. O que teve de gente, de várias áreas profissionais, que foram se abrindo sobre casos similares... Porque tem aquela coisa: 'Como pode um padre passar por uma depressão?'. Mas foi justamente a fé que me fez superar a doença.
Eu sou Mariano. Maria sabe o lugar dela. Nunca pedi a Deus para ser o foco. Sempre trabalhei nos bastidores e fazia cada coisa. Deus me colocou "em evidência", entre aspas, sabendo que meu lugar é levá-lo. Eu uso as redes sociais para evangelizar, não ostentar. Quando você compreende isso, como sacerdote, é algo incrível. E quem me conhece sabe.
Claro! Em um mundo de tanta indiferença, você é chamado a fazer a diferença. Você, com sua esposa, o carinho com filhos, a família... São esses momentos que vão te preparar para o caminho eterno. É o novo. Nele, quero estar como Maria, como serviço. Não sendo servido, sendo serviço.
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