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Reconstrução do Museu Nacional vai deixar visíveis as marcas do incêndio no Rio

Reconstrução do Museu Nacional vai deixar visíveis as marcas do incêndio no Rio

Projeto de restauro prevê interior com paredes sem reboco, revelando áreas que resistiram ao fogo

Publicado em 23 de fevereiro de 2021 às 17:07- Atualizado há 4 anos

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Incêndio de grandes proporções atingiu o Museu Nacional na noite deste domingo (2)
Incêndio de grandes proporções atingiu o Museu Nacional na noite deste domingo (2). (Erick Dau/A7 Press)

Nada trará de volta o que as chamas consumiram na fatídica noite de 2 de setembro de 2018, mas agora começamos a visualizar como ficará a sede do Museu Nacional. Ao longo do ano passado, a Unesco coordenou a licitação para definir o projeto arquitetônico e de restauro do palácio que foi residência oficial da família imperial brasileira. Foi escolhido o consórcio dos escritórios H+F Arquitetos e Atelier de Arquitetura e Desenho Urbano.

Além do órgão das Nações Unidas voltado a educação e cultura, a organização da concorrência também envolveu o Conselho Internacional de Museus, o Instituto de Arquitetos do Brasil e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, responsável pelo museu no bairro de São Cristóvão, na zona norte da capital fluminense.

A seleção despertou o interesse de muitos escritórios de arquitetura pelo país, como MMBB, Marcio Kogan, Gustavo Penna e SIAA.

Dos escolhidos, o Atelier de Arquitetura é sediado no bairro carioca da Glória e conta com as arquitetas Fabiana Araújo e Marina Correia como sócias. Por sua vez, o paulistano H+F, de Eduardo Ferroni e Pablo Hereñú, também é o responsável pelas obras do Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga.

Nas propostas elaboradas para o Museu Nacional e o Museu Paulista, o ponto de partida da intervenção arquitetônica foi o embasamento. Também conhecido como promontório, a estrutura corresponde à parte construída entre o palácio e o solo natural. É um recurso milenar com a finalidade de destacar a edificação neoclássica na paisagem.

No caso carioca, os jardins à frente da fachada principal serão mantidos tal como atualmente. Também será restaurada a lateral conhecida como "jardim das Princesas", onde brincavam Isabel e Leopoldina, filhas do imperador dom Pedro 2º.

Vista do conjunto com o paço restaurado e a nova ampliação do Museu Nacional
Vista do conjunto com o paço restaurado e a nova ampliação do Museu Nacional. (Divulgação)

É no lado oposto que será erguido o trecho contemporâneo do embasamento. Com uma sequência de suaves rampas, o que se propõe é uma operação de reconstrução da topografia do lugar. Do chão do parque, se subirá por entre muros de pedra até o novo jardim composto por espelhos d'água, canteiros de plantas, mirantes e percursos estabelecidos a partir das portas laterais do palácio.

O novo promontório conterá três andares subterrâneos, nos quais estarão as atividades complementares ao museu, como café, auditório, sala de vídeo, além dos escritórios da instituição e a reserva técnica.

O resultado será um acréscimo de área construída que não clamará por atenção em demasia. Não é um anexo disputando destaque visual, mas um ato arquitetônico comedido e criterioso. De modo que a edificação do paço de São Cristóvão prosseguirá como protagonista-mor na Quinta da Boa Vista.

Por dentro do museu, o projeto não apagará o trauma do incêndio. O restauro não recriará o que foi reduzido a cinzas. Não se ambiciona a reconstituição de uma suposta condição áurea do século 19 e que se perdeu de todo no desastre de 2018. Muitas paredes chamuscadas sem reboco, tal como feridas expostas, seguirão revelando a pedra e o tijolo que permaneceram de pé enquanto o fogo ardia.

A memória da destruição é dura, mas não deve ser escamoteada. Afinal, é parte relevante da história do museu e do Brasil atual.

Essa postura dos arquitetos fica mais evidente no novo saguão central de articulação. Subsequente ao hall com o meteorito do Bendegó e a escada original do palácio, o espaço de comunicação entre os diferentes pavimentos terá três andares de pé-direito livre —isto é, a altura total do edifício— entrecruzados por passarelas e escadas metálicas.

Com isso, no trecho antes subdividido em saletas que desapareceram entre as cinzas, surgirá o amplo saguão, um lugar onde o visitante olhará para dentro do próprio museu, reconhecendo sua dimensão e tomando conhecimento do que surge a partir da ausência.

O pátio interno dos tempos imperiais, com jardim e chafariz, seguirá a céu aberto. O circuito de visitação às exposições terá uma lógica circular ao redor desse vazio central. As mostras temporárias ficarão hospedadas no térreo. Nos dois pavimentos superiores estarão as coleções permanentes.

Novo campus abrigará os laboratórios e a administração do Museu Nacional, que antes ficavam no palácio atingido por um incêndio em 2018
Novo campus abrigará os laboratórios e a administração do Museu Nacional, que antes ficavam no palácio atingido por um incêndio em 2018. (Divulgação/Museu Nacional)

A catástrofe não modificou as ênfases do acervo, que permanece tributário tanto à concepção do século 19 de museus, quanto ao seu vínculo com uma universidade. Ou seja, há departamentos de guarda de documentos históricos, itens arqueológicos, objetos etnográficos e setores com foco científico, como paleontologia, entomologia e botânica.

No levantamento de técnicos ligados à UFRJ foram encontrados fragmentos de ornamentos do século 19 que sobreviveram ao fogo. Esses elementos decorativos serão restaurados e serão indícios da vivência palaciana em aposentos históricos como a sala onde ficava o trono.

Ao longo do século 20, a capela imperial fora totalmente descaracterizada e retalhada. Com o incêndio, arquitetos viram surgir a oportunidade de restituir a estrutura do espaço religioso original com sua abóbada no teto.

O telhado manterá a configuração anterior ao desastre. Em dois trechos, novas leves coberturas de vidro serão instaladas para destacar determinados espaços internos com iluminação natural. Isso não afetará a volumetria do velho paço de São Cristóvão —só comprova a intenção dos arquitetos de calibrar cada gesto, intervir com delicadeza.

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O que foi apresentado pelo H+F e Atelier de Arquitetura ainda está em estágio de estudo preliminar. A partir de agora será debatido com outros agentes envolvidos na empreitada e órgãos de patrimônio, como o Iphan. A reinauguração do bloco frontal do Museu Nacional está prevista para as festividades do bicentenário da Independência no ano que vem.

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