Em um primeiro momento, Boneca Russa, disponível na Netflix, se apresenta como uma comédia formulaica: em seu aniversário de 36, Nadia (Natasha Lyonne, de Orange is The New Black) morre e acorda novamente em meio à festa apenas para morrer de novo e retornar, mais uma vez, ao mesmo local fórmula de filmes como o clássico O Feitiço do Tempo (1993) ou, mais recentemente, No Limite do Amanhã (2014). Nadia, tal qual os personagens de Bill Murray e Tom Cruise em seus respectivos filmes, parte então em busca de entender o que está acontecendo. Por que, afinal, ela retorna sempre àquele momento?
Os primeiros episódios seguem a receita do erro e acerto, ou seja, se algo deu errado em uma tentativa, Nadia tenta corrigir isso na próxima; como uma boa programadora de jogos eletrônicos, a protagonista parte em busca no bug que tanto reinicia o sistema. Isso, claro, gera situações engraçadas, mas ainda é só o começo. É no terceiro episódio que as coisas começam a ficar mais interessantes.
Sem entrar em muitos detalhes para não revelar a trama, podemos dizer que o caminho de Nadia se cruza com o de Alan (Charlie Barnett) e toda a dinâmica da série se transforma: a comédia formulaica ganha contornos mais sérios e desenvolve até uma certa tensão à medida que a história se desenrola.
É justamente nesse desenrolar que reside boa parte do mérito de Boneca Russa. Aos poucos vamos vendo que as coisas se repetem, mas nem sempre da mesma forma. A repetição também faz o público perceber que o roteiro dá dicas e muito pouco tempo é gasto à toa.
Com oito episódios que não ultrapassam os 30 minutos, a série é enxuta, feita e pensada para ser consumida em uma ou no máximo duas mini-maratonas. A mudança de tom ao longo dos episódios também evita qualquer tipo de desinteresse.
O humor, até pela personalidade de Nadia, está sempre presente, mas nunca é o foco, a risada nunca é forçada. Boneca Russa, por mais surpreendente que pareça, é uma série sobre escolhas e dor. Ao repetir momentos que consideram importantes ou não, os personagens embarcam numa reveladora jornada de autoconhecimento.
Ao final, quando tudo parece a caminho de se acertar, a série surpreende novamente em uma nova mudança de dinâmica, o surgimento de elementos de suspense e com uma conclusão cheia de significado.
É espantoso que uma série de tiro curto como Boneca Russa gere tanta reflexão sobre a necessidade de se olhar para as escolhas feitas e a obrigação de lidar com as consequências a cada escolha, afinal, surge uma nova boneca, uma nova capa em torno de cada um.
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