Thammy Miranda, 38, se prepara para, no começo de 2021, ser o primeiro homem trans a ocupar uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo. Eleito pelo PL (Partido Liberal), com 43.321 votos, ele teve a nona maior votação para o legislativo da capital paulista neste ano.
"Hoje a gente sabe que a realidade de uma pessoa trans é muito difícil, a expectativa de vida é de 35 anos, sou privilegiado por ter passado disso", diz em entrevista por email à reportagem. "Mas o que mais impacta em ser o 9º mais votado é a responsabilidade de representar todas as pessoas que confiaram em mim."
Ele afirma que está aberto ao diálogo com a colega Erika Hilton (PSOL), primeira mulher trans eleita para a casa, com a sexta maior votação (50.508 votos). "Acredito que o diálogo faz parte da política, é a partir daí que grandes coisas acontecem."
Filho da cantora Gretchen, 61, ele ficou conhecido do grande público muito cedo. Antes da transição de gênero, dançou com a mãe, posou para revistas masculinas e atuou na novela "Salve Jorge" (Globo), na qual interpretou a escrivã e DJ Joyce, entre outras participações na TV. Ele diz ainda não ter pensado se a migração para a política é definitiva.
Miranda já havia tentado se eleger em 2016 pelo PP (Partido Progressista, hoje Progressistas), mas recebeu 12.408 votos e acabou como suplente. No ano passado, ele quase assumiu a vaga depois que o mandato de Camilo Cristófaro (PSB) foi cassado por denúncias de fraude eleitoral. O vereador, no entanto, obteve liminar favorável no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e se manteve no cargo.
Logo depois, ele ganhou um cargo de assessor especial no gabinete do vereador Isac Félix (PL), então segundo secretário da Mesa Diretora da Câmara Municipal de São Paulo. Em maio deste ano, ele anunciou ter pedido exoneração por causa da pandemia de coronavírus. "Não achei justo estar ganhando o dinheiro do povo sem estar lá trabalhando", declarou na época.
Embora não tenha declarado voto a um dos candidatos que disputam à Prefeitura de São Paulo neste segundo turno, o vereador eleito tem participado ativamente da campanha de Bruno Covas (PSDB), que disputa a vaga com Guilherme Boulos (PSOL).
Representatividade. Hoje a gente sabe que a realidade de uma pessoa trans é muito difícil, a expectativa de vida é de 35 anos, sou privilegiado por ter passado disso, mas o que mais impacta em ser o 9º mais votado é a responsabilidade de representar todas as pessoas que confiaram em mim. Não tenho dúvidas de que daqui a quatro anos elas vão lembrar com orgulho de todo o trabalho feito no meu mandato.
Com certeza. Esses dias mesmo a Erika Hilton se manifestou em minha defesa quando jornalistas insistiram em falar de mim no feminino, do mesmo jeito que qualquer ato de transfobia que for feito contra ela vai me afetar diretamente. Acredito que o diálogo faz parte da política, é a partir daí que grandes coisas acontecem.
Foi sensacional. Muito emocionante. Estávamos todos muito ansiosos pelo resultado. Desde a primeira parcial meu nome já estava lá entre os 10 primeiros, mas só comemorei mesmo quando apareceu já com mais de 40 mil votos. Meu primeiro abraço foi na Andressa [Ferreira], minha parceira de sonhos e caminhada, que confiou na minha luta desde o primeiro momento. A minha mãe estava muito segura de que eu seria eleito, me passou sempre muita confiança, lembro de ela ter dito que já sabia, porque confiava que as pessoas iriam enxergar quem eu sou de verdade.
Pelo mesmo motivo que me fez ser candidato pela primeira vez: insatisfação. Estava insatisfeito e, por isso, resolvi me candidatar para participar ativamente da política, para mudar as coisas de dentro dela.
Bastante, inclusive cheguei a trabalhar na Câmara de Vereadores. Consegui absorver muitas coisas positivas e ver como poderei aplicar tudo que eu propus de projetos para a nossa gente.
As minhas prioridades são as mesmas das pessoas que confiaram o voto a mim. Lutar pela melhoria da educação, combate à violência contra a mulher e representar as pessoas que não se sentem representadas na política a partir de um mandato participativo, com um vereador que quer escutar essas pessoas e pautar as suas decisões a partir de conversas com a nossa gente.
Uma das minhas pautas durante a campanha, e que vou falar mais uma vez nesta entrevista, é sobre ouvir as pessoas, não em fazer um mandato sentado dentro do gabinete. Quero aproximar as decisões da nossa gente e vai ser alinhado com essas pessoas que a minha atuação vai ser pautada.
Ainda estamos estudando as melhores maneiras de fazer isso, mas vou continuar algo que comecei há um tempo, que é de visitar as pessoas, buscar saber as necessidades dos bairros e comunidades, escutar e alinhar as decisões.
Não sei falar pelos outros, sei o que eu fiz. Sempre busquei, mesmo antes de escolher entrar para a política, conversar com pessoas das comunidades, entender as principais dificuldades e manter esse diálogo. As pessoas querem ser representadas, querem alguém que seja o seu sim e o seu não no legislativo municipal, acho que essa proposta fez a diferença.
Ainda não pensei sobre isso.
Acredito que não é o momento para pensar nisso. Todos os que foram eleitos devem ter o pé no chão e focar no trabalho que tem que ser feito na Câmara de Vereadores.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta