A adolescente Victorya Estevão, de 18 anos, foi diagnosticada com ceratocone, uma doença rara que afeta a córnea dos olhos. A jovem, que mora com os pais no bairro Vale Encantado, em Vila Velha, tem dificuldade de enxergar e, se não for tratada logo, pode ficar cega. No momento, a solução seria usar uma lente que custa R$ 5 mil. No entanto, a família não tem condições de arcar com o valor.
Victorya já usava óculos desde os 15 anos por ter miopia e astigmatismo. Em meados de 2018, ela sentiu que a visão estava ruim. Mas pensei que poderia ser só o grau que aumentou, que era algo normal, recorda. Em 2019, a jovem percebeu que a visão voltou a piorar e ela adquiriu óculos novos, porém, dois meses depois a dificuldade para enxergar voltou. Eu ficava com o celular muito perto, espremia bem os olhos, pois não estava conseguindo ver. Na escola eu tinha que fotografar o quadro para fazer as anotações, relata.
A mãe de jovem, Luciana Estevão, só tomou conhecimento da doença após a adolescente reclamar da dificuldade de enxergar e após ser feito um exame de rotina em maio deste ano. O médico informou que não adiantava mais usar óculos, que ela não enxergava nada e que estava com uma doença incurável chamada ceratocone. Eu só sabia chorar. Fiquei completamente desesperada, conta a mãe de Victorya.
De acordo com o oftalmologista Sebastião Leonardo da Silveira, a ceratocone é uma doença genética da córnea que é a lente natural do olho. Além da córnea, mais internamente, há outra lente chamada cristalina. São, portanto, duas lentes que o olho utiliza para passar a luz e chegar ao fundo, na retina, onde é possível enxergar. A córnea é a primeira lente e há um defeito que ocorre que a deixa mais curva. Naturalmente, a córnea tem uma certa curvatura. Ela não é reta, é meio abaulada. Então fica mais abaulada, mais curva e um pouco mais fina também em algumas pessoas. É um processo progressivo, esclarece.
Desse modo, pelo fato da córnea ser mais curva e fina, atrapalha a passagem da luz e, consequentemente, impede a pessoa de enxergar bem. Sabendo que a prevalência da doença varia de 4 a 600 casos por 100 mil indivíduos, segundo dados do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o médico, então, destaca os sintomas. Coçar muito os olhos, a visão fica embaçada, mesmo com óculos não melhora, troca os óculos e não fica bom, aponta.
Victorya lembra que no início ficou muito assustada, já que não conhecia a doença, mas tentava não demonstrar o sentimento. Eu fiquei desesperada. Pensei: 'Meu Deus, eu vou ficar cega! Como conseguirei fazer o que gosto?'". A jovem de 18 anos sempre gostou muito de ler, assistir séries, filmes, navegar pela internet e desenhar. Contudo, teme que essas atividades de tanto prazer não possam mais acontecer.
Segundo Silveira, existem tratamentos diferentes para cada nível da doença. Em um estágio pequeno, até os óculos podem ajudar. Já se for médio, utiliza-se a lente de contato rígida. E quando é muito avançado, é necessário fazer um transplante de córnea. Hoje o melhor resultado que tem de transplante de córnea é quando a pessoa tem ceratocone, menciona.
Entretanto, o médico destaca que antes da realização do transplante, quando a doença está evoluindo, é importante fazer um tratamento chamado riboflavina, em que há a aplicação do laser. Usa-se também o laser, mas é um medicamento que coloca na córnea e que ajuda a estabilizar a curvatura, informa. Silveira diz, ainda, que não são em todos os casos, mas para as pessoas que precisam, esse tratamento corrige a ceratocone. Existe solução, seja qual for o grau da evolução do problema. É possível tratar, completa.
No Sistema Único de Saúde (SUS) foram feitos alguns exames em Victorya e no olho esquerdo, onde a doença mais teve avanço, foi realizada uma cirurgia de crosslinking, que teve o objetivo de minimizar a progressão da ceratocone e evitar um futuro transplante de córnea.
Apesar da cirurgia, o olho ainda precisa de lentes específicas. No entanto, não são custeadas pelo SUS, de acordo com a família. Além disso, não foi possível realizar a cirurgia no olho direito. Falaram que o hospital não tinha o procedimento e que era preciso esperar. A orientação foi para que retornássemos em março de 2021, avisa Luciana Estevão.
A mãe da jovem questionou ao médico o que faria até lá, dado que a filha corre risco de perder a visão. Ele disse que não tem o que fazer. No outro olho que não foi operado, a doença pode avançar e ela pode perder a visão, expõe. Se prosseguir, o último estágio é o transplante de córnea, que, segundo a mãe, é uma fila grande a enfrentar. É muito demorada, comunica.
Luciana explica que a lente, chamada de rígida ou escleral, não fará com que Victorya enxergue totalmente, pois o grau de astigmatismo e miopia da filha é muito alto. A lente, digamos assim, impede a córnea de formar um cone novamente, e de se fechar. Então coloca-se a lente para que ela tenha uma maior amplitude da visão, explica.
Segundo o médico Sebastião Leonardo da Silveira, o tratamento com a lente de contato rígida, que difere da lente gelatinosa, é usado para modelar e corrigir o formato da córnea. A lente rígida para ceratocone altera a curvatura da córnea e resolve bem, diz.
A mãe ressalta que a lente, no valor de R$ 5 mil, é muito cara. Além disso, há também colírios com preços altos. Devido à pandemia do novo coronavírus, ela e o marido, Oziel Inacio, ficaram desempregados. Para ajudar com a renda familiar, Luciana passou a fazer um trabalho artesanal e vender havaianas decoradas pelas redes sociais. Entretanto, a situação financeira ainda é muito complicada e a família sofre com a dificuldade de conseguir dinheiro para pagar o tratamento de Victorya.
De acordo com o oftalmologista Sebastião Leonardo, o que agrava o problema é coçar muito os olhos. Pessoas que coçam muitos olhos têm mais riscos de desenvolver o ceratocone, especialmente as que são alérgicas, fala. Logo, o médico ressalta que não é saudável ficar esfregando o olho de maneira excessiva. Quem coça muito os olhos, deve procurar um oftalmologista para recomendar um colírio e isso não acontecer, comunica.
Para descobrir a doença, é necessário consultar um oftalmologista e fazer os exames de topografia ou tomografia da córnea. No caso de Victorya, o diagnóstico da doença foi detectado por meio da topografia.
É importante, portanto, prevenir, cuidar precocemente, para não deixar a doença evoluir. Normalmente, aparece na segunda e terceira década de vida. Quer dizer, na adolescência até os 30 anos. Depois disso, é muito raro esse problema aparecer, pronuncia.
Embora Victorya tenha tomado conhecimento da doença, ela diz que ainda sente muito medo, por isso, tem dificuldades em pensar no futuro que gostaria de ter. Dessa forma, o sonho de fazer um intercâmbio, terminar o terceiro ano do ensino médio, prestar o vestibular para fazer uma faculdade e conseguir uma vida melhor tanto para ela quanto para a família, ficaram em segundo plano.
Por causa dessa doença, eu não penso muito lá na frente porque eu não sei o que vai acontecer. Eu quero fazer a cirurgia, quero conseguir ter a possibilidade de comprar essas lentes para que eu possa pensar no meu futuro, finaliza sem conter as lágrimas.
A Gazeta demandou a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) para saber sobre a cirurgia que a jovem precisa fazer e sobre a lente de contato que a adolescente precisa utilizar, que não seria disponibilizada pelo SUS, segundo a família de Victorya. Após a publicação da reportagem, a Sesa respondeu.
"A Secretaria da Saúde (Sesa) esclarece que trata-se de doença rara de alta complexidade e com poucos especialistas que prestam serviço, mas esclarece que a contratação do serviço está em andamento e deve ser concluída em até 30 dias", finalizou a nota.
Caso queira ajudar, entre em contato com Luciana pelo número (27) 9 9794-8494.
Também é possível contribuir fazendo uma doação pela vaquinha on-line #Todos pela Victorya ou pelo PicPay @victorya.estevao.
Após a publicação da reportagem, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) enviou uma nota sobre o caso, que foi inserida na matéria.
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